Estudante conquista vaga de trainee para negros e representa luta por isonomia
Aprovada em programa do Magazine Luiza, concluinte da Ufal comemora passo dado para o olhar aos debates raciais
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Aos 30 anos, a concluinte do curso de graduação em Ciências Econômicas da Ufal, Raíssa Lima, iniciou mais um capítulo das suas batalhas. A filha mais velha do Marcos e da Gorete, irmã do Raí, e natural de São Miguel dos Campos, há oito anos assumiu os cabelos crespos para representar a cor que aflora numa pele carregada de história, em busca de questionamentos.
“Esse fato marcou muito minha vida. Passei a sentir mais fortemente as faces do racismo e combater ele de formas diversas”, frisou. E como só quem vai ao combate pode saborear vitórias, Raíssa tem obtido as respostas que espera. Ela comemora a recente aprovação num programa de Trainee numa das maiores empresas varejistas do Brasil que já nasceu polêmico.
No segundo semestre de 2020 a empresa Magazine Luiza lançou o programa com vagas exclusivas para pessoas negras. Foram muitos debates judiciais, mais de 22,5 mil inscritos, quase três meses de provas e dinâmicas, 19 aprovados e muita repercussão. Raíssa passou. Foi a única alagoana aprovada e o orgulho da família da qual já cuida financeiramente.
“Combater o racismo estrutural é um dever de todos, ter uma companhia tão bem colocada no mercado como o Magalu admitindo esse problema em sua organização e, o mais importante de tudo, buscando maneiras de enfrentar esse problema é a prova de que é possível fazer um pouco mais do que já vem sendo feito”, evidenciou.
Raíssa está a um passo de concluir o curso, depois de ‘se perder’ em Administração e ‘se encontrar nas Ciências Econômicas’, a estudante destaca que a Ufal e a família foram suas “maiores referências a respeito de sociedade”. Ela conta que a universidade pública exerceu papel importante para o aprendizado além da sala de aula: “Foi lá que eu passei a ter mais consciência do que é ser um corpo negro neste país”.
Responsabilidade social com isonomia racial
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), menos de 30% dos cargos de liderança são ocupados por pessoas negras nas empresas brasileiras. Quando o recorte foca nas 500 maiores do país, o Instituto Ethos aponta que esse número cai para 4,7%, numa nação formada por mais da metade da população declaradamente negra.
O programa de Trainee do Magalu nasceu da parceria das consultorias Indique Uma Preta e Goldenberg, Instituto Identidades do Brasil (ID_BR), Faculdade Zumbi dos Palmares e Comitê de Igualdade Racial do Grupo Mulheres do Brasil.
A empresa percebeu a necessidade de ter líderes negros em seu quadro de funcionários, que mesmo estando acima da média nacional, com 16% de pretos em cargos de chefia, ainda não reflete representatividade.
“Desejo que mais empresas possam fazer como o Magalu e olhar para dentro da sua estrutura organizacional e encarar essa realidade. O povo preto é uma potência, só nos falta melhores oportunidades”, destacou Raíssa.
A iniciativa de promover a isonomia racial atraiu milhares de candidatos oferecendo remuneração de R$ 6,6 mil; participação nos lucros; auxílios de transporte, alimentação, e academia; assistência médica; desconto em produtos e farmácia; previdência privada; bolsa de estudo; entre outros atrativos.
Animada com o novo ciclo, Raíssa nunca havia trabalhado no mercado varejista e conta que o momento é de aprendizado. A proposta é que nos 12 meses de programa, o profissional passe por uma imersão na área de negócios, projetos estratégicos, mentorias, inglês, além de treinamentos técnicos e comportamentais.
“Mergulhar na operação, no dia a dia das lojas e das pessoas que fazem as lojas é uma das melhores coisas que já vivi em minha carreira. Eu desejo aprender cada vez mais como fazer essas coisas da melhor forma possível. E abrir caminhos para que mais pessoas pretas como eu ocupem lugares altos no mercado”, ressaltou, sonhando com a ascensão profissional depois de ser efetivada e assumir o cargo de analista. Mais uma, de tantas batalhas.