Pesquisadora questiona a gestão dos comitês de bacias hidrográficas em Alagoas

Segundo Natallya Levino é preciso que o processo de decisão se torne mais participativo e democrático


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Natallya Levino deve defender a tese de doutorado em março de 2014
Natallya Levino deve defender a tese de doutorado em março de 2014

Lenilda Luna - jornalista 

Desde a abertura democrática no Brasil, na década de 80, que a implantação de gestão coletiva e democrática se tornou uma busca constante. Mas não basta implantar um comitê gestor com a representação de todos os segmentos envolvidos em uma atividade para garantir uma participação igualitária nas decisões. Foi o que percebeu a professora Natallya Levino, da unidade Santana do Ipanema, Campus Sertão da Ufal. Recentemente, ela apresentou um artigo na Internacional Conference on Systems, Man and Cybernetics (SMC) em Manchester, Reino Unido. O evento, realizado em outubro, que reuniu  professores e estudantes de pós graduação, debateu metodologias nas áreas de engenharia, sistemas e cibernética, e é bem focado em gestão de processos. 

O estudo apresentado pela professora, com o título "Applying Strategic Choice Approach for Decision Making of Watersheds Committees"  analisou os comitês de bacia hidrográficas do Estado de Alagoas, e foi resultado de pesquisas obtidas na tese de doutoramento de Natallya Levino. Ela buscou avaliar os entraves encontrados no processo decisório, que tem dificultado uma participação mais ativa dos membros nas atividades realizadas.

Para avaliar essas questões foi aplicado um questionário aos membros de dois Comitês do Estado de Alagoas: o Comitê da Bacia Hidrográfica do Complexo. Estuarino Lagunar Mundaú-Manguaba (CELMM)  e  o O Comitê da Região Hidrográfica do rio Coruripe. "Nesses dois espaços de decisão observei alguns temas de conflitos entre os membros e algumas razões que os levam  a cooperar. Com base nesses dados eu proponho o uso de um método de estruturação de problemas que pode auxiliar esses atores na tomada de decisão", relata Natallya. 

Quem tem mais informação direciona decisões 

Natallya Levino iniciou as pesquisas nessa área de gestão quando fazia o mestrado em Engenharia de Produção, na Universidade Federal de Pernambuco. Naquela etapa, ela analisou o funcionamento dos comitês de bacias em Pernambuco e Alagoas. Agora, na elaboração da tese de doutorado, a pesquisadora resolveu trabalhar com o processo decisório desses comitês. Ela verificou que vários membros não têm conhecimento suficiente sobre a área de atuação do comitê. "Assim, as decisões são direcionadas por quem tem mais poder, mais nível educacional. Os especialistas tendem a conduzir as reuniões e isso prejudica o processo, que não se torna democrático de fato", alerta a pesquisadora. 

O artigo apresentado na Inglaterra  já apresenta alguns resultados da tese de doutorado, mostrando o que leva esses membros a cooperarem com o Cômite. "Os comitês são formados por três segmentos. com perspectivas diferentes: os usuários de água, o poder público e a sociedade civil. Nos dois comitês em que aplicamos os questionários pudemos perceber a visão deles sobre cooperação. Os representantes do povo, que são os usuarios, por serem os que tem menor nivel educacional, as vezes tem menor representatividade", relata Natallya. 

Ela ressalta que é grande a diferença de formação escolar e acadêmica dentro do grupo. Enquanto alguns membros nem mesmo concluiram o ensino fundamental, esses comites contam com doutores na área de recursos hídricos e gestão pública, entre outras áreas. "A nossa proposta é buscar um método para auxiliar no nivelamento das informações, para que as pessoas com doutorado ou aquelas sem segundo grau completo tenham a mesma qualidade de condições para decidir o que é melhor", explica a doutoranda. 

Nos processos decisórios, onde segmentos diferenciados são chamados a decidir juntos, teoricamente, o que falta em conhecimento acadêmico para alguns membros, deveria ser compensado pelo conhecimento da realidade, mas, segundo Natallya, isso na acontece. "Quem propõe a pauta de discussão nesses comitês é uma minoria, mais informada, que conduz o debate. Assim, conhecimento é poder. Os especialistas determinam o que é prioridade, o que é relevante. A cooperação, que deveria visar o bem comum, acaba acontecendo em torno de benefícios próprios ou de terceiros", alerta a pesquisadora. 

Fortalecer a gestão participativa 

Natallya Levino é graduada em  Ciências Econômicas e em Administração com Habilitação em Comércio Exterior, tem mestrado em Engenharia de Produção e atualmente é bolsista da Universidade Federal de Pernambuco, no doutorado em Engenharia de Produção. A pesquisadora concilia a pesquisa de doutorado com as atividades como professora da Ufal, em Santana do Ipanema. O tema escolhido por ela para as pesquisas é transversal, ou seja, embora esteja focada em recursos hídricos, a questão da tomada de decisão e a gestão participativa perpassam várias áreas de atuação. 

A intenção de Natallya é que os resultados da pesquisa possam colaborar com o fortalecimento da gestão democráticas nas várias esferas de decisão. "É um tema transversal em gestão. Mesmo partindo da Engenharia de Produção, a perspectiva é ampliar para outras áreas de gestão coletiva, tanto no poder público como na iniciativa privada", destaca a pesquisadora. 

Natallya crítica ainda os comitês e conselhos gestores formados em Alagoas. "Aqui no Estado não temos um planejamento participativo. O que foi implantado é muito superficial. Não temos um orçamento discutido com a participação popular, como acontece em outros Estados. É preciso trazer o povo para participar das decisões publicas. Essa é essa a prerrogativa dos comitês de bacias hidrográficas, que tem a missão de proteger um patrimônio natural coletivo, que são os rios. Esses processos decisórios coletivos que afetam toda a sociedade tem que ser vistos com mais seriedade", conclui a professora. 

Para mais informações, leia aqui o artigo.