Estudo analisa climatologia dos ventos de Maceió e sua relação com o ambiente urbano
Pesquisadora explora conjunto de 10 anos de dados
- Atualizado em
David Cardoso - estudante de Jornalismo
Diante da necessidade de compreender a relação entre a climatologia dos ventos de Maceió e sua relação com o ambiente urbano, a pesquisadora da Universidade Federal de Alagoas, Ruany Maia, desenvolveu um estudo sobre o escoamento do vento a partir de um conjunto de 10 anos de dados (2003-2012), em que foram analisadas as características de direção e velocidade dos ventos, através das estatísticas e utilização de modelo de microescala. "Constatou-se que o regime dos ventos em Maceió é governado pela circulação de grande escala dos ventos alísios e pela circulação local das brisas marítima e terrestre. Também foi observada a ocorrência de brisa urbana", diz Ruany Maia.
A pesquisadora explica como se dá a formação dessas brisas características da região. "Durante o dia, com o nascer do sol, o continente se aquece mais rapidamente que o oceano devido às suas propriedades térmicas. Essa diferença de temperatura entre continente e oceano resulta na formação de áreas de pressão atmosférica distintas entre eles. Basicamente, os ventos se formam a partir da existência de áreas com diferentes pressões, sendo o escoamento do ar de uma região de alta para uma região de baixa pressão. Deste modo, essa diferença de pressão dá origem à circulação das brisas marítimas com ventos que sopram do mar (maior pressão) em direção à costa (menor pressão), vindos de leste e sudeste. À noite, esse balanço de pressão se inverte, ou seja, ao anoitecer, quando não há mais a fonte de calor do sol, o continente se torna mais frio que o oceano", completou.
O regime dos ventos em Maceió é ditado pelos ventos alísios e pelas brisas, como foi dito anteriormente. "Os alísios são resultado da circulação da Alta Subtropical do Atlântico Sul, que varia de posição sazonalmente, atingindo a costa leste do Nordeste brasileiro com ventos de leste durante o período seco e ventos de sudeste no período chuvoso", explica a pesquisadora. Dessa forma, a direção dos ventos varia também em ciclos diários, de acordo com a circulação local das brisas marítimas, terrestres e urbanas observadas no ambiente de estudo.
Já a velocidade e a direção dos ventos são determinadas pela variação espacial e temporal do balanço de energia na superfície terrestre e variam em ciclos diários e sazonais, tendo relação com o movimento aparente do sol. De acordo com a pesquisa, existe uma relação com o movimento de rotação da Terra, que também desempenha papel na configuração dos ventos. "No período seco (verão no Hemisfério Sul), existe uma maior disponibilidade de energia na forma de calor sensível, tornando o continente mais aquecido que o oceano, o que forma brisas mais intensas e acelera o campo dos alísios. O oposto ocorre no período chuvoso (inverno no Hemisfério Sul), onde as diferenças de temperatura e pressão entre o continente e o oceano são menores, diminuindo a intensidade média do vento. De maneira similar, os ventos são mais intensos no período diurno, onde há maior disponibilidade de calor sensível, em comparação ao período noturno. ", explica.
Modelo de microescala WAsP
O Wind Atlas Analysis and Application Program (WAsP) "é um modelo computacional que extrapola vertical e horizontalmente os dados de vento medidos, sobre diferentes tipos de topografia, visando à obtenção de uma grade de dados que descreva a climatologia dos ventos sobre a superfície da área a ser analisada e a uma determinada elevação. Para tanto, o modelo faz uso de dados de terreno (relevo, rugosidade e obstáculos), além de leis físicas da atmosfera, para descrever o comportamento do vento.
A parte analítica consiste na transformação de uma série climatológica de dados de vento, como velocidade e direção, em um mapeamento eólico, ou seja, em um mapa que traduz o comportamento médio do vento na região de estudo. O mapa elaborado pode ser subsequentemente aplicado na estimativa da climatologia do vento e do potencial de produção de energia eólica de uma área", explica Ruany.
De acordo com a pesquisadora, a partir desse modelo foram elaborados mapas dos ventos médios mensais com área de 20x20 quilômetros que abrangem toda a área urbana e partes da área rural de Maceió. Além de dados de vento, foram adicionadas informações referentes ao relevo e rugosidade da capital, de modo que foi possível observar a interação do vento com esses fatores. "Foi visto que esse vento vindo do Oceano, ao cruzar a linha da costa e entrar na área urbana, perde velocidade por atrito, uma vez que a cidade possui características de superfície totalmente diferentes das encontradas sobre as águas do Atlântico com uma rugosidade muito superior. Por isso, o vento sobre o oceano atinge, em média, de 5 a 6 m.s-1, enquanto que sobre a cidade a velocidade fica em torno de 2 a 3 m.s-1. Ou seja, a velocidade do vento é reduzida por volta de 40 a 70% ao chegar à costa", complementou.
Observou-se a influência da topografia e rugosidade da cidade no seu escoamento médio. Além da constatação que a maior rugosidade da cidade exerce um efeito de frenagem no vento que chega pela costa, também foram observadas áreas de estagnação, ou seja, locais onde a ventilação ocorre de maneira deficiente, nas regiões de grota e na divisa entre as partes baixa e alta da cidade. Há também casos de canalização e intensificação do vento em áreas mais elevadas, como em alguns locais dos bairros de Fernão Velho, Santa Amélia e Bebedouro.
Contribuição para a sociedade
Maceió encontra-se em um acelerado processo de expansão demográfica e urbana. Dessa forma, o conhecimento da interação do vento com a cidade é de ampla importância no planejamento urbano. "A previsão do escoamento dos fluxos de ar pode evitar os efeitos negativos de uma ocupação urbana inadequada. Esse tipo de estudo serve como guia para tomada de decisões dentro de sua área de domínio, visto que o vento desempenha papel importante na qualidade do ar e conforto ambiental das cidades, servindo como eficiente estratégia bioclimática para o controle térmico e conforto humano, além de ser um fator determinante na dispersão de poluentes", destacou. Um projeto que para ser cumprido com eficácia, precisa da cooperação de todos os que estão envolvidos diretamente. "Acredito que seja fundamental que o processo de expansão demográfica e urbana seja acompanhado com um olhar interdisciplinar que possa gerar medidas preventivas e que suavizem essas problemáticas urbanas. A criação de políticas públicas urbanas deve ser feita levando em consideração a maior quantidade possível de fatores relativos à uma região e sua população. Para isso os estudos em áreas como Meteorologia, Arquitetura e Urbanismo, Geografia, dentre outras, devem andar de mãos dadas em busca das melhores decisões", finalizou a pesquisadora.