Sentimentos podem ser usados em favor de sua carreira

Estudos apontam relação de sucesso e habilidades comportamentais


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Larissa Baroni – Portal Universia

Nem sempre o baixo desempenho profissional está relacionado à ausência de conhecimentos técnicos. Já há estudos que comprovam que a diferença entre as pessoas que obtêm grande sucesso e aquelas com performance mediana estaria majoritariamente direcionada a competências comportamentais. Segundo o psicólogo e autor do livro A Inteligência Emocional, Daniel Goleman, essa proporção é comum em 90% dos casos. Os dados apontam ainda que o fator é mais evidente do que às técnicas aprendidas na escola.

Apesar da constatação da eficácia da chamada Inteligência Emocional, a professora e coordenadora de estágios da Faculdade de Psicologia da Universidade Metodista, Angélica Capelari, acredita que o desconhecimento do termo, bem como de seu conceito, leva muitos brasileiros a ignorarem involuntariamente essa ferramenta. "Ainda que a nomenclatura Inteligência Emocional seja aparentemente recente (década de 80), seu conceito já é debatido pela psicologia há muito tempo", explica ela. Segundo Angélica, ser emocionalmente inteligente nada mais é do que saber controlar e usar as emoções a favor das situações vividas.

Uma inteligência que, de acordo com o professor do programa de mestrado e doutorado em avaliação psicológica da Universidade São Francisco, Ricardo Primi, está dividida em quatro capacidades: percepção, conhecimento, uso e regulação das emoções. "Ao mesmo tempo em que é preciso reconhecer os sentimentos quando ocorrem tanto em si como nos outros - até para não ser enganado -, é fundamental ter sabedoria para entender como as emoções funcionam e como diferem uma das outras", diz o professor. Com o domínio dessas habilidades, Primi afirma ser hora de agir. "Busque lidar com seus próprios sentimentos adequando-os às situações e dirija suas emoções a serviço de um objetivo", declara ele.

Habilidades que a princípio são direcionadas para o desenvolvimento pessoal de qualquer ser humano, mas que, na opinião da vice-coordenadora do curso de Psicologia da UFPB (Universidade Federal de Pernambuco), Monica Correia, podem ser transportadas para o ambiente de trabalho. "A inteligência emocional também propicia melhores relacionamentos inter e intrapessoal. Ao considerar que todas as profissões exigem interação e trabalho em equipe, os profissionais emocionalmente inteligentes podem levar vantagem", acredita ela.

A comprovação da funcionalidade da Inteligência Emocional não é apenas científica. A multinacional do setor de celulose e papel, International Paper, é um exemplo de empresa que prioriza a busca por profissionais que dominam as capacidades humanas inerentes ao chamado QE (Coeficiente Emocional). "Tanto nos processos seletivos internos como nos externos, priorizamos aqueles profissionais e estagiários que tenham capacidade de interagir com o novo e de lidar com situações de estresse", afirma o diretor de Recursos Humanos da, José Renato Domingues. Segundo ele, apesar da inexistência de um instrumento de avaliação validado e legítimo, a análise da inteligência emocional dos concorrentes é indireta. "Isso, portanto, não permite que tais habilidades se tornem pré-requisitos. Mas, são, sem dúvidas, diferenciais", diz o diretor.

Há ainda outras características relacionadas ao QE que, além de valorizadas pelas empresas, também são consideradas determinantes para o sucesso profissional. "Habilidades como empatia, autocontrole, automotivação, determinação, adaptação e intuição podem fazer grande diferença na carreira de um sênior ou até mesmo de um iniciante", descreve Monica. Ela afirma ainda que, nesses casos, a previsão em relação ao sucesso é bem maior. "Podem funcionar como diferenciais ou até mesmo com degraus para deixá-lo mais próximo das promoções", destaca ela.

A Inteligência Emocional, no entanto, não exclui a importância dos conhecimentos técnicos. Foi o que provou uma pesquisa realizada pelo LabAPE (Laboratório de Avaliação Psicológica e Educacional) da Universidade São Francisco. O estudo investigou a validade do QE relacionada a medidas de inteligência, personalidade e desempenho profissional. "Os funcionários que obtiveram os melhores resultados na avaliação individual foram os mesmos que obtiveram os maiores índices de inteligência emocional. No entanto, os resultados foram ainda melhores entre os profissionais com bons conhecimentos técnicos e alta competência comportamental", aponta Primi.

