Doutorandos da Ufal vão realizar pesquisas sobre Libras na Alemanha

Thiago Santos e Rodrigo Machado são do Programa de Pós-graduação em Linguística e Literatura

Por Manuella Soares - jornalista
- Atualizado em

A dedicação aos estudos sobre Língua Brasileira de Sinais (Libras) vai levar dois doutorandos da Ufal para instituições da Alemanha. Thiago Bruno de Sousa Santos foi aprovado na Universidade de Colônia, e Rodrigo Nogueira Machado vai estudar na Universidade Humboldt. Os dois fazem parte do Programa de Pós-graduação em Linguística e Literatura da Ufal e a partir do próximo mês, iniciam novos projetos na Europa.

Rodrigo é natural de Fortaleza, fez bacharelado no Rio Grande do Sul, licenciatura e mestrado em Santa Catarina, e é orientado pelo professor Jair Barbosa no doutorado em Alagoas. Além da bagagem de experiências pelo Brasil, ele ainda tem vários carimbos no velho continente, onde durante dois anos aprofundou seus estudos por meio do contato direto com outras línguas de sinais. Rodrigo é surdo. Ele está rompendo barreiras mundo afora.

“Assisti a palestras de surdos e ouvintes, de países diferentes, em Língua de Sinais Internacionais. Logo me tornei um bom conhecedor desta língua. Por causa dessas experiências, passei a compreender os fenômenos linguísticos como as variações dentro da Libras e as influências exteriores sofridas por ela, advindas de outras línguas de sinais”, explicou.

No doutorado sanduíche ele vai dar continuidade aos estudos sobre empréstimos linguísticos envolvendo Libras e Língua de Sinais Alemã, com as respectivas línguas orais majoritárias e oficiais do Brasil e da Alemanha.

Thiago Santos também embarca para o mesmo país até meados de outubro, assim que regularizar toda a documentação. Alagoano de Maceió, a Ufal já é sua segunda casa desde 2010, quando entrou para cursar Letras. Aluno ouvinte, se dedicou ao estudo da Libras e se tornou intérprete por meio de um curso de formação. Logo foi aprovado num concurso para ser intérprete da Ufal e continuou na casa para ajudar na comunicação dos estudantes com deficiência auditiva.

Em busca de aprimoramento, Thiago aproveitou o que a Universidade oferece e fez especialização, mestrado e iniciou o doutorado na Faculdade de Letras (Fale). Nesse tempo, ele ainda passou no concurso para docente da Ufal e foi coordenador do curso de Libras na instituição.

Com a aprovação para cursar o PhD na Alemanha, o jovem de 29 anos vai ser aluno da pós-graduação e ter vínculo empregatício com a Universidade de Colônia. “Vai ser uma experiência totalmente nova, mas tenho certeza que a Ufal me deu condições para estar lá. Do ponto de vista acadêmico me sinto preparado para ir, mas do ponto de vista pessoal vai ser um desafio morar em outro país, conhecer pessoas totalmente diferentes”, avaliou com entusiasmo.

Sobre o projeto

O trabalho de Rodrigo tem por objetivo a proposição e a descrição de uma tipologia dos empréstimos linguísticos ocorridos entre as línguas de sinais e as línguas orais em contato a partir do estudo de corpus em Língua Brasileira de Sinais (Libras). A pesquisa procura entender a influência do empréstimo linguístico entre as duas línguas no processo de tradução para os Sinais Internacionais e nos estudos linguísticos da Libras. Ele vai receber uma bolsa do Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico (DAAD).

“O contato com os falantes dessas línguas permite perceber a maneira peculiar de se expressar em cada língua, o que torna essa investigação merecedora de atenção. Esses contatos se dão em eventos ou encontros internacionais”, disse.

Já Thiago vai fazer parte de um grande projeto guarda-chuva na Universidade de Colônia, com mais de 60 professores, que pesquisam sobre proeminência em linguagem. O trabalho envolve muitos outros projetos nas áreas de prosódia, discurso, e morfossintaxe, onde o projeto dele está inserido. Santos será orientado pela professora Pamela Perniss e conta que se cercou de apoio profissional para se preparar.

“Entrei em contato com alguns professores da área, como Adeilson Sedrins, do programa de pós-graduação da Fale, professor Anderson Almeida, de Libras, eles me ajudaram. Estudei bastante o tema do projeto e fiz entrevista em libras, com tradutores para passar pra Língua de Sinais Alemã. Depois, foi a entrevista em inglês com a orientadora”, lembrou.

Pela profissão e pelos sonhos

Rodrigo tem experiência como professor, pesquisador, tradutor/intérprete e gestor acadêmico. Ele participou do Frontrunners, um programa de treinamento internacional sobre liderança de jovens surdos, com foco na gerência de projetos internacionais, na Dinamarca, e de diversos eventos ligados à educação, à política e aos direitos humanos, como o Congresso Mundial de Surdos, na África do Sul, e encontros de jovens surdos da América do Sul.

Machado faz parte do projeto de pesquisa interinstitucional Documentação de Língua Brasileira de Sinais, sob coordenação geral da professora Ronice de Quadros (UFSC), em parceria com as federais do Ceará (UFC), de Alagoas (Ufal) e do Tocantins (UFT), além do Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines). Nesse projeto, ele coordena o Inventário de Libras do Ceará, para constituir o Corpus Nacional de Libras.

“Pretendo buscar os novos conhecimentos da área de linguística de línguas de sinais, principalmente em sociolinguística. Também almejo o crescimento da minha formação para melhor estudar e pesquisar com universidades federais, especialmente no Nordeste”, disse, explicando que tem pesquisas com a Ufal e Universidade Federal do Ceará (UFC), onde leciona.

A trajetória profissional de Thiago caminha junto com a acadêmica. Ele terminou a graduação e a pós-graduação em tempo recorde para entrar como professor da Ufal logo em seguida. As experiências em eventos e participações em projetos abrilhantam o caminho que ele trilha rumo ao PhD, mas esse é um capítulo da vida que está realizando com uma carga emocional maior do que a acadêmica. Thiago vai para a Alemanha em memória de sua mãe, Maria das Vitórias:

“Eu me sinto muito realizado com esse novo passo, é algo que eu queria muito fazer. Era um sonho da minha mãe, professora da Ufal, que só fez até o mestrado, queria o doutorado, estudar fora, mas ano passado faleceu de câncer. Então, eu sinto também como se fosse uma realização por ela, uma continuação de um sonho dela também”.