Galhas produzidas por insetos protegem suas larvas em incêndios florestais
Essa descoberta é resultado de um estudo recém-publicado na revista Ecology, com participação de pesquisadores da UFS e da Ufal, que identificou em estruturas naturais produzidas por insetos a função de barreira térmica protetora para seus ovos
- Atualizado em 30/05/2025 21h28

Um estudo recém-publicado da revista Ecology observou o primeiro caso de galhas protegendo larvas de insetos contra o fogo. O professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) em Penedo, Guilherme Demétrio, participou da pesquisa liderada pelo professor Jean Carlos Santos, da Universidade Federal de Sergipe, e conta que, após um incêndio em uma fazenda de Minas Gerais, algumas larvas de uma espécie de gorgulho foram encontradas vivas dentro das galhas na planta conhecida por lobeira (Solanum lycocarpum).
Guilherme explica que as galhas são protuberâncias bulbosas, induzidas pelo gorgulho-de-Boheman para servir de alimento e também como uma forma de abrigo temporário para seus ovos. Para exemplificar, ele conta que alguns insetos que se alimentam de plantas podem mastigar as folhas, como as lagartas e os gafanhotos, ou sugar a seiva, como os pulgões e os soldadinhos. Já o gorgulho coloca seus ovos nas plantas e induz um crescimento anormal das células, chamados de galha. É a galha que reveste o ovo, gerando proteção e uma fonte de alimento para o inseto que nasce desse ovo.
Mas os pesquisadores identificaram outra função importante dessas estruturas: “As larvas crescem dentro das galhas, se alimentam e se protegem lá até, em geral, sua muda para adultos. O que nós descobrimos nesse trabalho é que, em lugares que apresentam incêndios como parte dos ciclos ecológicos, como Cerrado, as galhas também podem ajudar a proteger essas larvas de insetos do fogo”, ressaltou o professor sobre a descoberta da estrutura para preservação da espécie.
Achados para a pesquisa
O artigo científico, escrito por uma equipe de ecólogos e entomólogos afiliados a diversas instituições no Brasil em colaboração com um pesquisador do México, descreve como aconteceu a descoberta. Foi durante uma caminhada pela área de Cerrado após queimada que o professor Jean Carlos Santos encontrou a planta com galhas ainda identificáveis e, após constatar uma larva sobrevivente ao intenso calor do fogo, retornou com uma equipe para coletar amostras e avaliar se aquela descoberta inicial seria apenas um caso isolado.
“Eu fui responsável pela análise estatística dos dados, bem como da escrita de parte do trabalho. Constamos que em áreas onde ocorreram incêndios, galhas com paredes mais grossas foram essenciais para a manutenção da vida das larvas, sendo que 66% delas sobreviveram”, destacou o professor Guilherme.
De acordo com a pesquisa, em 20 galhas analisadas, todas as larvas sobreviveram ao fogo. Outras 23 continham pelo menos uma larva morta e, em outras nove, nenhuma larva sobreviveu. Essa diferença, os pesquisadores atribuem à espessura das paredes da estrutura, que quando se apresentavam mais espessas, maior a probabilidade de resistir ao fogo.
“Já na área sem fogo, galhas com paredes grossas representaram um problema, porque essa parede grossa também é um empecilho para a saída do inseto adulto. Então, é quase como uma aposta: se tiver fogo, paredes grossas auxiliam a sobrevivência; sem fogo, o benefício já não é tão alto assim”, avaliou.
Contribuições
A pesquisa com participação de Guilherme Demétrio, professor da Unidade Educacional de Penedo da Ufal, tem repercutido internacionalmente com destaque para o auxílio à compreensão das mudanças na região do Cerrado e as reações dos organismos com as plantas.
“Nós vivemos um momento chave na história do planeta, em que várias crises se interseccionam e é mais do que premente a necessidade de encontrarmos saídas que nos permitam viver bem, enquanto espécie humana, mas que também garantam o direito de existência a todas as outras espécies que dividem o planeta conosco. Compreender como os fatores ambientais, como os incêndios, interagem com as espécies e como essa relação gera os padrões evolutivos e ecológicos que nos cercam é essencial pra gerarmos o conhecimento necessário pra isso”, ressaltou Guilherme.
O docente acrescenta que eventos extremos tendem a ser mais frequentes e mais intensos no atual contexto de mudanças climáticas globais. Por isso, enaltece as contribuições das pesquisas científicas: “Entender cada pedacinho de relação entre os organismos e seus ambientes pode ser a chave pra garantir um mundo mais equilibrado. Isso tudo faz com que eu me sinta um pouquinho mais da solução para a crise planetária, e me deixa muito feliz saber que também posso carregar o peso de uma instituição séria como a Ufal nesse processo”.
