Pesquisa de Psicologia aborda a resistência da religião Jurema Sagrada no Agreste de Alagoas

Trabalho é desenvolvido por grupo de pesquisa da UE de Palmeira dos Índios e foi apresentado em simpósio nacional da área

Por Thamires Ribeiro – estagiária de Jornalismo
- Atualizado em
Objetivo da pesquisa foi destacar a importância e a força que a Jurema Sagrada teve na sobrevivência e na manutenção da memória social
Objetivo da pesquisa foi destacar a importância e a força que a Jurema Sagrada teve na sobrevivência e na manutenção da memória social

Com o intuito de destacar a resistência da Jurema Sagrada em Alagoas, um grupo de pesquisa, coordenado pelo professor Parmênides, da Unidade Educacional de Palmeira dos Índios da Universidade Federal de Alagoas, desenvolveu um estudo que aborda a visibilidade da religião no estado. O resultado do trabalho fez parte da programação do 10º Simpósio de Psicologia Política, que aconteceu no início deste mês.

“Nosso trabalho consistiu, nessa primeira fase, em estudar o Pai Alex [Gomes], que é um juremeiro de Arapiraca e tem um dos maiores templos de Jurema do Brasil, que é a Fazendinha de São José. Fizemos algumas entrevistas com ele e o trabalho traz o destaque, a importância, a força, a caridade da Jurema no Agreste alagoano e as articulações políticas do Pai Alex. Existe a força da Jurema em Alagoas, mas a sobrevivência dessa identidade enquanto religiosidade própria não tem recebido o merecido destaque na academia”, explica o professor.

De acordo com o grupo, o principal objetivo da pesquisa desenvolvida foi destacar a importância e a força que a Jurema Sagrada teve na sobrevivência e na manutenção da memória social “que foi vilipendiada, agredida, violentada, mas que na clandestinidade, a religião continuou e guardou seus preceitos e suas histórias que a gente traz na memória escrita por Pai Alex”.

“O que a gente quer demonstrar com essa pesquisa é que durante o Quebra de Xangô [em 1912, onde foram destruídos terreiros e adeptos das religiões afro foram perseguidos] foi a Jurema Sagrada que sustentou a religiosidade afroindígena em Alagoas, porque os babalorixás foram expulsos e enquanto isso a Jurema estava firme e forte, funcionava o que eles chamam de Jurema de toco, os mestres se reuniam na mata e eles serravam algumas árvores e aqueles tocos das árvores serviam de acentos, de mesa e eles praticavam a Jurema no meio da mata”, diz.

Parmênides afirma que, durante a pesquisa, o grupo realizou um trabalho de resgate de memórias, com elementos presentes nas lembranças do Pai Alex durante a narração da sua história, abordando lembranças pessoais do contexto social vivido por ele. Segundo aponta os resultados da pesquisa, a memória dele é uma memória de resistência da religião, que poderia ter sido exterminada.

“A pessoa não lembra de coisas isoladas, toda lembrança está carregada de pessoas, de lugares, de acontecimentos, ou seja, ela traz nessa lembrança a história do mundo social que ela viveu, dos grupos que ela participou, a família, a escola, a vizinhança, a religião. Então por isso que a gente vai em busca da memória como um instrumento de trabalho, porque essa memória está trazendo a história social que essa pessoa viveu e consequentemente a cultura que ela viveu”, diz o docente.

O trabalho foi desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa Psicologia Política, Movimentos Sociais e Políticas Públicas que é composto por Parmênides e pelos alunos de Psicologia José Anderson de Farias, Vinicius Henrique e Jane Cleide Ferreira. Para o docente, a Jurema deve ser mais estudada e se tornar tema de mais produções acadêmicas em Alagoas.

“A gente percebe que nos últimos anos, há em Alagoas uma certa exaltação e um certo resgate acadêmico da religiosidade afro, principalmente do Candomblé e da Umbanda, e não se trabalha academicamente a visibilidade da Jurema Sagrada como se ela fosse um elemento interno dessas religiões e não é, ela é uma região própria. Essa visibilidade é muito clara em outros estados, onde a força da Jurema é presente”, afirma Parmênides.

Apesar de a pesquisa trazer uma grande visibilidade para a religião, a intenção do docente é continuar os estudos acerca do tema, e proporcionar que ela seja ainda mais conhecida.

“Nós apresentamos os resultados preliminares da nossa pesquisa, que agora vai para uma nova fase, nós saímos do Agreste alagoano e vamos para Maceió trabalhar com o Manoel Xeroque, que é um babalorixá, que também é juremeiro, muito conhecido em Alagoas. Como ele é juremeiro antigo e muito conceituado, ele será a próxima fase da nossa pesquisa, embora a gente pretenda voltar sim para o Agreste alagoano, que é onde está o berço da nossa Jurema”, conta Parmênides.

Sobre a Jurema Sagrada

De acordo com o professor Parmênides, a Jurema Sagrada é de origem indígena e se mistura com partes do candomblé e do catolicismo popular. Ela surgiu no processo da colonização e inicialmente era conhecida como Catimbó. Segundo ele, o termo Jurema Sagrada é mais utilizado, principalmente nas áreas acadêmicas e pelos próprios praticantes, mas as duas nomenclaturas podem ser utilizadas.

Ele explica que a Jurema é uma religião tipicamente nordestina, uma vez que surgiu com os índios do Nordeste, que é uma região rica das plantas juremas preta e branca, que são as plantas de onde se extrai os vinhos que são utilizados nos rituais.

“Essa religiosidade indígena se mistura com o catolicismo popular e também com elementos da cultura negra, trazida dos índios aquilombados, mas também traz elementos europeus, com a chegada das bruxas, feiticeiros e velhos alquimistas, que foram expulsos da Europa e jogados no Brasil, e vieram também judeus primitivos que praticavam a Cabala”, esclarece o docente.