Estudo aponta desafios para atuação do psicólogo na redução da mortalidade infantil em Maceió

Uma das causas apontada é a exclusão da figura paterna no desenvolvimento de políticas públicas que permitam acompanhamento da criança


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Professor Jefferson Bernardes
Professor Jefferson Bernardes

Diana Monteiro – jornalista 

A alta taxa de mortalidade infantil no Estado de Alagoas provocou a necessidade de saber se a Psicologia pode auxiliar no desenvolvimento de políticas públicas para a redução da grave problemática. Esta questão despertou o interesse de um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de Alagoas para a realização de um amplo estudo visando a atuação eficiente e efetiva do profissional dessa área nas Unidades Básicas de Saúde de Maceió. Denominado de “Políticas Públicas, Psicologia e Mortalidade Infantil - a atuação do psicólogo na Atenção Básica de Saúde”, o estudo foi contemplado com cinco pesquisas científicas de Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC) desenvolvidos no Hospital Universitário e Unidades Básicas de Saúde de Maceió, campos de estágio de alunos do curso de Psicologia. 

Sob a orientação do professor Jefferson Bernardes, o estudo apontou vários desafios para a implantação de ações eficientes. “São vários os desafios, mas destacamos os três maiores de acordo com os objetivos da pesquisa: maior inclusão da figura paterna nos processos de acompanhamento de pré-natal, nascimento e pós-natal da criança; melhoria dos instrumentos e dos processos dos registros de nascimento, focando na qualificação dos que desempenham essa atividade; e criação de uma rede de cuidados de atenção básica mais eficiente na estratégia da saúde da família”, diz Jefferson, doutor em Psicologia Social. 

Ao falar sobre a importância da inclusão da figura paterna no estudo, como também das relações entre políticas públicas, psicologia e mortalidade infantil, o professor enfatizou que em Alagoas, de acordo com pesquisas já realizadas, cerca de 60% das certidões de nascimento possuem dados incompletos. Em relação à paternidade das crianças, nas declarações de nascidos vivos, dos 47 campos do formulário somente um solicita dado paterno, que se restringe ao nome do pai. Os demais campos se referem aos dados maternos.

“A má qualidade da informação registrada nas declarações, principalmente na Declaração de Óbitos, prejudica o desenvolvimento de análises epidemiológicas e de políticas públicas adequadas ao enfrentamento do problema do alto índice de mortalidade infantil”, diz o professor Jefferson.  Uma pesquisa realizada pela Secretaria Estadual de Saúde constatou que somente 6 de 62 campos existentes na Declaração de Óbitos são preenchidos de forma satisfatória. Observou-se uma baixa qualidade no registro das informações sobre óbitos em mulheres e em menores de um ano. O Hospital Universitário já tem um serviço que faz esse tipo de acompanhamento, preocupado com a boa qualidade do registro da informação. 

Dados do IBGE 

Embasaram também o amplo  estudo, dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), que são os instrumentos responsáveis pelo mapeamento dos dados da mortalidade infantil em Alagoas. O Pacto pela Redução da Mortalidade Infantil Nordeste - Amazônia Legal foi a referência para as pesquisas que integraram o projeto. O pacto  possui como meta a redução da mortalidade infantil em no mínimo 5% ao ano, com foco na mortalidade neonatal (0 a 27 dias) e objetiva contribuir para a redução das desigualdades existentes nestas regiões. 

De acordo com dados do IBGE, nos últimos anos a média de mortalidade infantil, até completar um ano de vida, é de 45 mortes por cada mil nascidos vivos. Já o Sistema de Informação Sobre Mortalidade (SIM) consta que a média está em torno de 18 mortes por mil nascidos vivos. A diferença entre os índices se dá em função das distintas metodologias utilizadas. “Para a Psicologia a ausência da paternidade (exclusão do pai quando se relaciona às várias etapas do nascimento do filho); a baixa qualidade do registro de nascimentos e de óbitos; e a deficiência da Rede de Atenção à Criança, cuja cobertura da estratégia de Saúde da Família é de apenas 26% em Maceió, são barreiras que comprometem a redução da mortalidade infantil e não nos ajudam enquanto profissionais da área a pensar políticas públicas”, frisa Jefferson Bernardes. 

Cuidados à criança excluem pai 

De acordo com o pesquisador, a partir do século XIX, os cuidados às crianças ricas e pobres apresentam diferenças no que se refere ao campo da saúde, mas têm um ponto em comum: a exclusão da participação paterna. “Para as crianças ricas o pacto firmado é entre a Medicina e as mães, criando-se uma série de redes de cuidados. Mesmo assim a conservação e o desenvolvimento da criança se dão em torno da mãe, ficando o pai fora de cena. Para as crianças pobres o pacto tem lógica assistencialista e é realizado entre Estado, órgãos filantrópicos e figuras cuidadoras, excluindo também a figura paterna”, diz Jefferson.

 A falta de estrutura para acolher o pai da criança como acompanhante em hospitais e maternidades é também uma realidade. Os serviços ofertados ainda continuam despreparados para receber a figura paterna que fica também fora de cena em quase todo o processo do pré-natal. Destaca também que no Brasil os direitos do pai são bastante reduzidos, havendo a existência de  exclusões do pai também do ponto de vista legal. 

“O tempo da licença paternidade, as dificuldades de liberação do trabalho para o acompanhamento de pré-natal, ou mesmo natalidade, são enormes; o direito a ser acompanhante da gestante ainda é desrespeitado ou tratado como se fosse um problema para as instituições e a licença paternidade é um exemplo: são de cinco dias (antes da Constituição de 88 era de apenas um dia). Diferentemente de alguns países, como a Suécia, onde a licença paternidade pode chegar a treze meses para cuidar dessa fase inicial da vida da criança”, informa Jefferson Bernardes.

 Pesquisas específicas para o Projeto 

 Os estudos realizados por graduandos do curso de Psicologia fizeram parte do Programa Pró-Saúde de Psicologia ( PET–Saúde da Família) e do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic/CNPq/Fapeal). O projeto teve apoio do Grupo de Pesquisa Psicologia Discursiva, composto por alunos dos diversos períodos da graduação, mestrandos em Psicologia e do Mestrado Profissional de Ensino em Saúde. 

Para o amplo estudo foram realizados as seguintes pesquisas específicas: “A produção acadêmica no país sobre a relação entre Psicologia, Paternidade e Mortalidade Infantil”, de Wanderson Aranda de Melo Valença da Silva;“Redes de Atenção, Infância e Psicologia. Estratégias de (in) visibilidades e (im) possibilidades”, de Rosanny Moura Cavalcante; “Psicologia, Desnutrição e mortalidade infantil: a atuação do psicólogo no tratamento de crianças desnutridas”, de Ana Carolina dos Santos Oliveira; “Prematuridade da vida, prematuridade da morte: a Psicologia e os vínculos entre mães e filhos em UTI e UCI-Neonatal”, de luiz Fernando Barbosa Gomes Magalhães: e “O atendimento à gestante adolescente no contexto da assistência social”, de Regina Cheles Pires de Oliveira. 

Em 2012 integraram o projeto as alunas Márcia Rafaela Ferreira de Mendonça, Laís Dâmaso Lins e Fabíola Brandão da Silva. Márcia e Laís receberam o ano passado o Prêmio de Excelência Acadêmica com o Pibic.