Caatinga é tema de pesquisas da Ufal publicadas em revistas internacionais

Pesquisadores do Lacos 21 destacam a importância dos investimentos em pesquisas na região que precisa ser conservada

Por Janyelle Vieira - estagiária de Jornalismo
- Atualizado em
Thainá Lessa trabalha junto ao Lacos 21 nos estudos sobre a Caatinga
Thainá Lessa trabalha junto ao Lacos 21 nos estudos sobre a Caatinga

A Caatinga é uma região semiárida ecologicamente única do nordeste do Brasil e assim, possui espécies que desenvolveram estratégias para sobreviver exclusivamente na região. A ação do homem causa graves ameaças ao local. A expansão imobiliária, o desenvolvimento agrícola e as mudanças climáticas são alguns desses fatores.

De acordo com estudos, ela é também um dos biomas menos conhecidos no Brasil, pela combinação de investimentos inadequados, baixa capacidade regional de pesquisa e difíceis condições de trabalho - altas temperaturas e difícil acessibilidade. Contudo, a disponibilidade de informações de qualidade sobre a distribuição de espécies é central para o desenvolvimento de ações bem-sucedidas de conservação. Registros digitais de ocorrências de espécies estão cada vez mais disponíveis e têm sido utilizados em diversas aplicações de conservação, como modelos de distribuição de espécies.

Nesta conjuntura, os biólogos Thainá Lessa e Ricardo Correia junto a outros pesquisadores do Laboratório de Conservação no Século 21 (Lacos 21) da Universidade Federal de Alagoas publicaram artigos que aprofundam importantes fatores sobre a conservação ambiental e conhecimento da biodiversidade acerca da biodiversidade da Caatinga utilizando diversos métodos.

Os trabalhos, que foram publicados em revistas internacionais Qualis A, maior nível de qualidade de artigos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), são intitulados Known unknowns: Filling the gaps in scientific knowledge production in the Caatinga (traduzido como Conhecendo o desconhecido: preenchendo as lacunas da produção do conhecimento científico na Caatinga) e Using ignorance scores to explore biodiversity recording effort for multiple taxa in the Caatinga (traduzido como Usando índices de Ignorância para explorar esforços em registros de biodiversidade para múltiplos taxa na Caatinga) e estão disponíveis na Revista PlosOne e na Revista Ecological Indicators, respectivamente.

A pesquisadora Thainá Lessa conta que o trabalho de preencher as lacunas da produção do conhecimento científico na Caatinga teve o ponto de partida em um projeto de iniciação científica, passou a ser tema do seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) e por fim, foi publicado. “Posso dizer que acompanhei todas as fases e fico feliz de ver os esforços do grupo de pesquisa em melhorar as análises e a escrita para que fosse publicado em revista renomada, após a publicação ficamos felizes por acompanhar a repercussão do artigo” comemora.

Enquanto um estudo analisou o conteúdo de artigos científicos para responder algumas questões: quando começaram as pesquisas sobre biodiversidade e conservação na caatinga? Quais instituições estão pesquisando o local? Quais os grupos de animais e plantas que estão pesquisado? Onde, geograficamente, estão pesquisando? Quais os principais fatores motivadores para os pesquisadores?, o outro, utilizou dados de uma plataforma online, o Global Biodiversity Information Facility (GBIF) que disponibiliza dados de biodiversidade de todo o mundo a partir de registros de coleções de museu para aplicar um novo algoritmo de Índice de Ignorância para identificar quais locais na Caatinga apresentam menores registros de biodiversidade e o porquê.

As pesquisas tinham o objetivo de mapear geograficamente a produção de conhecimento em conservação na Caatinga e identificar os fatores presuntivos que direcionam esses padrões; e utilizar Taxas de ignorância para caracterizar e identificar os fatores que impulsionam a disponibilidade de registros recentes de ocorrência de espécies no Global Biodiversity Information Facility (GBIF) para múltiplos táxons na ecorregião da Caatinga.

Segundo Thainá Lessa, ambos artigos trazem novos resultados para Caatinga e podem ser utilizados para planejar novos sítios de pesquisas e otimizar os recursos que são escassos. Ela destaca que é fundamental pesquisar a região. “Eu sou suspeita de falar da Caatinga, tenho apego, quem já trabalhou lá, sabe o quanto aquela região é única e especial, embora seja realmente difícil de trabalhar, principalmente pelo calor, espinhos e plantas como urtigas, a biodiversidade que vive lá é intrigante e nos estimula a pesquisar” comenta.

