Indígenas recebem curso pré-vestibular em projeto pioneiro no país
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Por Daniel Dabasi
O acesso de grupos da sociedade à universidade de forma diferenciada nunca foi tão debatido quanto neste início de século. Camadas consideradas desfavorecidas têm ampliado sua participação no ensino superior do país por meio de políticas cotistas que têm gerado polêmica nas discussões acerca do assunto.
Negros, índios, pardos, pobres, deficientes físicos. Há quem diga que essa fragmentação da sociedade aumente ainda mais as pontes do preconceito e da discriminação, assim como existem aqueles que, nesse tipo de iniciativa, enxergam uma ponta de esperança na escalada da evolução social.
Defesas a parte, o certo é que foi promulgada no ano 2000 a primeira lei que sobre reserva de vagas em universidades públicas no Brasil, tendo como base palavras de ordem, como reparação histórica, incentivo à diversidade, promoção da justiça social e da equidade educacional tão bem exposta constitucionalmente.
É baseado nessa garantia amparada por lei, que um projeto de extensão, pioneiro no país, tem chamado a atenção na Universidade Federal de Alagoas. Voltado para atrair ao ensino superior pessoas reconhecidamente indígenas, da aldeia do Povo Xokó de Porto da Folha (SE), o projeto realizará um curso pré-vestibular destinado exclusivamente para este fim.
Capitaneada pelo professor Dr. José Nascimento de França, da Ufal, a idéia começou a partir de pesquisas exploratórias de comunidades indígenas, quando o próprio Povo Xokó identificou e expôs a necessidade de um pré-vestibular na aldeia.
O professor Nascimento conta que no povoado já existe um sistema educacional fixado até o ensino médio e explica o porquê da iniciativa em uma comunidade do estado vizinho. “Sociologicamente a aldeia está mais ligada ao estado de Alagoas do que ao de Sergipe, isso por que lá só há um povo indígena reconhecido, diferente daqui, onde tem a Funai e a Funasa, órgãos que dão suporte a esse povo, sem contar que muitas das atividades são feitas no município de limite Pão de Açúcar”, explicou.
Nesta quinta-feira (6), o grupo de estudo responsável pela operacionalização do pré-vestibular, sairá de Maceió, com o material confeccionado especialmente para o projeto. Os conteúdos serão repassados por meio de apostilas e gravações de audiovisual produzidas na Ufal, com ênfase na preparação dos profissionais que já trabalham na educação local. A aula inaugural ocorrerá na Igreja de São Pedro, às 13h, naquela região.
“Os índios serão organizados em pequenos grupos, depois irão responder a questionários avaliativos, será formado também um comitê local voltado para a coordenação, representado por três professores, um cacique e dois índios (alunos)” – detalhou o professor. Ainda sobre os aspectos motivadores do projeto naquela localidade, Nascimento esclareceu que um dos fatores cruciais foi a efetivação de um território garantindo, ao contrário de aldeias alagoas, que , segundo o professor, passaram e passam por grandes conflitos na busca de suprir a escassez de terra. “As aldeias aqui sofrem com a pobreza, com a indigência, elas possuem um território vasto, mas não foram ainda garantidos pelo governo brasileiro, até hoje não se resolveu a essa questão”, explicou.
“O Povo Xokó tem um território garantido, um bom nível de instrução, com escola até o ensino médio, e o mais importante, possui uma unidade social, apenar de alguns conflitos”, declarou. As comunidades indígenas alagoanas, de acordo com o pesquisador, vão de encontro as características do povo Xokó e serão necessárias ações diferenciadas para poder chegar a esse patamar.
O grupo de índios Xokó faz parte de um contingente populacional nordestino, considerado o segundo maior do país, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), com 62% deles residentes em áreas urbanas. O pesquisador disse que localidade de Porto da Folha possui um rico acervo histórico com igrejas e ruínas de seminários onde eram realizadas as aulas de catequese dos índios. Ele contou que os índios absorveram traços camponeses e não habitam em ocas, como muitas é visto, mas sim em casas simples, de tijolos.