Divididas entre a universidade e os deveres de ser mãe
Três estudantes relatam como conseguem seguir vida acadêmica sem deixar os filhos de lado
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Jhonatham Pino - jornalista
A Universidade Federal de Alagoas (Ufal) não tem os dados exatos, mas não é incomum depararmo-nos com estudantes que dividem seu tempo entre a academia e os afazeres maternos. Com o amadurecimento do organismo da mulher aos 18 anos, e com a recomendação de melhor período para gravidez entre os 20 e 30 anos, idades em que as mulheres geralmente estão no ensino superior, elas acabam por ter que lidar com a gravidez durante sua formação. Isso se dá, muitas vezes, de forma decidida; outras vezes não.
A segunda opção foi válida para Débora Vital. A mestranda do curso de Dinâmicas do Espaço Habitado, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), estava finalizando o estágio de docência quando descobriu sua gravidez. Como ainda estava no início da pesquisa, porque havia mudado o foco do trabalho, iniciou uma rotina bem tumultuada.
Hoje, Gustavo está com um ano e 11 meses e Débora ainda está em processo de qualificação do trabalho. Ela relata que, durante esse tempo, enquanto ela produzia em um quarto, ele traquinava no outro. “Sinto um pouco de culpa porque as surpresas e mudanças são muito rápidas e numa tarde você descobre que perdeu a primeira pronúncia da palavra: acende (somente para comentar um exemplo)”, relatou.
Débora tirou três meses de licença, direito garantido pela Lei 6.202, de 17 de abril de 1975. Durante todo o período de amamentação, ela conciliava os horários de entrevistas, ou pesquisa em arquivos, com o horário das mamadas. “Mas sempre havia um estoque de leite no congelador, para o caso de ter algum problema no meu retorno”, acrescentou.
O pai de Gustavo, Fábio Nogueira, sempre ajudou nesse processo, mas, como ele estava em seu último ano da graduação de Arquitetura e Urbanismo, não podia ficar muito tempo em casa, deixando a Débora uma rotina de dedicação exclusiva ao bebê. “Principalmente na madrugada, quando eu estava muito esgotada, era quando eu tinha a maior participação dele, nas trocas de fraldas, e mesmo para tirar o bebê do berço e colocar para mamar”, detalhou.
Atualmente, com ajuda de uma babá durante o dia e o processo de finalização do curso de Fábio, eles estão conciliando melhor o crescimento de Gustavo com as atividades acadêmicas. “A conclusão do trabalho se faz necessária mesmo, porque meu prazo para defesa está se esgotando. E penso que quando finalmente obitiver o grau de mestre, ao menos meus fins de semanas serão dedicados todos a ele”, comemora.
Maratona prolongada
Sem babás, Mauricélia Ramos e Ticiane Simões continuam ralando por um tempo bem maior que Débora. A primeira, aluna da pós-graduação em Gestão Pública pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (Feac) e servidora da Ufal, administra com o marido os cuidados com Lucas Vinícius, hoje com dois anos e oito meses.
Quando Mauricélia iniciou o curso, Lucas tinha acabado de completar dois anos, mas o afastamento dos dois se deu antes do início do curso. “Quando entrei na Ufal, ele já não mamava mais, no entanto eu passei um ano cuidando exclusivamente dele e essa separação para voltar a trabalhar foi muito dolorida. Lembro de me despedir dele e chorar durante todo o percurso até o trabalho. Hoje em dia ele está super adaptado e eu também”, recordou.
Como a especialização é semipresencial, com aulas quinzenais, Mauricélia tem que estudar e interagir nos fóruns de discussão, o que é possível só depois dos afazeres com Lucas. “O curso é muito puxado e, às vezes, estudo apenas depois de colocá-lo para dormir, por volta das 21h. Isso depois de pegá-lo na escola, fazer a janta, alimentá-lo, dar banho, brincar, colocar para dormir, lavar as fardas pro dia seguinte, arrumar a cozinha e a mochila dele, além de precisar preparar meu almoço para o dia seguinte”, enumerou.
Ticiane Simões já está há 10 anos nessa maratona. A estudante de graduação em Teatro Licenciatura trabalha, participa de movimentos estudantis e ainda tem que cuidar da sua filha, sozinha. Quando ingressou na universidade Beatriz já estava com sete anos de idade. Ela diz que depois disso faltou compromissos “infaltáveis”, por uma gripe, por uma febre, ou até mesmo por não ter com quem deixá-la.
“Ser mãe é assumir uma responsabilidade de dedicação prioritária à formação de uma criança como ser humano. E essa responsabilidade muitas vezes entrará em choque com as outras que assumimos durante a vida. Em alguns momentos, estive no meio desse dilema entre ser mãe e ser aluna, não foi e não é tarefa fácil”, refletiu Ticiane, de forma análoga a muitas mães-estudantes que não puderam ter suas histórias contadas aqui.