Alunos de Arquitetura promovem intervenção na orla de Ponta Verde

A ação “Pensar Porta Verde” foi desenvolvida com trabalhos práticos e um deles teve como foco o desativado Clube “Alagoinhas”


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Professora Maria Angélica (blusa vermelha) com o grupo de alunos responsável pelas ações de intervenção na Ponta Verde
Professora Maria Angélica (blusa vermelha) com o grupo de alunos responsável pelas ações de intervenção na Ponta Verde

Diana Monteiro - jornalista 

Agregando lazer, entretenimento e negócios, a orla de Ponta Verde continua sendo o espaço urbano mais cobiçado e disputado da cidade de Maceió: do setor imobiliário à comunidade de todas as faixas etárias que circula diariamente e que faz também daquele lugar ponto descontraído de  encontro. Nas tardes de dias ensolarados o incomparável despontar do por do sol  também permite um  espetáculo imperdível de contemplação na tão famosa orla. 

O vai e vem de pessoas e as mais diversas referências do lugar motivaram estudantes do primeiro período do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Alagoas a aplicarem a atividade “Pensar Ponta Verde”, fruto dos conteúdos vistos em sala de aula na disciplina Projeto 1, ministrada pelas professoras Maria Angélica da Silva e Maria de Fátima Campelo. 

 Segundo Maria Angélica, toda os conceitos definidos pelos grupos de alunos para  a intervenção   tiveram  como primeira etapa  o rabiscar de desenhos em consonância  com as potencialidades existentes  no local: humanas, físicas e da natureza, esta muitas vezes tida como algo gratuito, de que não é necessário cuidar.   

A professora reforça que a Arquitetura  propicia a troca de afetos e acrescenta: “As pessoas são indivíduos e existem no mundo como indivíduos. A disciplina Projeto 1 proporcionou aos alunos  a construção de exercícios sensoriais de cunho individual despertando  a importância do corpo em produzir a Arquitetura. Desta forma pretendeu ir  na contramão das práticas atuais que priorizam por demais a virtualidade em detrimento das experiências concretas”. 

Para as monitoras da disciplina, estudantes Karina Mendonça Tenório e Ana Karolina Corado, a prática desenvolvida e os conceitos concebidos a partir da ação buscaram entender  o espaço urbano e o quanto a Arquitetura  tem influência nesse contexto. “A disciplina oportuniza ao futuro profissional dessa área a parar, pensar e abrir a mente observando o real valor da Arquitetura e sua influência: nas pessoas, lugares, natureza e meio ambiente”, dizem elas.   

Intervenção chama a atenção para as ruínas do “Alagoinhas” 

Para as atividades nos horários matutino, vespertino e noturno  na orla de Ponta Verde foram  apresentados os trabalhos  dos grupos, conforme o propósito de intervenção, assim denominados: Grupo Repare; Grupo Contagiar; Grupo Habitat; Grupo Natureza Sobreposta; Grupo Eu; Grupo Idealizado e Grupo Espelho D´Água. 

A importância do Alagoas Iate Clube, mais conhecido como “Alagoinhas” foi percebida pelo integrante do Grupo Repare Frederico Binatti.  “O prédio, construído nos anos 60, mesmo em ruínas, é significativo para a comunidade. Para a intervenção, objetivando chamar a atenção das pessoas, circundamos o prédio totalmente com pano vermelho e colocamos no local sapatos dourados,  adereços,  como colares  e fotos da vida social para representar  os tempos de ouro do clube”, destacou.  Frederico acrescenta que a visitação, que contou com a assinatura de mais de 200 pessoas dentre muitas outras que lá estiveram, significa que o objetivo foi atingido. 

O Clube “Alagoinhas” foi desativado para dar lugar a um centro de suporte turístico, mas o estado de abandono em que se encontra tem chamado a atenção da comunidade. O novo projeto é polêmico, pois segundo profissionais da área, pretende produzir um edifício verticalizado, “à moda Dubai”.  “Há a sugestão de que poderia - se aproveitar alguns pontos do  projeto original  de autoria da arquiteta Zélia Maia Nobre, como por exemplo, a solução horizontalizada do prédio  e o belo  enquadramento da paisagem proporcionado pelos pilares de fuste circular”, diz a professora Maria Angélica.  Zélia Maia Nobre foi a fundadora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Alagoas. 

