Evento discute violência e sistema socioeducativo feminino
Socióloga Vera Duarte foi a convidada da mesa-redonda com o intuito de traçar paralelos entre Brasil e Portugal
- Atualizado em
Rosiane Martins – estudante de jornalismo
Na tarde da última terça-feira, 02, foi realizada uma mesa-redonda abordando a criminalidade feminina e o sistema de justiça, num diálogo entre Portugal e Brasil. Participaram da mesa as professoras Elaine Pimentel e Ruth Vasconcelos, a gerente da Unidade de Internação Feminina Samara Veruma e a socióloga portuguesa, Vera Duarte. Três jovens que integram o sistema socioeducativo em Alagoas também comporam a mesa e assistiram a discussão. O evento foi aberto ao público e aconteceu no Centro Interesse Comunitário (CIC), no Campus A. C. Simões, em Maceió.
A atividade teve como objetivo apresentar e problematizar as ações pesquisadas nos núcleos de estudos em Politicas Penitenciárias da Faculdade de Direito (NEPP/FDA) e Violência em Alagoas do Instituto de Ciências Sociais (Nevial/ICS).
A professora e socióloga Ruth Vasconcelos fez a abertura da mesa ressaltando a importância de conhecer as semelhanças e as divergências existentes entre determinadas ações da justiça de Portugal e Brasil.
Já Elaine Pimentel ressaltou que falar sobre o tema é uma grande oportunidade para a comunidade acadêmica discutir e compreender um pouco da realidade feminina em meio a criminalidade e ao sistema socioeducativo. Ela ainda abordou a complexidade que gira em torno da discussão da diminuição da maioridade penal no Brasil, destacando que se essa possibilidade, de fato, for concretizada esses jovens irão direto para o sistema punitivo tradicional. “Por mais que se diga que irão construir políticas diferentes para esses menores, ainda não mudará o fato de que todos serão destinados ao nosso perverso sistema prisional. É preciso problematizar todo o sistema”, enfatizou.
A gerente da Unidade de Internação Feminina Samara Veruma, que também é agente penitenciária e advogada, falou da sua experiência dentro das unidades de internação. “Visitei algumas meninas em uma unidade e percebi que elas tinham muito tempo ocioso. Observei que não havia quase nenhuma atividade para elas fazerem, umas assistiam a programas religiosos pela TV, outras bordavam, enfim, parece uma tentativa de catequisar e afirmar, ainda que implicitamente, que o papel da mulher é ser dona de casa, o que me causou certa incomodação”, destacou.
Ela ainda abordou a experiência atual do trabalho na unidade, onde as adolescentes chegam e são avaliadas. Segundo Samara, ao chegarem na casa de internação todas têm um momento de acolhimento, de reflexão, são recepcionadas pelas outras meninas que já estão lá a um certo tempo, são elas que passam as regras e que explicam o funcionamento da unidade.
“Assim que uma menina chega traçamos o seu perfil para definir em qual quarto e com quem ela irá ficar. O período de adaptação é difícil, elas chegam assustadas, mas com o tempo entendem o funcionamento da unidade, percebem que lá serão bem tratadas, ao contrário do que muitas ouvem por aí: que serão maltratadas, agredidas... Também é importante ressaltar que fazemos o estudo de caso de cada garota, contamos com auxílio de alguns profissionais como psicólogos e assistentes sociais; quase sempre identificamos o que leva a adolescente a cometer determinado crime. Todo o estudo é passado para o juiz que vai analisar e julgar a situação daquela jovem”, revela.
Samara ainda destaca que a situação da mulher presa é muito complexa e gera uma realidade difícil para ela e para o ‘seus’, pois a falta de liberdade abala a autoestima, a família, o coração... “A maioria dessas meninas têm a vontade de mudar e nós temos as ferramentas”, defende.
A socióloga Vera ressaltou como muito positivo o trabalho feito por Samara e ainda destacou a família dentro do processo de reeducação das meninas, abordando a situação em Portugal: “Muitas famílias não podem visitar aquela jovem numa casa de internação. Em Portugal, a concentração maior de meninas internadas está em Lisboa e a maioria delas é de outras cidades, visto que suas famílias, geralmente carentes, não têm condições de visitarem, a ausência as atinge e causa danos. Quando a menina sai, vai regressar a família, a situação está igual ou pior, levando em consideração que em muitos casos são elas que garantiam o sustento da casa, com a sua ausência a situação se agrava”, problematiza.