Pesquisa avalia uso de medicamentos e psicoativos por estudantes na pandemia
Trabalho será coordenado pela professora do curso de Farmácia, Aline Fidelis, e faz parte do ciclo 2020-2021 do Pibic
- Atualizado em
Determinar o perfil dos estudantes no âmbito da toxicologia psicossocial considerando a pandemia. Esse é o objetivo da pesquisa coordenada pela professora Aline Fidelis, do curso de Farmácia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), que integra o ciclo 2020-2021 do Programa de Iniciação de Bolsas a Docência (Pibic). Os detalhes do trabalho que deve ter início já no mês de outubro foram dados durante participação da pesquisadora no projeto Ciseco Entrevistas, cujo vídeo na íntegra você pode conferir clicando aqui.
“Essa pesquisa envolve um aluno de mestrado e dois alunos de iniciação científica. Queremos saber se o momento da pandemia fez com que as pessoas, mais precisamente os estudantes de graduação da Ufal, tiveram alguma alteração no uso de medicamentos e substâncias psicoativas sejam lícitas ou ilícitas”, explicou a pesquisadora durante entrevista concedida à também docente da Ufal, Manuela Callou.
Como exemplo, Aline citou que, nos Estados Unidos, pessoas apresentaram intoxicação por utilizar produtos de limpeza na intenção de tratar o Coronavírus. “Aqui no Brasil a gente não tem dados ainda, mas, nos Estados Unidos, houve uma mensagem de que as pessoas, para se tratar da covid-19, poderiam injetar produtos de limpeza no corpo – infelizmente foi o presidente quem fez essa afirmativa – e as pessoas passaram a apresentar intoxicações por conta desse uso realmente esdrúxulo de produtos de limpeza”, lamentou a docente.
O erro da automedicação para tratar a covid-19
Outro ponto destacado durante a participação da professora no Ciseco Entrevistas foi a indicação de medicações para o tratamento da covid-19. Segundo Aline, a insistência em testar medicamentos já existentes se dá pelo fato de que todos eles, até chegarem aos pacientes, cumprem uma trajetória de pesquisas. “Dessa forma, fármacos que já tenham sido utilizados em outras doenças virais e que tenham mecanismos farmacológicos bem definidos com indícios de efetividade viral estão sendo testados por cientistas”, complementou.
Ela explicou que o desenvolvimento desses medicamentos consiste em quatro fases: a primeira, avalia a questão da toxicidade e eficácia; a segunda, já com população-alvo, avalia a eficácia do fármaco e envolve mais pessoas. Já a terceira fase, trata de estudos randomizados, onde as pessoas são escolhidas aleatoriamente, como o exemplo da vacina desenvolvida por um laboratório chinês e testada no Brasil pelo Instituto Butantan. Após passar por toda a fase de registro – no caso do Brasil isso se dá pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), pode-se considerar que o insumo vai para a fase 4, chamada de farmacovigilância.
“Todo esse período leva para alguns medicamentos em torno de 15 anos. Por isso que, em parte, se justifica a pesquisa clínica por fármacos que já sejam utilizados para outras doenças virais e nesses casos estão em andamento alguns estudos clínicos com alguns medicamentos, mas isso não pode se confundir com a automedicação que é muito prejudicial e não requer respaldo científico”, ressaltou Aline Fidelis.
Hidroxicloroquina contra a covid-19 pode ser mais tóxica que benéfica
A pesquisadora comentou ainda sobre a polêmica em torno do uso da hidroxicloroquina. Segundo ela, o medicamento não apresenta comprovação científica contra o novo Coronavírus e, se associado a outros remédios, pode trazer efeitos ainda mais tóxicos e graves para a saúde das pessoas.
“Houve um teste in vitro com a hidroxicloroquina usando células infectadas com o vírus, ele foi ativo e pronto, agora ela é o tratamento para a covid-19. Na verdade, in vivo, ou seja, na questão clínica, ainda não temos evidência científica de que ela atue positivamente, pelo contrário, ela não é eficaz para o tratamento e ainda pode trazer sérios efeitos tóxicos. Associada ao azitromicina também traz efeitos mais sérios e isso precisa ser esclarecido à população com uma linguagem muito acessível. Já que a gente tá tendo essa profusão de mensagem enaltecendo esses medicamentos, é preciso que haja um enfrentamento com mensagens e informações coerentes, mas palpáveis para a população”, refletiu Aline.
Ela destacou também que a população, em geral, está esperançosa para que se encontre a cura para o Coronavírus, mas a pandemia reforçou que a ciência não se faz de um dia para uma noite.
