Pesquisa defende manejo sustentável na Amazônia e ganha prêmio nacional
"Conservação dela é uma responsabilidade mundial', diz pesquisador bolsista da Ufal, vencedor no Prêmio Jovem Cientista
- Atualizado em
Pesquisa do pós-doutorando e pesquisador associado ao programa Diversidade Biológica e Conservação nos Trópicos (Dibict), do Instituto de Ciências Biológicas (ICBS) da Ufal, João Vitor Campos e Silva, conquistou o primeiro lugar da categoria Mestre e Doutor do Prêmio Jovem Cientista, premiação concedida pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) em parceria com a iniciativa privada.
No ano de 2018, em sua 29ª edição, o prêmio trouxe como tema Inovações para Conservação da Natureza e Transformação Social. A pesquisa premiada apresenta como uma gestão responsável, realizada por comunidades locais da Amazônia, pode garantir a sustentabilidade e recuperar os recursos naturais. No estudo em questão, o modelo é o de preservação do peixe pirarucu como forma sustentável de geração de renda para a população e de proteção da natureza.
“Para mim foi uma honra muito grande ganhar o prêmio. Sinto-me completamente lisonjeado. Mas fico ainda mais feliz com a oportunidade de valorização do trabalho pesado que vem sendo desenvolvido pelas comunidades rurais na Amazônia, especialmente, os moradores da Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uacari e da Reserva Extrativista do Médio Juruá”, comemora o pesquisador. “O pirarucu foi o tema central de minha tese, realizada na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, devido à grande importância cultural que ele representa para as comunidades ribeirinhas e pelo fato do manejo gerar benefícios sociais e econômicos concretos. Portanto, o pirarucu é um modelo perfeito para impulsionar o desenvolvimento local”, destaca.
João Silva é bolsista de pós-doutorado na Ufal e também atua como pesquisador e professor colaborador no ICBS na área de Ecologia e Conservação. Ele conta que desde a infância sonhava em trabalhar na floresta amazônica. “Trabalho há dez anos na Amazônia. E isso era um sonho de criança que se tornou realidade”, diz ao reforçar a importância da preservação da floresta. “Analisando o histórico do ser humano, percebemos que os grandes marcos das civilizações sempre tiveram como pano de fundo o uso de recursos naturais, desde as grandes navegações atrás de especiarias, até a geopolítica atual em torno do petróleo. Na Amazônia não será diferente, e o futuro das florestas e seu povo será reflexo da forma como os recursos naturais serão utilizados”, argumenta.
A inspiração para o estudo, explica o pesquisador, “veio do trabalho maravilhoso que as comunidades da Reserva Extrativista do Médio Juruá vêm fazendo. Quando cheguei na região há dez anos, fiquei impressionado com essa organização social e quis investigar isso sob uma perspectiva científica”, conta. “A região passou por um período sombrio na época da exploração da borracha. Mas hoje as comunidades rurais, em parceria com as associações locais, tomaram as rédeas de seu destino e vêm realizando um dos trabalhos mais incríveis de autogestão dos recursos naturais”, afirma.
Questionado sobre a importância do estudo e como pode impactar na vida das pessoas, o pesquisador é enfático ao afirmar que a “Amazônia representa a maior porção de floresta tropical que restou no mundo. Ela é fundamental para a regulação do clima, das chuvas e de processos ecológicos. Portanto, a conservação dela é uma responsabilidade mundial que se não for levada a sério pode impactar de forma severa a vida de milhões de pessoas”.
Mais sobre a pesquisa
Com o título O gigante das várzeas: o manejo do pirarucu como modelo de conservação da biodiversidade e transformação social na Amazônia, a pesquisa que conquistou o primeiro lugar na categoria Mestre e Doutor do Prêmio Jovem Cientista teve como objetivo investigar um modelo de recuperação da população de pirarucu, de conservação dos lagos e de melhoria de vida da população local.
“Estudamos cerca de 85 lagos e 42 comunidades rurais no rio Juruá, um importante afluente do Amazonas. Nossos resultados mostram que as comunidades rurais estão recuperando as populações de pirarucu enquanto melhoram sua qualidade de vida”, relata.
O pirarucu, explica o pesquisador, é uma espécie de altíssima importância cultural, ecológica e econômica na Amazônia. “No entanto, devido à alta intensidade de exploração, essa espécie sofreu um declínio populacional muito forte, chegando a ser extinta em muitas localidades”, conta. “Na tentativa de reverter esse processo, as comunidades rurais, em parceira com pesquisadores, ONGs [Organização Não Governamentais] e o governo desenvolveram um modelo de manejo muito promissor, com potencial de recuperar as populações de pirarucus, conservar os ambientes aquáticos e melhorar substancialmente a qualidade de vida das populações ribeirinhas”, relata.
O objetivo da pesquisa, de acordo com João Silva, “foi investigar quais são os benefícios ecológicos, sociais e econômicos dessa atividade e como ela pode ser fortalecida, para que os amplos benefícios ecológicos e sociais possam chegar ao maior número de comunidades possível”.
Segundo dados do estudo, em lagos protegidos pela comunidade a densidade de pirarucus é 131 vezes maior que lagos sem proteção. “Durante os nove anos de manejo, a população de pirarucu cresceu mais de 210% nesses lagos. Essa proteção também beneficia muitas outras espécies importantes, como é o caso do Jacaré Açú, das tartarugas de água doce e espécies de peixe de alto valor, como o tambaqui”, informa.
Ele relata que, “em termos sociais e econômicos, os lagos protegidos pelas comunidades abrigam uma grande quantidade de espécies de alto valor econômico e têm funcionado como uma espécie de poupança bancária onde as comunidades podem se planejar para explorar uma boa quantia econômica todo ano, de acordo com as necessidades das comunidades”. Segundo o pesquisador, “essa remuneração contribui para a melhoria das comunidades e da qualidade de vida em geral na região”.
Ainda no rol dos benefícios do modelo de gestão sustentável dos recursos naturais que foi objeto da pesquisa, João Campos e Silva cita a preservação da cultura local e o orgulho dos moradores das comunidades. “Nossos resultados também mostram que o manejo do pirarucu vem contribuindo substancialmente com a manutenção de práticas culturais seculares presentes da pesca do pirarucu, e também vem aumentando a autoestima das comunidades rurais, que agora sentem orgulho de desenvolver uma atividade sustentável que contribui com a manutenção de seus modos de vida e com a conservação da biodiversidade”, conclui.