Estudante egressa de Química apresenta pesquisa em evento na Holanda

Maior congresso de Química do mundo tem como foco as áreas de Química Analítica, Química Industrial e Medicinal e Engenharia Química

Por Diana Monteiro - jornalista
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A graduação na licenciatura em Química foi no Campus Arapiraca da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), com intercâmbio na Universidade de Coimbra (Portugal). No mestrado e no doutorado também foi aluna da Universidade, desta vez no Campus A.C. Simões, no Programa de Pós-graduação em Química e Biotecnologia (PPGQB). Essa trajetória acadêmica toda realizada na instituição alagoana é considerada por Maria Célia Tavares como grande marco em sua vida. Em agosto ela foi uma das participantes do maior evento de Química do mundo, o 49th IUPAC World Chemistry Congress, com edição este ano em Haia na Holanda, onde apresentou trabalho desenvolvido na Universidade, fruto de seu doutorado.

Denominado de Determination activity urease of H. pylori in human saliva, o trabalho na área de Química Analítica, teve a orientação do professor Josué Carinhanha, do Instituto de Química e Biotecnologia (IQB). A pesquisa foi pautada no desenvolvimento de metodologias analíticas para determinar a atividade da urease [enzima responsável pela degradação da ureia em amônia e bicarbonato] em diferentes sistemas, incluindo urease produzida pela bactéria H. pylori.

O estudo científico também contemplou o desenvolvimento de um dispositivo de baixo custo para avaliar a infecção por H.pylori, uma bactéria que está relacionada, dentre outras coisas, ao acometimento de gastrite e, por consequência até ao câncer de estômago. A ideia, é tentar fazer um dispositivo de baixo custo em que se use uma amostra da saliva para ter o pré-diagnóstico e dê uma condição clínica se a pessoa tem ou não possibilidade de estar infectada. Isto, para a realização de exames mais invasivos, como a endoscopia, por exemplo.

Para o orientador Josué Carinhanha a escolha de Maria Célia foi muito assertiva, uma vez que se trata do maior evento da área de Química do mundo, por agregar diferentes pesquisadores e participantes associados a culturas distintas de países diversos. A IUPAC ocorre a cada dois anos e reúne renomados pesquisadores das áreas de Química, Química Industrial e Medicinal e Engenharia Química do mundo todo. 

“Foi uma seleção acertada, fortuita também, porque conseguiu ser dentro de um determinado tempo, pois o trabalho do doutorado já estava concluído. Então, quanto a esse aspecto, acho que foi a melhor escolha e o melhor evento que poderia ter sido selecionado para apresentação”, enfatiza o orientador.

Em 2022, durante o doutorado, Maria Célia Tavares recebeu o Prêmio Jovem Pesquisador da Royal Society of Chemistry em parceria com a Sociedade Brasileira de Química (SBQ), durante a 45ª Reunião Anual da referenciada sociedade ocorrida em Maceió, e que também viabilizou à sua ida ao renomado congresso internacional realizado na Holanda. O prêmio poderia ser utilizado no custeio da participação em um evento internacional da área de Química, importante para o trabalho da pesquisadora e seu desenvolvimento profissional. “Eu quis participar da IUPAC por ser um evento diferente de todos, por reunir pessoas de todo o mundo e de todas as áreas da Química, possibilitando network e conhecer outros trabalhos”, explica.

Ela revela ainda que a participação na IUPAC representa um marco em sua sua carreira profissional e um encerramento do ciclo da melhor maneira possível: “Apresentei em inglês a minha pesquisa de doutorado para diferentes pessoas do mundo e pude receber muitos feedbacks. O PPGQB do Instituto de Química e Biotecnologia da Ufal tem um papel importante na minha trajetória profissional, pois fiz mestrado e doutorado em diferentes laboratórios, ampliando o meu conhecimento na Química Analítica estando pertinho de casa, com o suporte e o incentivo necessários”.

Maria Célia Tavares diz que durante a IUPAC Chains 2023, fez network com pesquisadores de Portugal, Holanda, Espanha e Brasil, e conheceu o Nobel de Química de 2016, Ben Feringa, Laura L. McConnell, uma química analítica que sempre a inspirou; e Andrew Shore, representante da Royal Chemical Society na IUPAC 2023, além de rever o professor Christopher Brett, da Universidade de Coimbra, instituição onde durante a graduação fez o intercâmbio. 