Pilares para contagiar 

A falta de convivência entre as pessoas na orla, mesmo havendo um intenso fluxo, foi percebida pela integrante do Grupo Contagiar Fernanda Madeira. “As pessoas se encontram, mas não convivem e a intervenção usando cores, foi feita para que as pessoas pudessem perceber umas às outras. Foram erguidos no calçadão 7 pilares, sendo o pilar central colorido  e os demais nas cores  amarela, rosa, laranja, vermelha, verde e azul. A estrutura era móvel e ia envolvendo os transeuntes. Compuseram a intervenção também músicas alegres, expressão corporal com colagem de adesivos nos que transitavam e assim  atingimos o objetivo proposto”, reforça Fernanda. 

Ser humano e meio ambiente 

A construção de uma estrutura em forma de ovo para acolhimento e para gerar reflexão foi a intervenção do Grupo Habitat. “Partiu-se da ideia que as pessoas  pensam encontrar tudo na Ponta Verde e que o local proporciona aparentemente tudo o que elas  necessitam, diz a  aluna Liara Cavalcante e  acrescenta: “a textura  interna do ovo  iluminada com luz amarela  foi para dar a ideia de vida, de casulo, da proteção proporcionada pela barriga da mãe. As pessoas visitavam e se sentiam em um ambiente aconchegante”, enfatiza. 

Reciclagem e natureza 

Por mais que a paisagem da Ponta Verde seja tomada por edificações, o maior atrativo do local continua sendo a orla, segundo o aluno José Henrique Costa Tenório, do Grupo Natureza Sobreposta. Para a intervenção e construção da estrutura na calçada o grupo utilizou garrafas pet, consideradas símbolo da reciclagem: “Criamos um teto de garrafa coberto com tecido azul para prolongar o efeito da onda de mar sobre o calçadão. A luz dos postes ao refletir sobre as garrafas deu um efeito translúcido como se fosse água e à intervenção despertou a curiosidade das pessoas”, frisa José Henrique. 

 O grupo Eu teve como meta despertar a atenção do público para a contaminação da praia por um esgoto a céu aberto perto do “Alagoinhas”. “Um tnt preto foi usado para trazer a  “língua negra”  até a calçada e a intervenção permitiu que se visualizasse tão grave e banalizado problema ambiental”, disse o representante do grupo Vinícius Godoy. 

Vinícius  acrescentou que as pessoas que ali transitam diariamente não percebem o esgoto por está  focadas em si próprias ou na atividade física que praticam, a mais comum, caminhada. “A falta de percepção do sério problema ambiental provocada pelo próprio desligamento das pessoas, faz parte do problema”.  A iniciativa do grupo teve uma boa resposta,  até porque muitas pessoas nunca tinham percebido a existência do esgoto no local”, frisa o estudante. 

Por mais que o mar de Ponta Verde adorne o tão prodigioso lugar e no verão atraia os jovens como ponto de encontro, constatou-se que ele é pouco explorado quando a questão é alimentar-se da paisagem para a reflexão e contemplação. Para a intervenção do grupo Espelho D’Água, os alunos Rayana Cedro e Hugo Magalhães criaram um ambiente com armação de canos, madeira e tecido azul escuro. 

 Idealização 

Não faltou também a crítica aos que enxergam na Ponta Verde o lugar perfeito.  Esta situação foi simbolizada pela figura geométrica do  cubo, sob a responsabilidade do Grupo Idealizado. A aluna Izabela Pinheiro comentou: “Um cubo, de teto aberto,  parece perfeito, mas foi criado em  nas laterais do seu interior, um artifício para transformar o  ambiente em outra figura, em perspectiva,  sem lado e sem fim.  Pequenas luzes e as estrelas só eram percebidas internamente.  O importante é que as pessoas que visitavam o cubo notavam a diferença existente entre a parte externa e interna da estrutura, deixando em dúvida se tudo que se percebe é realmente como é”, comentou Izabela Pinheiro. 

A positividade de ter a oportunidade de conceituar, idealizar e depois concretizar uma ideiarelacionando-a ao espaço urbano a partir de uma disciplina do curso de Arquitetura, foi destacada pelos alunos participantes da intervenção, futuros profissionais da área. Assim, cumpriram todas as etapas de produzir um espaço, desde criar um projeto, levantá-lo com as próprias mãos e aferir os resultados obtidos.  Um aprendizado concretizado a partir de uma ação prática diante de uma realidade na cidade onde vivem e respondendo aos seus diferentes aspectos: social, humano e ambiental.