Paespe coleciona histórias na aprovação de alunos em universidades públicas
Projeto de extensão da Ufal oportuniza a entrada e a continuidade de jovens carentes no ensino superior
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Jhonathan Pino - jornalista
“- O que faz uma menina da sua idade aqui na Universidade? - Estou com minha prima, que trabalha na limpeza. É que estou sem aulas na escola, e já que aqui tem um quadro, estou aproveitando para estudar.”
Esse diálogo aconteceu em 1990, quando o professor Roberaldo Carvalho, do Centro de Tecnologia (Ctec), encontrou uma adolescente de 15 anos, escrevendo na lousa de uma sala da Universidade Federal de Alagoas, em pleno período de greve nas escolas estaduais. A resposta sincera daquela garota chamada Adriana o deixou comovido e foi desse sentimento que surgiu a ideia de um pré-vestibular que atendesse aos estudantes das escolas públicas do Estado. O projeto foi implantado e teve duração de apenas dois anos.
A ideia ressurgiu em 2004, quando novamente o professor Roberaldo Carvalho convidou alunos de alguns Programas de Educação Tutorial (PETs) para dar início a um projeto que atendesse a estudantes de comunidades carentes. Desde então, o Programa de Apoio aos Estudantes de Escolas Públicas do Estado (Paespe) vem selecionando uma média de 80 estudantes para participar de aulas preparatórias para universidades públicas.
O projeto cresceu e, em 2012, ganhou uma versão para os alunos dos primeiros anos do ensino médio, o Paespe Jr., que oferta uma média de 120 vagas para estudantes também de escolas públicas. Agora, o Paespe pretende diminuir o número de desistentes entre seus alunos e quem sabe aumentar o número de aprovações nos vestibulares, que hoje está entre 30% e 35% dos participantes. Eles acabam indo principalmente para os cursos da Ufal, da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (Uncisal) e do Instituto Federal de Alagoas (Ifal).
Beneficiados do Paespe dão suporte ao programa
Outros PETs aderiram ao programa e, hoje, reúnem cerca de 60 graduandos voluntários, além de oito bolsistas, ex-alunos Paespe, e que, agora, na Universidade, organizam o programa para dar a mesma oportunidade que tiveram, anteriormente. Esse é o caso de Geisa Thamirys, hoje no último período de Engenharia Civil. Para ela, ao inserir os graduandos no suporte do Paespe, o programa os auxilia na progressão de suas graduações, pois os alunos são acompanhados e estimulados no desenrolar dos cursos.
Depois de passar pelo Paespe em 2012 e ser aprovada em Construção Civil, no Instituto Federal de Alagoas (Ifal), Geisa fez vestibular novamente para a Ufal e foi aprovada. Ela lembra que isso era impensável antes de conhecer o programa. “Quando o professor Roberaldo visitou minha escola, para divulgar o projeto, na verdade eu nunca tinha pensado em fazer vestibular, em ingressar numa universidade e acredito que meus colegas também não. Então a gente foi pela ideia de participar de um reforço escolar, para se dar melhor nas disciplinas da escola”, relatou.
A partir do pré-vestibular, Geisa também passou a ter acesso aos serviços do Campus A.C. Simões. “Só participando das atividades aqui, tendo aulas com professores da Universidade, visitando os laboratórios, que a gente se deu conta do espaço que estava ocupando; vivenciando os serviços da Ufal, com acesso a serviços na Clínica de Odontologia. Até pela infraestrutura porque minha sala da escola era bagunçada, as carteiras quebradas. E quando você chega aqui e vê uma outra realidade, principalmente no Ctec, você fica deslumbrada. Aí foi uma mudança total de vida. Só depois das aulas do Paespe que que surgiu essa vontade de enxergar que era necessário fazer um curso superior”, destacou a discente.
Proximidade com os alunos
Idecássio Vieira foi aluno do Paespe Jr. e, agora, no terceiro ano do ensino médio, espera conseguir uma vaga no curso de Engenharia Mecânica, em Pernambuco. Diariamente ele sai de Rio Largo, do bairro Cruzeiro do Sul, para participar das aulas do Paespe, na Ufal. Ele ressalta que a atenção dos alunos, no programa, é bem maior que na escola. “São professores muito bons, as aulas são muito interativas. Tenho alguns colegas da escola aqui e a gente consegue ver a diferença entre aqueles que ficam apenas na escola e os que participam do Paespe”, disse o vestibulando.
Igor de Farias nem precisou esperar o terceiro ano do ensino médio para entrar na faculdade. Ao participar do Paespe Jr., ele conseguiu sua aprovação na Ufal quando ainda cursava o segundo ano. Hoje ele é aluno do curso de Matemática licenciatura e atua no suporte do pré-vestibular. “São escolhidos para trabalhar aqui aqueles que já têm alguma história com o Paespe. Porque acreditamos que só uma pessoa que participou do programa entende qual a importância dele e o que ele fez por nós, enquanto alunos”, afirmou Igor, que estudava no Conjunto Osman Loureiro, quando foi convidado pelo professor Roberaldo.
Além dos bolsistas atuando no suporte do Paespe e dos alunos dos PET Letras, Engenharia Civil, Ambiental e Ciência e Tecnologia, atuando como professores do pré-vestibular, o PET Psicologia foi o último grupo que entrou no projeto, para dar um acompanhamento psicossocial aos participantes. Mas também existem, ao menos, 20 docentes de vários cursos, coordenando as aulas, ou mesmo lecionando-as semanalmente.
Para dar mais subsídio ao andamento do Paespe, 14 professores do Ctec também submeteram projetos para o Edital do CNPq, Meninas e Jovens nas Engenharias e Exatas, que pretende estimular a entrada de garotas nos cursos de exatas. Cada docente conta atualmente com quatro bolsistas do ensino médio. Elas foram selecionadas entre os estudantes do Paespe para que receber um auxílio financeiro e assim puder continuar seus estudos com maior tranquilidade. Outras 60 bolsas também foram aprovadas a partir do Secretaria de Ensino Superior do Ministério da Educação (MEC/Sesu) e serão distribuídas entre os participantes do Paespe e Paespe Jr., independente do sexo.
Esse trabalho conjunto serve para que outras histórias como o de Geisa, Igor e Adriana sejam cada vez mais comuns. No caso de Adriana Santos, a garota que inspirou o professor Roberaldo, hoje é doutora e professora do curso de Engenharia Civil da Ufal.