Referência

O professor Josué Carinhanha, além de enaltecer a importância do trabalho de Maria Célia Tavares desenvolvido no âmbito da Ufal, assim como a sua escolha para a IUPAC, aproveita para reforçar a participação de alunos e de pesquisadores da instituição alagoana em eventos internacionais.

“Isso só coloca a Ufal no maior patamar, mostra que nós fazemos ciência que é de qualidade, que é competitiva e atende a demandas mundiais. Então, temos sempre que pensar em aspectos locais, regionais e gerais no âmbito, evidentemente, mundial. O trabalho de Maria Célia representa tudo isso. Certamente, a seleção, a escolha dela pelo evento e a importância do trabalho nesse contexto, foram sábias”, diz.

Para o professor, orientar Maria Célia foi uma oportunidade. “Eu me coloco como uma pessoa muito sortuda, vou colocar dessa maneira, em relação à orientação da Maria Célia, porque foi uma honra, um prazer. Ela tem uma história de vida fascinante, de superação e um perfil pela Ciência, espetacular. Ela gosta, ela vive e ela faz isso, não só para desenvolvimento pessoal, mas para ajudar todo o entorno dela, seja local, seja nacional”. E enfatiza que, evidentemente, tudo isso perpassa pela disciplina dela, pela capacidade que ela tem de estudar e de racionalizar.

Ele destaca ainda a já relevante contribuição de Maria Célia Tavares na área de formação científica: “Temos uma série de projetos juntos e quem sabe possamos executá-los no futuro! Só engrandecer tudo que ela fez durante o doutorado, que foi evidentemente de grande valia e impacto para o meio científico”.

Impacto

Josué Carinhanha aproveita para enfatizar e explicar o impacto do estudo realizado e proposto: “O estudo para avaliação à infecção por H.pylori, pode ter um impacto médio ou grande a um prazo maior, evidentemente grande. Se conseguirmos tornar tudo isso comercial (dispositivo), pode ser um grande avanço no sentido de ter um teste mais rápido, onde em cerca de 20 minutos consegue-se ter uma resposta”.

Segundo o pesquisador, um teste dito rápido comercial pode ter que aguardar entre uma e três horas em casos, e que estar suscetível a falsos positivos. “Então, o nosso teste agrega uma série de vantagens. Além das já elencadas, a exemplo do baixo custo e rapidez, também a relacionada à seletividade para a resposta. E repito, confirmando o que eu já havia falado anteriormente: que o trabalho de Maria Célia é efetivamente de impacto mundial. Estamos concluindo só algumas amostras a mais para, evidentemente, pensarmos na publicação”, comemora Josué Carinhanha.

Interiorização: grande marco

Docente efetiva do Instituto Federal de Alagoas (Ifal), em sua história de vida, Maria Célia diz que a Ufal foi determinante quando oportunizou o acesso ao ensino superior público e gratuito, a partir da interiorização. E aproveita para destacar:

“A Ufal é a realização da promessa de Deus em minha vida, e sinal de que as orações da minha mãe foram ouvidas, pois sempre que passávamos em frente à universidade, ela afirmava: ‘Com fé em Deus, as minhas filhas vão estudar aqui’. A interiorização da Ufal me permitiu sonhar com o curso superior e quando o sonho se tornou realidade, pude conhecer outras culturas, ter uma formação de qualidade, desenvolver habilidades relacionadas ao ensino, à pesquisa e à extensão, além de ter rompido ciclos".

E na continuidade que a instituição alagoana trouxe possibilidades para a grande mudança de vida, Maria Célia enfatiza: “O esperado para meninas pobres, do interior, filha de mãe solo e analfabeta são as limitações sociais e de acesso à universidade. Além disso, a luta pela subsistência sempre fala mais alto e as oportunidades são escassas ou ceifadas".

E nesse contexto, Maria Célia faz um destaque especial e tece agradecimentos: “A formação de qualidade e as oportunidades que surgiram a partir do ensino superior e da pós-graduação na Ufal e no PPGQB-IQB, aliadas às políticas de permanência com as bolsas de estudos, me possibilitaram romper esse ciclo e encorajar outras pessoas a trilharem novos caminhos. Sou imensamente grata por isso e a todos que fizeram parte da minha trajetória”, afirma a professora destacando o quanto foi determinante a instituição alagoana para a trajetória de conquistas com exitosa carreira acadêmica e profissional.