Conhecendo o desconhecido: preenchendo as lacunas da produção do conhecimento científico na Caatinga

De acordo com o estudo, embora a falta de conhecimento científico da Caatinga já fosse conhecida, a distribuição espacial e temporal da produção de conhecimento não havia sido investigada. O trabalho é importante porque esses vieses comprometem o desenvolvimento de políticas e práticas de conservação eficazes e aumentam a incerteza associada às ações de conservação. “Nós mapeamos a produção de conhecimento científico em conservação na Caatinga e usamos um modelo analítico para identificar os prováveis fatores que direcionam esses padrões. Nossa análise revelou fortes padrões geográficos, com locais de pesquisa concentrados na região leste da Caatinga, e em áreas próximas a estradas e centros de pesquisa. Também houve uma associação positiva entre a produção de conhecimento e o risco de desertificação, indicando que os cientistas conservacionistas estão interessados em pesquisar a fauna e flora que habitam as regiões secas severa da Caatinga. Nossos resultados também destacam o papel central dos cientistas pioneiros, aqueles que desenvolvem pesquisas em locais que não foi anteriormente estudados ou inventariados na determinação dos futuros padrões geográficos de produção de conhecimento” explica Thainá.

Ela esclarece que os resultados resumem o que já é conhecido e onde, e o que é carente de investigação científica e reforça que a Caatinga é composta por muitas espécies endêmicas que são pouco conhecidas e por isso, é importante que haja investimentos em pesquisa e infraestrutura para preencher o conhecimento nos locais onde não houve pesquisas, principalmente nas áreas de acesso remoto.

O resultado do estudo indica que as pesquisas aumentaram a partir de 2008 e as Instituições localizadas no Nordeste brasileiro são as que mais publicam, entre elas, a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) e Universidade Federal da Paraíba (UFPB). 66% da área da Caatinga não apresenta estudos publicados em revista científica, e 30% apresenta baixo número de estudos, cerca de 1 a 5 pontos de amostragem. A maioria dos artigos é sobre plantas, fauna vertebrada e invertebrada.

Usando índices de ignorância para explorar esforços em registros de biodiversidade para múltiplos taxa na Caatinga

Segundo a pesquisa, o conhecimento da distribuição de espécies ainda é afetado por vários déficits que limitam a capacidade de ação eficaz caso não sejam examinados adequadamente. Os índices de ignorância foram recentemente propostos como um indicador intuitivo e direto da disponibilidade de conhecimento em biodiversidade, mas até o momento, sua utilização na avaliação de vieses nos dados de ocorrência de espécies tem sido pouco explorada na literatura científica. “Utilizamos índices de ignorância para caracterizar e identificar os fatores que impulsionam a disponibilidade de registros recentes de ocorrência de espécies no Global Biodiversity Information Facility (GBIF) para múltiplos táxons na ecorregião da Caatinga, a maior floresta tropical sazonalmente seca do mundo. Nossos resultados revelaram que a maioria dos táxons estudados teve altos índices de ignorância em toda a Caatinga, indicando uma baixa disponibilidade de registros recentes de espécies no GBIF para essa região. Nossos resultados também sugerem que fatores associados à acessibilidade e conveniência são os principais correlatos dos esforços de registro de espécies nessa região” esclarecem os pesquisadores.

Foram analisados 187.468 registros de ocorrência para Anfíbios, Aves, Abelhas, Borboletas, Fungos, Musgos e Plantas Liliopsida e Magnoliopsida e a pesquisa aponta que os índices de ignorância foram menores nos valores intermediários da estrada e na densidade populacional humana, indicando que os observadores tendem a evitar áreas urbanas e inacessíveis. Também foram encontradas evidências de um maior esforço de registro em áreas próximas a universidades e áreas protegidas, enquanto a cobertura vegetal aparentemente teve pouco efeito nos índices de ignorância. Os resultados sugerem que esforços para compilar e digitalizar registros recentes de ocorrência de espécies devem ser incentivados, a fim de melhorar o conhecimento da biodiversidade única dessa região e os esforços para preservá-la.