Museu de História Natural: 25 anos de registros da biodiversidade alagoana
Nesse tempo, o órgão acumula e conserva acervo com mais de 30 mil peças, entre fósseis, rochas e artefatos arqueológicos
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Pedro Barros – estudante de Jornalismo
Se os fundadores do Museu de História Natural (MHN) tivessem desistido diante da primeira dificuldade, talvez ele não existisse hoje – ou, pelo menos, demorasse mais a aparecer. É que a primeira dificuldade surgiu logo após a primeira oportunidade. Em 1989, um pequeno episódio ocorrido na vida da professora Liriane Monte Freitas, especialista em moluscos do então Centro de Ciências Biológicas (CCBi) – hoje Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde (ICBS) –, mudou muito mais que sua história pessoal.
Uma pesquisadora de Pernambuco lhe pediu para acompanhá-la na visita a uma coleção de moluscos, que ficava numa propriedade particular de Alagoas. “Eu já tinha ouvido falar nela, mas nunca tinha visitado. Era um encanto, muito bem acondicionada em móveis de madeira nobre. Havia conchas de todas as partes do mundo: Austrália, Oceano Pacífico, Oceano Índico, Indonésia, Estados Unidos, Caribe, Europa, Mediterrâneo... E tinha também corais verdadeiros, lindos corais de que se fazem joias...”, descreveu, tão empolgada como se estivesse vendo as peças.
Lá, foi feita uma proposta de doação. Aquela coleção poderia ser da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Foi quando surgiu a ideia de criar um museu e já iniciar com um acervo consistente. Com apoio institucional e, especialmente da professora Iracilda Lima, Liriane não perdeu tempo, preparou os documentos necessários, mas, ao levá-los para a efetivação da proposta, descobrira que havia sido cancelada. De acordo com Liriane, anos mais tarde descobriu-se que a coleção fora doada para uma instituição do Rio Grande do Sul.
“Eu adoeci”, resumiu. Mas não era o fim, era o começo. A então reitora Delza Gitaí e o professor José Geraldo Marques convidaram Liriane para coordenar a comissão para a criação do Museu de História Natural da Ufal. “Congratulo a reitora honorária, porque ela fez de tudo para concretizar a implantação do Museu. Eu diria que não se perdeu nada, aquele foi apenas o projeto inicial para dar a ‘arrancada’”, declarou.
O natural
Proposta aceita. Com a resolução nº. 15, de 7 de maio de 1990, o Conselho Universitário criava o novo equipamento cultural da Universidade. A estrutura física foi instalada no prédio onde funcionava a Faculdade de Odontologia da Ufal e não faltou material para montar as coleções. Outros doadores foram aparecendo e pesquisadores reuniam os materiais que coletavam em suas expedições. A própria Liriane já tinha algo a contribuir.
O documento que propunha a criação do MHN (“Um Museu de História Natural para a UFAL”, de 1989) justifica seu intento na necessidade de conservar e aprofundar os estudos sobre a biodiversidade de Alagoas. Conforme a bióloga Selma Torquato, apesar do pequeno território, se comparado com outros estados, uma caraterística marcante da natureza de Alagoas é o grande número de ambientes e formas de vida, tanto em quantidade quanto em diversidade. “A nossa terra tem uma grande riqueza tanto no meio aquático quanto no terrestre”, observou.
Coletas feitas em escavações ou em cavernas trazem um pedacinho da terra alagoana, como rochas, ou revelam a presença de povos pré-históricos, por meio de artefatos arqueológicos. Com o projeto Fósseis de Alagoas, o MHN ampliou as descobertas paleontológicas no Estado, que até antes dele quase não existiam. O Herbário registra a diversidade da flora de Alagoas e o Setor de Ecologia auxilia a preservação ambiental com pesquisas e atividades de conscientização.
Os setores dedicados às espécies animais registram insetos, moluscos, peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos. “O acervo do museu é patrimônio público da União, que inclui espécimes únicas, que nunca foram encontradas em outros lugares”, observou o atual diretor do MHN, Fábio Menezes.
Hoje, o Museu de História Natural da Ufal tem mais de 30 mil peças em suas coleções, entre animais, plantas, fósseis, rochas e artefatos arqueológicos. Seus pesquisadores já registraram novas espécies e também descobriram que várias delas podem estar em risco, seja pela ação humana, da própria natureza ou pelos dois – como os anfíbios ameaçados por um fungo recém-chegado às terras caetés.
Entre as espécies descobertas estão sapos e pererecas (Chiasmocleis alagoanus, Phyllodytes gyrinaethes, Phyllodytes edelmoi e Scinax skuki), o lagarto Coleodactylus elizae e a serpente Bothrops muriciensis. Três desses nomes dados a eles são em homenagem a pesquisadores que passaram pelo Museu e deixaram grande contribuição à ciência.
O social
A missão do órgão, vinculado à Pró-reitoria de Extensão, é, além das pesquisas, levar conhecimento à população. “Temos um importante papel em colaborar com a divulgação da ciência no nosso país, onde infelizmente ainda não há uma boa educação científica”, avaliou Fábio.
O trabalho educativo é a principal finalidade do Museu. Ao longo dessas duas décadas e meia, milhares de estudantes e pessoas de todas as idades já conheceram um pouco da geobiodiversidade alagoana, por meio de exposição permanente ou, mais recentemente, das exposições itinerantes.
Eles viram o resultado da pesquisa de muitos cientistas e do trabalho de diversos educadores e profissionais. Hoje, o Museu tem um quadro de 20 funcionários, que envolve servidores lotados no órgão e professores do ICBS e do Instituto de Geografia, Desenvolvimento e Meio Ambiente (Igdema), que trabalham também na curadoria das coleções. Isso sem contar com diversos estudantes e pesquisadores voluntários que passam por lá, tanto aprendendo quanto deixando sua colaboração.
Certamente essas pessoas passaram e ainda passam por muitas dificuldades e, com muita luta, constroem a cada dia essa bela história natural e social. Mas se quando o Museu nem existia, 25 anos atrás, uma derrota não impediu sua caminhada, o que podemos esperar de seus próximos 25? Hoje, o MHN segue com mais profissionais, novos projetos e a esperança de uma nova sede – o prédio do antigo CCBi, na Praça da Faculdade, no bairro do Prado, em Maceió.
“Acho que, apesar de aquela sementinha não ter vingado, foi uma maneira de a vida, um pouco na tangente, levar à criação do Museu, que hoje faz 25 anos. Espero que, nos próximos 25, ele, que já está consolidado, esteja apurado e melhorado para as próximas gerações”, desejou Liriane, a mulher que começou essa história, meio que sem querer querendo.
Assista aos vídeos comemorativos dos 25 anos do Museu no Facebook e confira a programação da exposição itinerante na Biblioteca Central, de 7 a 28 de maio.