Domingues afirma que o mesmo acontece dentro da International Paper. "As avaliações não podem ser vistas de uma forma isolada, isso porque os conhecimentos técnicos, assim como os emocionais, são importantes", relata o diretor, que enfatiza a maior necessidade do domínio das competências comportamentais entre os profissionais que ocupam cargos gerenciais. "Eles têm mais necessidades de usar tal inteligência para criar ambientes mais positivos aos seus funcionários", exemplifica ele. Para Domingues, quanto mais complexas forem às organizações, maiores às necessidades de profissionais inteligentes emocionalmente.

Emoção com inteligência

Ao mesmo tempo em que a inteligência emocional pode levar ao sucesso, sua ausência é capaz de emperrar o desenvolvimento de qualquer carreira. Para o professor da Universidade São Francisco é a forma como os profissionais lidam com suas emoções que vai determinar qual dos caminhos ele se irá percorrer. E você, se considerada uma pessoa emocionalmente inteligente? Sabe usar tais capacidades humanas a seu favor? A existência das avaliações do QE, bem como a orientação psicológica, podem auxiliá-lo a obter tais respostas. No entanto, Primi aponta a auto-avaliação como o primeiro recurso.

A análise, segundo Monica, deve estar diretamente relacionada às conquistas e derrotas obtidas no ambiente de trabalho. "Tenha o hábito de avaliar todas as situações em que teve ou não êxito. Verifique os motivos que o levaram ao resultado para aprender com os erros e os acertos diariamente", aconselha ela. Essa postura, por si só, na opinião de Monica, já demonstraria um sinal de inteligente emocional.

Primi orienta ainda que os profissionais identifiquem suas próprias motivações no ambiente de trabalho e avaliem de que forma suas emoções dirigem suas atividades. "Todas as nossas ações são determinadas pelos sentimentos, inclusive o próprio pensamento. Portanto, é preciso tentar se distanciar sem se desconectar totalmente deles", aconselha Primi. Isso, porém, não significa a retração dos sentimentos. "Essa é uma regulação inadequada, até porque coloca em xeque sua própria personalidade", alerta ele.

Para exemplificar tal situação, o professor da Universidade São Francisco descreve uma possível briga entre chefe e funcionário. "Ainda que não seja recomendável expressar sua mágoa pelo superior, também não é indicado que a carregue. Até porque as ações podem acarretar uma possível demissão ou ainda propiciar um ambiente de convivência insustentável", afirma ele. De acordo com Primi, é preciso pensar e achar uma solução inteligente sem gerar problemas para o outro. "Busque um equilíbrio entre você e o mundo", resume.

A solução inteligente, de acordo com Monica, está na sabedoria em identificar como e qual é o melhor momento de encarar as mais variadas situações. "As relações podem piorar muito a depender da forma como se aborda ou mesmo como se reage a determinadas circunstâncias", diz ela. "Há duas maneiras de agir, por exemplo, quando você é mal atendida por uma servidora pública. Primeiro, reclamar do mau atendimento e reivindicar os seus direitos. Ou tentar reverter à situação, neutralizar as negatividades, arrancar um sorriso da atendente e ainda conseguir que ela faça o que precisa", cita. Para a professora da UFPB, o mesmo deve ser incorporado na relação com o chefe, os colegas e até mesmo com os clientes e fornecedores.

Para usufruir melhor dessas relações, no entanto, a professora da Universidade Metodista recomenda que a observação não se restrinja apenas ao próprio comportamento. "É importante estar atento aos acontecimentos do ambiente do qual está inserido. Isso porque as suas atitudes não estão soltas no espaço e não são aleatórios", declara Angélica, que afirma ser sábia a atitude de conhecer seus pares. "Saber se colocar no lugar do outro, bem como reconhecer como ele reage a determinadas emoções, é uma atitude inteligente que poderá conduzi-lo ao sucesso. Sem, é claro, desrespeitar os princípios dos indivíduos".

A inteligência emocional, assim como a técnica, pode ser desenvolvida. É o que a professora Monica diz. E os caminhos dessa aprendizagem, segundo ela, são baseados fundamentalmente no treino. "É preciso avaliar constantemente suas reações diante das diferentes circunstâncias, bem como suas conseqüências. Assim, poderá aos poucos se conhecer e utilizar seus sentimentos ao seu favor", explica ela. Para facilitar o processo, Primi sugere a meditação. Caso haja dificuldade em desenvolver tais capacidades humanas sozinho, a professora da UFPB recomenda a procura de orientação psicológica ou ainda a realização de cursos relacionados ao tema.