Professora promove educação antirracista na educação infantil

Projeto realizado pela docente Meiriane Ferreira, do Colégio Telma Vitória, foi apresentado, recentemente, em congresso da área de Educação

Por Thâmara Gonzaga - jornalista
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Crianças do maternal 1 durante atividade lúdica
Crianças do maternal 1 durante atividade lúdica

Há uma frase de Nelson Mandela que diz que ninguém nasce odiando outra pessoa por causa da cor da pele, mas que são ensinadas a odiar; de modo que também podem ser ensinadas e aprenderem a amar, a respeitar. Essa é uma ideia que inspirou o trabalho da docente do Colégio de Aplicação Telma Vitória (CAPTV) da Ufal, Meiriane Ferreira, ao realizar um projeto que consiste em desenvolver práticas pedagógicas antirracistas com crianças pequenas.

“É uma proposta inovadora no âmbito da educação infantil no estado de Alagoas. As diversas ações desenvolvidas têm como foco desenvolver tais práticas por meio da brincadeira e das interações, que são eixos do currículo desta etapa da educação básica”, explica a professora.

No Brasil, desde 2003, há a lei 10.639 que obriga as redes de ensino fundamental e médio, públicas e privadas, a ensinarem sobre a história, a luta, a cultura e a contribuição da população negra para a formação da sociedade brasileira. O dispositivo é uma das ferramentas em busca de promover o esclarecimento e superar o racismo estrutural no país, o qual discrimina pessoas e as submete a condições de desigualdade por conta da cor de sua pele.

No contexto escolar, por exemplo, o racismo estrutural faz com que as crianças e jovens negros sejam a maioria nos índices de analfabetismo e de evasão. Por isso, a justificativa da docente do CAPTV de abordar a temática o quanto antes com as crianças, ao considerar “a relevância e urgência da disseminação da temática na área da educação e para toda a sociedade”, diz ela.

Uma das primeiras ações desenvolvidas por meio do projeto, conta a professora, foi organizar uma área de interesse na sala de referência das crianças, na faixa etária entre dois e três anos, onde bonecas negras estivessem facilmente disponibilizadas para situações de brincadeira de faz de conta. Oficinas de contação de histórias com ênfase em literatura infantil que abordasse a educação para as relações étnico-raciais, conforme prevê legislação específica, também foram contempladas.

Atividades simples e acessíveis, valendo-se do contexto lúdico, mas impactantes ao ensinarem sobre a alteridade e o respeito, além de criar o sentimento de identidade para as crianças negras, fortalecendo, desde a infância, a autoestima e o reconhecimento.

A estudante de pedagogia da Ufal, Quézia Noemi de Lima, é mãe de uma criança negra que participou das atividades. Ela falou da alegria de observar a realização do projeto, “por meio da utilização de bonecas negras, em uma proposta de cuidados e valorização, e as contações de histórias que ilustram a de vida de pessoas negras admiráveis”.

“Essas propostas trazem à tona a rica herança cultural que permeia a identidade de nossos filhos. Acredito que esse esforço não apenas enriquece o ambiente escolar, mas também contribui para o desenvolvimento saudável da autoestima e identidade de minha filha. É crucial que ela, desde tenra idade, seja capaz de reconhecer e valorizar sua própria cor, sua história e sua cultura” disse.

E reforçou: “Espero que o projeto contribua para sensibilizar a todos sobre a diversidade e a importância de respeitar as diferenças. Ao criar um ambiente onde todas as crianças são incentivadas a se orgulhar de quem são, tenho confiança de que a turma se torne um espaço inclusivo e acolhedor para cada criança, independentemente de sua cor de pele”.

Em uma sociedade ainda marcada por fortes traços e atitudes de preconceito, Meiriane ressalta que “quanto mais cedo as iniciativas antirracistas forem incorporadas no currículo escolar, maiores serão as possibilidades para que as crianças constituam suas referências em relação à identidade negra, combatendo o racismo estrutural”.

Quézia reconhece e reforça a relevância da atividade. “Agradeço profundamente por proporcionar para a minha filha e aos colegas dela a oportunidade de se verem representados de maneira positiva no ambiente escolar. Acredito que a educação desempenha um papel fundamental na formação de mentes abertas e conscientes, e o trabalho da professora Meiriane é um testemunho do comprometimento dela com esse princípio”, disse a estudante.

Relato de experiência apresentado

O projeto já resultou em contribuição acadêmica para a área de pedagogia e foi apresentado por Meiriane, em outubro, no 9º Congresso Nacional de Educação realizado em João Pessoa, Paraíba.

A finalização das atividades será ao final do semestre letivo por meio da organização de materiais, a exemplo de brinquedos e livros de literatura com a abordagem mencionada, utilizados pelas crianças da turma do maternal I, nomeada de turma Passarinhos ao longo de 2023, com o objetivo de ser direcionados para as demais turmas da unidade.

“Será encaminhada, ainda, uma carta à gestão do Colégio de Aplicação sugerindo a inserção de uma proposta antirracista para a educação infantil no Projeto Político Pedagógico da unidade”, informa a docente.