Estudante conta história das fábricas têxteis de Rio Largo em livro pop-up

Trabalho de Valnice Eleutério mostra o antes e o depois de construções deixadas por indústrias que funcionaram nos séculos 19 e 20

Por Thâmara Gonzaga - jornalista
- Atualizado em
Valnice e a orientadora, professora Mariana Hennes
Valnice e a orientadora, professora Mariana Hennes

A história do município de Rio Largo, o terceiro mais populoso de Alagoas conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é marcada por ser um dos primeiros locais do estado a sediarem atividades industriais do ramo têxtil. Uma fase de desenvolvimento que modificou a paisagem urbana da cidade, mas que vem sofrendo um apagamento pela deterioração das edificações da época.

Parte desse patrimônio foi pesquisado e transformado em um livro pop-up pela estudante do curso de Design da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Valnice Eleutério, que usou de seu talento para as artes gráficas a fim de resgatar e registrar a história do lugar onde reside.

“Rio Largo foi reconhecida como a primeira cidade industrial de Alagoas. A realidade em que se encontra o patrimônio edificado deixado pelas fábricas têxteis dos séculos 19 e 20, que está em ruínas e tendendo ao desaparecimento devido à falta de manutenção, foi o que me motivou a deixar um registro desses espaços e ter a possibilidade de mostrá-los, em outra perspectiva, para os próprios moradores e possíveis pessoas que queiram conhecer o município”, detalhou a estudante, ao explicar a escolha do tema de seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).

O livro ‘Rio Largo em pop-up’ apresenta cinco edificações históricas que pertenciam à Companhia Alagoana de Fiação e Tecido (Caft). Com uma abordagem lúdica, a obra conta a história, traz imagens desses espaços na época de funcionamento e outras mostrando como se encontram hoje em dia. “Quis colocar esse antes e depois para trazer um choque de realidade ao leitor. Em algumas páginas, também têm curiosidades sobre as edificações”, apontou a autora.

Uma dessas construções, citou Valnice, é o Grupo Escolar Gustavo Paiva, construído em 1919 e instalado em frente à antiga Fábrica Progresso, que oferecia ensino até o 4º ano primário com vagas ofertadas aos filhos dos funcionários das indústrias. “Era uma instituição de ensino muito relevante para a população. Além de um ensino de qualidade, contava com alimentação, aulas de música, teatro e havia uma banda feminina de jazz. Esse espaço, que já foi tão importante para muitas gerações, se encontra abandonado há mais de uma década e entregue ao tempo e ao esquecimento”, lamentou.

O material, segundo a estudante, tem potencial para ser utilizado em aulas sobre o patrimônio histórico da cidade de Rio Largo, criando um sentimento de pertencimento e alertando sobre a necessidade de preservação da arquitetura e da memória.

“Serve para qualquer idade, mas o fato de ser pop-up chama muito a atenção de crianças e um dos objetivos do livro é, justamente, alcançar esse público para que possa entender a importância da preservação do patrimônio desde cedo”, destacou.

Mais do que cumprir o requisito de entregar o TCC, Valnice teve a intenção de deixar uma contribuição social. E esse compromisso dela em cooperar para ações de repercussão coletiva já é reconhecido pela comunidade universitária. Isso porque, durante estágio na Assessoria de Comunicação (Ascom) da Universidade, ela foi responsável por criar a marca que identifica a Semana de Pesquisa, Tecnologia e Inovação na Educação Básica (Sinpete), evento anual realizado pela Ufal, desde 2022, e que reúne estudantes de diversas cidades alagoanas.

“Ao elaborar o livro, eu só pensava o quanto eu estaria contribuindo para a história da minha cidade. Certa vez, uma professora falou para turma que o TCC era a nossa contribuição para a sociedade dos anos que passamos na universidade. Essa frase ficou na minha cabeça e eu acredito que, com o livro, eu consegui contribuir para a sociedade e para os rio-larguenses”, afirmou.

Preservar a história

Ao longo das atividades de pesquisa realizadas na graduação sobre o patrimônio alagoano, Valnice conta que passou a ter uma percepção diferente sobre o local em que mora. “No grupo de pesquisa, eu pude aprender e entender a importância do patrimônio histórico para a preservação da memória de um lugar. A partir daí, comecei a enxergar a minha cidade com outros olhos e a educação patrimonial que recebi no grupo de pesquisa me fez querer contribuir de alguma forma”, relatou.

Foram meses de estudo e visitas aos locais que sediaram as antigas fábricas, pois, além do produto gráfico, ela teria que entregar o trabalho escrito. “Passei pelo processo de entender a importância que aqueles espaços tiveram na vida dos moradores e o quanto ainda são lembrados por eles. Essa pesquisa foi o que me orientou nas escolhas das construções que eu iria contemplar na obra”, revelou.

A criação do livro foi outro desafio. Muito utilizado em obras infantis, os pop-ups são recursos elaborados a partir de cortes e dobraduras em papel para criar um efeito tridimensional ao movimentar as páginas, dando forma a personagens ou imagens, deixando a leitura mais dinâmica e atrativa.

“Não há muitos materiais que ensinam sobre pop-up em português, então esse foi um ponto de dificuldade que encontrei, pois nunca tinha feito e nem tinha uma referência, mas contei muito com o apoio da minha orientadora, Mariana Hennes. A construção dos mecanismos foi de muitos testes, tanto das dobraduras quanto do material adequado, para que os elementos funcionassem perfeitamente ao abrir o livro”, descreveu.

Um trabalho completo, cheio de significado e que repercute a favor da preservação do patrimônio histórico da cidade de Rio Largo e de Alagoas. A recomendação da banca examinadora foi para publicar a produção de Valnice e ela pretende concorrer a editais de fomento à cultura ou buscar patrocínios para conseguir recursos para impressão de exemplares.

“A banca mencionou que, dificilmente, os alunos de conclusão de curso conseguem entregar um projeto concluído. Geralmente, só apresentam a ideia e finalizam com um mockup digital [representação visual], então, isso também foi um ponto positivo para mim. Fiquei muito feliz”, comemorou.

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