Estudo identifica duas novas tipologias arquitetônicas do sistema prisional brasileiro

Trabalho busca trazer debate sobre o assunto para as questões de segurança pública


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Estudo de Aloísio foi apresentado em reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em agosto deste ano
Estudo de Aloísio foi apresentado em reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em agosto deste ano

Deriky Pereira – estudante de Jornalismo

Um estudo realizado pelo Núcleo de Estudos e Projetos Especiais (Nupes) da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Alagoas identificou a presença de duas novas tipologias arquitetônicas do sistema prisional brasileiro, detectadas entre os anos de 2005 e 2014. Elas representam, atualmente, nove mil vagas da primeira tipologia e 20 mil vagas da segunda – até o ano passado, somam-se aos já cinco tradicionais modelos, consolidados a partir da década de 1960 e são baseadas em materiais pré-fabricados.

Os novos modelos são Tipologia A ou modelo norte-americano, que consiste em presídios baseados em elementos pré-moldados em concreto armado com módulos de convivência dispostos em “T”, e a Tipologia B ou Sistema Construtivo Penitenciário (Siscopen), que apresenta circulação aérea e se caracteriza pelo monobloco composto de placas pré-fabricadas de alto desempenho com concretagem realizada em painéis e posterior montagem dos ambientes, além de apresentar materiais quatro vezes mais resistentes do que aqueles utilizados nas edificações convencionais.

Dados de uma pesquisa divulgada em junho pelo Ministério da Justiça, referentes ao primeiro semestre de 2014, revelam que o Brasil possui, hoje, a quarta maior população carcerária do mundo com 607.700 presos. De acordo com o graduando da Ufal, Aloísio Carvalho, o estudo apresenta reflexões importantes sobre um tema de poucas referências bibliográficas nacionais. Ele explica, ainda, que as tipologias podem influenciar no comportamento e no processo de ressocialização dos presidiários.

“A maior parte dos textos lidos pelo grupo de pesquisa sobre o tema foi da literatura internacional. Assim, o estudo ajuda a enriquecer uma reflexão sobre o tema. Sem contar que pouco se discute os impactos da arquitetura sobre comportamento e ressocialização dos reeducandos e o nosso objetivo é inserir as discussões sobre os espaços, não só os prisionais, nas questões de segurança pública, de uma maneira geral”, disse Aloísio, acrescentando que a pesquisa foi apresentada durante reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em agosto deste ano.

Porém, no que diz respeito à arquitetura, o pesquisador avalia que espaços menos opressores e que possuam alguma semelhança com o que virá a ser encontrado pelo detento, quando o mesmo for liberado, ajudam ainda mais no processo de ressocialização. “Se o preso passa anos de sua vida em um espaço que o desumaniza sob vários aspectos, tais como, cores, objetos, materiais e disposição do espaço, perde-se a oportunidade de desenvolver a habilidade de convívio social que lhe será exigida quando sair da penitenciária”, explicou.

Tipologias utilizadas no país

Além de revelar duas novas tipologias arquitetônicas penais já citadas, o estudo de Aloísio Carvalho explica, também, quais são aquelas mais utilizadas em cada uma das cinco regiões do Brasil e, por consequência, como vêm sendo tratados os objetivos dos presídios nesses locais. “De forma geral, os resultados demonstram que aspectos preponderantes na escolha das tipologias pelas autoridades são a velocidade, a economia na construção e a segurança contra fugas”, comentou o estudante.

Nas regiões Norte (67%), Nordeste (34%) e Centro-oeste (59%) predominam a existência de modelos compactos, cujo destaque se dá pela necessidade de menor área construída, e têm módulos de vivência próximos uns dos outros. Já o modelo monobloco Siscopen, identificado pela pesquisa, foi mais encontrado na região Sul (com 43%) e está em segundo lugar na região Sudeste (23%), local de predominância da tipologia espinha de peixe, uma das cinco já tradicionais.

Alagoas se insere no modelo nacional

Trazendo para o contexto local, o estudo identifica que, em Alagoas, as unidades prisionais apresentam caracterização diversa. O Baldomero Cavalcanti, inaugurado em 1999, foi classificado com as já conhecidas espinha de peixe panóptico, pois apresenta um corredor de mais de um quilômetro de distância, ligando vários módulos de configuração estrelar; já o Cyridião Durval, inaugurado no ano de 2002, foi classificado como compacto. Porém, as novas construções passaram a se adaptar a um dos modelos revelados pelo estudo.

“Mas, as novas ampliações do Cyridião, o presídio feminino Santa Luzia e o novo presídio do Agreste foram realizadas em pré-fabricados do Monobloco Siscopen, indo ao encontro da predominância das construções de arquitetura penal no país”, complementou o pesquisador, ao dizer que esta é a tipologia que tem predominado nas novas construções de presídios brasileiros.

Diretrizes de arquitetura penal

A pesquisa de Aloísio Carvalho foi orientada pela professora Suzann Cordeiro. Ela já foi membro do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça e uma das principais responsáveis pela Resolução 9, publicada em 18 de novembro de 2011, que fala sobre as diretrizes de arquitetura penal.

“A nova Resolução revisa a anterior, com a incorporação de alguns novos conceitos, tais como a consideração de ‘vaga’ mais ampla, com infraestrutura global, a preservação dos direitos à acessibilidade, atendimento aos critérios de eficiência energética, atendimento às especificidades regionais e culturais dos grupos atendidos, atenção aos grupos vulneráveis e preservação da saúde por meio de critérios espaciais”, explicou a docente.

Leia mais sobre a resolução aqui.

Sobre o grupo

O Núcleo de Estudos e Projetos Especiais da Ufal realiza pesquisas sobre as diversas interfaces relacionados com planejamento, gestão e conservação do espaço arquitetônico, paisagístico e urbano com características especiais, buscando a compreensão dos métodos de interação entre a concepção e seus aspectos construtivos, processos e sistemas de planejamento e gestão urbano-ambiental e análise do espaço edificado.

Criado em 2012, segue três linhas de pesquisa: Edificações e ambiência de espaços de segurança e de saúde; Planejamento, gestão e conservação de edificações e espaços especiais e, ainda, Linguagem, representação e tecnologia em arquitetura e design. Segundo Aloísio, as pesquisas sobre a temática de arquitetura penal são feitas em parceria com estudiosos da Bélgica.

“As pesquisas têm sido realizadas, atualmente, junto com o Leuven Institute of Criminology na Universidade Católica de Leuven, na Bélgica. Estamos desenvolvendo levantamentos e análises de projetos no Brasil e na Europa, a partir das discussões de Humanização dos espaços e Direitos Humanos”, explicou o estudante. 

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