Amaje: as mãos que costuram o futuro nas águas da lagoa de Jequiá da Praia
Empreendedorismo feminino transforma realidade de pescadoras e artesãs com sustentabilidade, arte e união no interior de Alagoas
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Jequiá da Praia, interior de Alagoas. É no município com menos de 10 mil habitantes que uma força feminina se destaca: as mulheres da Amaje - Associação Mulheres em Ação de Jequiá da Praia. Guerreiras do dia-a-dia, elas são pescadoras e artesãs que tiram seu sustento das águas e transformam a realidade de suas famílias e da comunidade com trabalho, arte e coragem. Eliana Farias, a presidente da Amaje confessa que liderar o grupo tem sido um caminho cheio de desafios. “Não é fácil ser líder. Não é fácil tocar o barco com tanto trabalho, com tantos desafios. Nada é fácil na nossa vida.”
Essas mulheres recebem capacitação por meio de professores e parceiros que percorrem o Brasil levando conhecimento às comunidades. Com mãos habilidosas, produzem arte e preservam a natureza, usando materiais como casca de siri, palhas, fibras de coqueiro e bananeira, além de papelão reciclado.
Fundada por pescadoras e artesãs, a Amaje é hoje um espaço de trabalho coletivo, formação, partilha de saberes e geração de renda. Cada produto feito à mão sustenta sonhos e famílias, e a associação se tornou símbolo de resistência, dignidade e empoderamento feminino. A vice-presidente da associação Neide Gomes ressalta a importância de se inscrever em editais: “A gente conseguiu trazer muitos representantes aqui para Jequiá, até o embaixador da Espanha. Começamos a nos inscrever em editais, porque é assim que a gente se fortalece.”
O reconhecimento veio de forma grandiosa: a Amaje conquistou o primeiro lugar entre 482 projetos no edital internacional “Espanha Reconhece”, voltado a iniciativas de impacto social. O prêmio abriu as portas do mundo para a associação, que hoje recebe visitantes do Brasil e de vários outros países.
Entre essas visitantes está dona Dalvina Helena, produtora rural do grupo MULT Mulheres de Terenos, do Pantanal Sul-mato-grossense: “Conheci esse grupo em 2002, quando também participamos do prêmio Espanha Reconhece. Hoje, por coincidência, estou aqui visitando elas com nosso grupo, e vamos conhecer a tão comentada Lagoa Jequiá.”
Esses exemplos de superação ultrapassam fronteiras e inspiram até quem está mais próximo. Alunos e professores da Escola Municipal Professora Medéa Cavalcanti, da Barra de São Miguel, realizaram uma visita técnica ao Rancho das Cheirosas, onde puderam acompanhar todo o processo de produção de adubo orgânico: desde a coleta e lavagem das cascas de siri, passando pela secagem, trituração e empacotamento.
“Viemos conhecer essas mulheres empoderadas, que tanto fazem pelo meio ambiente, pelas outras mulheres e pela comunidade. É um grupo inspirador. Nosso objetivo é nos inspirar nelas e reproduzir muito do que é feito aqui.”
Jaciel Rodrigues, nascido e criado às margens da Lagoa Jequiá, é testemunha do impacto da Amaje na valorização da cultura local e na preservação ambiental: “Antes, muitos pescadores jogavam lixo na lagoa sem consciência do impacto. Essas mulheres viram que isso estava destruindo nosso bem mais precioso. Elas se uniram, bateram de porta em porta e pediram que parassem de jogar cascas de siri na lagoa. Graças a esse trabalho incrível, a poluição diminuiu muito. Elas fazem um trabalho de enorme importância.”
As atividades da Amaje são diversas: produzem almoços com pratos típicos, encantando pelo sabor e pelas histórias de cada receita. Desenvolvem também um artesanato sustentável, mesclando tradição e inovação com respeito à natureza. São mestras na arte do filé e do crochê, e compartilham esse saber ancestral em oficinas, com apoio do Sebrae. O que poderia prejudicar a natureza é transformado em fonte de renda, arte e conscientização.
A experiência com a Amaje vai além do trabalho: os visitantes participam de passeios de barco pelas águas calmas da Lagoa Jequiá, com destino ao Rio Gelado. E como manda a tradição, a música e a dança também têm espaço: a associação resgatou o grupo de dança das baianas, mantendo viva a chama da cultura local. A sede da Amaje está sempre de portas abertas para quem deseja conhecer de perto esse trabalho inspirador. Para quem ainda não visitou, é uma oportunidade única de se encantar com histórias reais de força, união e transformação social.
As mulheres da Amaje estão, sim, transformando o mundo com mãos que costuram o futuro e saberes que atravessam gerações. Com criatividade, sustentabilidade e um profundo compromisso com a terra e com a cultura do seu povo, o que floresce aqui é mais do que renda: é dignidade, pertencimento e transformação real, feita com a força do empreendedorismo feminino e a coragem incansável de quem se reinventa todos os dias.
Confira a visita que a equipe de reportagem fez à Amaji aqui.