Alunos de Veterinária publicam artigos sobre ação contra abate de jumentos

Experiência vivenciada pelos integrantes do Grupequi no sertão da Bahia estimulou a pesquisa sobre os cuidados com esses animais

Por Lenilda Luna - jornalista
- Atualizado em
Equipe do Grupequi em campo
Equipe do Grupequi em campo

Duas dissertações de mestrado, cinco artigos científicos e o capítulo de um livro foram resultados do engajamento de estudantes da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) em uma ação contra os maus tratos de jumentos abandonados no sertão da Bahia. Os alunos fazem parte do Grupo de Pesquisa e Extensão em Equídeos (Grupequi), do curso de Medicina Veterinária, coordenado pelo professor Pierre Barnabé Escodro.

“A primeira dissertação foi defendida pelo estudante Lucas Santana da Fonseca, em fevereiro deste ano, com o título: Sanidade de jumentos nordestinos submetidos ao extrativismo para exportação de peles. A segunda, abordará técnicas inovadoras de cirurgias e estudo de inflamação na espécie, a ser defendida pela mestranda Rayane Medeiros ainda neste semestre”, informou o professor Pierre Barnabé, que orienta as pesquisas.

A trajetória desse trabalho foi relatada em artigo conjunto, que teve a participação da estudante Rayane Medeiros e do professor Pierre, intitulado O símbolo nacional exportado para consumo internacional. No artigo, os pesquisadores contam que em 2018, após inúmeras denúncias de maus-tratos e ilegalidades no manejo de jumentos em frigoríficos da Bahia, organizações de defesa dos animais obtiveram decisão judicial suspendendo o abate desses animais naquele estado.

Os jumentos eram abatidos em alguns municípios baianos para exportação de pele para uma empresa chinesa. “Com a suspensão e a consequente perda de ganho comercial, cerca de 1.200 jumentos que aguardavam abate foram abandonados confinados, sem água ou alimentação, em uma fazenda arrendada por chineses na cidade de Canudos-BA, em condição de extremos maus-tratos”, relataram os pesquisadores no artigo.

Em 2019, o Grupequi da Ufal iniciou atividades de apoio para os cuidados aos jumentos, unindo-se a pesquisadores da Universidade Federal da Bahia, Universidade de São Paulo, ao Fórum Nacional de Proteção Animal, Frente Nacional de Defesa dos Jumentos e ONG inglesa The Donkey Sanctuary. Na ocasião, a Ufal e o grupo Pata Voluntária se dispuseram a trazer para Alagoas cerca de 30 machos para receberem cuidados.

O jumento é nosso irmão, quer queira ou não

A letra da música de Luiz Gonzaga, citada no artigo, ilustra bem a importância que os jumentos têm na cultura nordestina, o que explica a comoção da sociedade e da comunidade científica diante das condições cruéis em que os animais foram resgatados. “Não havia nenhum padrão de idade, sendo encontrados entre os animais para o abate tanto os de idade mais avançada como também potros e fêmeas gestantes”, relatou Pierre Barnabé.

Lucas Fonseca ficou comovido com a situação. “O início foi bem desafiador, visto que nunca havia tratado de algo assim. O professor Pierre já tinha participado da primeira intervenção em outro município baiano e nos preparou para o que iríamos encontrar. Chegando na fazenda onde os jumentos estavam alojados, era cenário de guerra, muitos animais debilitados e muitos óbitos diários”, relatou o estudante.

A primeira missão foi tentar conter a mortalidade dos animais. “Fizemos vários exames nos jumentos na tentativa de descobrir as causas dos óbitos. Foram dias manejando esses animais e interagindo com eles. Nosso objetivo era diminuir a mortalidade, promover a sanidade e bem-estar; fazer o controle zootécnico, traçar um perfil hematológico para investigarmos doenças metabólicas, parasitárias, entre outras medidas de acompanhamento que foram adotadas durante o transporte”, contou Lucas.

Depois de todo esse trabalho em campo, chegou o momento das publicações sobre o aprendizado. “É muito gratificante ver o resultado do nosso trabalho. Os artigos são importantes para mostrar à comunidade científica que muitas espécies estão sofrendo e que podemos ajudar. Toda ajuda é bem-vinda, porque os maus-tratos precisam acabar. Algumas leis precisam ser endurecidas e as penas aumentadas. A população precisa perder o medo e colaborar com as denúncias”, defendeu Lucas Fonseca.