Orquestra de Violões da Ufal: brasilidade define o tom do concerto na 8ª Bienal

Orquestra, comandada pelo maestro Reginaldo Orico, apresentou um repertório contemporâneo e variado, passeando por musicalidades brasileiras, americanas e espanholas, em clima de descontração e naturalidade


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A Orquestra de Violões da Ufal é um dos organismos musicais do curso de Música da Universidade (Fotos: Thiago Prado)
A Orquestra de Violões da Ufal é um dos organismos musicais do curso de Música da Universidade (Fotos: Thiago Prado)

Marcio Cavalcante – jornalista colaborador

Seis violões bastaram para mostrar um Brasil tão rico de sonoridades, certamente ímpares, e oferecer uma experiência musical tão aconchegante para aqueles que foram assistir à Orquestra de Violões da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), nesta sexta-feira (6). A plateia lotada era de ouvintes empolgados a cada arpejo. A orquestra, comandada pelo maestro Reginaldo Orico, apresentou um repertório contemporâneo e variado, passeando por musicalidades brasileiras, americanas e espanholas, em clima de descontração e naturalidade. O público não poderia reagir de outra forma: aplaudiu de pé.

A Orquestra de Violões da Ufal é um dos organismos musicais do curso de Música da Universidade que tem a proposta de estudar e difundir repertório composto e arranjado para este instrumento que atravessa séculos da cultura árabe e posteriormente das tradições portuguesa e espanhola.

Porém, o violão cruzou o Atlântico nas caravelas portuguesas e chegou ao Brasil ainda no período colonial e, ao longo dos séculos, ajudou a formar a identidade musical do nosso povo, através de ritmos que se firmaram a partir dos anos 1900, inaugurando a época dos sentimentos nacionalistas na Música Contemporânea popular e também de concerto.

Sonoridades brasileiras do início do século 20

Iniciando com o que há de mais clássico no repertório tupiniquim, o maestro Orico e seus cinco músicos espalharam a musicalidade agreste que passou a ser produzida no Brasil, a partir dos anos 1930, com a volta de Villa-Lobos à terra natal, após anos de estudos na França. Destas musicalidades, modernistas e repletas de sonoridades e simbologias da cultura popular, a plateia ouviu peças como Bachianinhas, de Paulinho Nogueira, e O trenzinho do caipira, a mais célebre das composições de Villa-Lobos, consagrado como expoente da música de concerto brasileira.

A execução dos instrumentos foi de um encantamento tal que ficou difícil para a plateia não se emocionar. Sincronia e cumplicidade eram tais como num balé sutil entre os músicos da Orquestra de Violões: eles pareciam materializar a música em cenas. O acompanhamento cadenciado dos instrumentos responsáveis pela base harmônica fazia imaginar o maquinário de uma locomotiva a deslizar sobre trilhos.

Simultaneamente, a melodia desenhada por outros dois violonistas figurava cenas que passavam através das janelas do trenzinho de Villa-Lobos: eram paisagens bucólicas, pintadas por uma musicalidade única no mundo e reconhecidamente tão brasileira. Aquela peça fez o tempo parar na sala de concerto, onde ao longe e aos poucos, desaparecia um trenzinho, apitando e sumindo, se perdendo nos horizontes da imaginação.

Lembrando a era de ouro do rádio

O Brasil de muitas faces continuou a ser exibido, como num filme antigo em tons de sépia, através do repertório que remeteu à era de ouro do rádio, que nos anos 1930 e 1940 foi responsável por difundir por todo o território nacional a musicalidade do gênero Canção.

Desta época, o concerto resgatou Lamentos, de Pixinguinha, Brasileirinho, de Waldir Azevedo, e Odeon, de Ernesto Nazareth, num violão chorado e plangente cujos arranjos bem elaborados prendiam a atenção não apenas pelos ouvidos, mas, sobretudo, pelos olhos, dado o virtuosismo do maestro Orico e seus músicos solistas, cujos dedilhados driblavam os compassos em melodias céleres, em solos agudos que variavam do allegro ao presto, sobrepostos aos registros harmônicos mais graves dos demais instrumentistas.

Na era de ouro do rádio, a música americana começou a ganhar espaço pelo mundo com grande contribuição, também, das produções cinematográficas. Deste período, a Orquestra de Violões da Ufal relembrou composições de jazz que marcaram época: A pantera cor-de-rosa (Mancini) e Take Five (Desmond), onde os músicos recorreram a improvisações que resultaram em muitos aplausos.

Música flamenca

Considerando que o violão é este instrumento versátil, que viajou no tempo desde que a cultura árabe tomou conta da Península Ibérica e influenciou a formação da cultura portuguesa e sobretudo a musicalidade espanhola, foi natural que o concerto encerrasse seu programa com uma coleção de músicas flamencas.

Dentre uma série de temas do cancioneiro espanhol, destacaram-se Passión (Gypsi Kings) e Entre dos aguas (Paco de Lucia), cujas batidas marcantes, com dedilhados sensuais e arpejos dramáticos, todos misturados aos fraseados melancólicos dos solos, apresentaram uma performance de musicalidade intensamente cigana, quando os músicos recorreram a palmas sutis, batidas suaves nos corpos dos violões, fazendo lembrar a sonoridade das castanholas ciganas, montando a percussão necessária e característica da música daquele povo.

Entre intensos aplausos a plateia, de pé, coroou a Orquestra de Violões da Ufal: “OLÉ!!”