“A pressão social está acontecendo, mas é preciso respeitar a metodologia científica pra que a gente tenha segurança nesses resultados e não é fácil você enfrentar toda uma esperança e acelerar o desenvolvimento de um medicamento. Não é só dizer que a hidroxicloroquina é a salvadora da pátria, não, é preciso fazer os ensaios que já são previstos. E para a covid-19 é preciso fazer os estudos. Já temos duas publicações de estudos que mostram evidências de que ela é mais tóxica do que benéfica. Então é preciso pensar sobre essas questões”, contou a pesquisadora.
Diálogo no combate ao movimento antivacina e às fake news
Outro ponto de bastante importância debatido foi o combate a desinformação. Como exemplo, a pesquisadora citou o movimento antivacina e a alta frequência da divulgação de notícias falsas, que ela classificou como ‘altamente prejudiciais’. Por conta disso, a docente sugere a popularização do conhecimento para a população de forma clara e dinâmica.
“Na questão dos medicamentos e vacinas a gente tem visto toda repercussão em relação aos medicamentos veiculados para o tratamento do Coronavírus. Algumas notícias falsas são muito difíceis de a gente desconstruir, mas é preciso fazer. A questão da vacina, o [fato de se dizer] ‘eu não quero a vacina chinesa’. Isso está numa proporção que os profissionais de saúde e cientistas precisam, a partir do momento em que ela for validada, popularizar esse conhecimento, para que as pessoas confiem na evidência científica”, alertou.
Ela comentou ainda que o período atual é quase uma desconstrução dos experimentos científicos e dos pesquisadores. “Eu realmente me pergunto o por quê da divulgação incorreta sobre esses medicamentos tão enaltecidos e parece que a informação correta fica meio que diluída ali no meio dessa corrente tão forte de informações tendenciosas”, disse ela recordando sobre o movimento recente de pessoas que não desejariam tomar a vacina pelo fato de ter a cloroquina no Brasil.
“E como se enfrenta esse tipo de informação? Avaliar que público é aquele que tá disseminando essas informações e tentar intervir de forma ao convencimento mesmo, num diálogo contínuo e que não pode parar, pra gente esclarecer essas questões. Tudo precisa ser difundido de forma que as pessoas saibam as limitações, efeitos colaterais e benefícios, afinal medicamento é risco benefício. Vai ser um processo complexo, mas é preciso enfrentar. Têm horas que não dá tempo, pois são muitas fake news e, quanto mais informação correta para a população, melhor”, salientou Aline Fidelis.
É preciso manter os cuidados, pois a pandemia ainda não acabou
Que o estado de Alagoas vem registrando, diariamente, uma queda no registro de óbitos pelo novo Coronavírus isso é um fato. No entanto, ainda existe o registro de alagoanos infectados pela doença, afinal, a pandemia ainda não acabou. Sabendo disso, a pesquisadora do curso de Farmácia da Universidade Federal de Alagoas, Aline Fidelis, reforçou a importância de não relaxar nos cuidados contra a covid-19 e elogiou a campanha do Governo de Alagoas ao dar voz para médicos e pesquisadores já conhecidos do público para alertar sobre o perigo e os cuidados contra a doença.
“Aqui em Alagoas a gente tem uma campanha muito boa onde os médicos do estado foram os protagonistas. Gostei muito daquela campanha, acredito que deveriam dar continuidade. São médicos conhecidos da sociedade alagoana, então passa credibilidade. Eles estavam em mais de uma mídia, como TV aberta, outdoor, outbus, pontos de ônibus, enfim, esse tipo de campanha publicitária é importante pra que as pessoas mantenham os cuidados e o distanciamento”, ressaltou.
Ela refletiu ainda que os feriados recentes apontaram descontinuidade no respeito às medidas de isolamento e distanciamento social no país, mas que sempre é preciso retomar, afinal de contas, são medidas como essa que podem salvar vidas.
“As pessoas estão se dizendo cansadas do distanciamento social, mas a gente não pode se cansar também e a imprensa também não. Todos precisam num conjunto de ações manter a informação para as pessoas de que a pandemia não acabou. Temos EPIs mais eficientes, produção de máscaras caseiras orientadas cientificamente, então é preciso que a gente continue disseminando essas informações para que as pessoas mantenham esses protocolos. É incomodo usar a máscara? É. Mas é um momento. A gente também precisa fazer esse tipo de informação circular. Vai passar!”, concluiu Aline Fidelis.
Sobre o projeto
Por conta da pandemia do novo Coronavírus, o Pentálogo XI do Ciseco não será realizado de forma presencial este ano. Assim, surgiu o projeto Ciseco Entrevistas, que conta com a participação de ilustres convidados. O intuito da iniciativa é promover o debate e aproximar pesquisadores mesmo à distância, sob uma nova forma de interagir e trocar conhecimentos.
Além da conversa de Manuela Callou com Aline Fidelis, todas as entrevistas do projeto estão disponíveis no canal do Ciseco no YouTube.