Trabalhadores rurais cultivam terreno da Ufal em lançamento do Cres
O Centro de Referência Socioambiental é uma parceria da Universidade com os movimentos sociais agrários
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Cerca de 70 trabalhadores rurais ligados ao Movimento Sem Terra (MST) chegaram bem cedo ao Campus A. C. Simões, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), na última sexta-feira (22). Por volta das 7h30 foi iniciado o cultivo de cinco hectares do terreno ao lado do Radar Meteorológico, com sementes de feijão, milho, batata doce e manivas de mandioca. O cultivo marcou o lançamento do Centro de Referência Socioambiental (Cres), que nessa primeira fase contou com a colaboração do MST.
A proposta do Centro é desenvolver atividades voltadas para aproximação das comunidades do entorno da Universidade e, também, criar mais um espaço de parceria com os movimentos sociais agrários. “Esse é um momento inédito, que possibilita essa construção da Universidade com uma referência social. Trouxemos o nosso saber popular do cultivo da terra, da preservação das sementes crioulas, do cultivo do alimento saudável, que tem muito a ver com o tema da soberania alimentar", declarou Débora Nunes, coordenadora estadual do MST.
Para Nunes, a contrapartida da Universidade é a produção de conhecimento. "A Universidade pode contribuir com o campo, desenvolvendo equipamentos de baixo custo que diminuam a penalização do trabalho, como a matraca, por exemplo, que é um instrumento simples, mas muito eficiente para abrir os buracos para as sementes. Além disso, esses agricultores que estão aqui cultivando a terra sonham em ter seus filhos formados. A universidade precisa abrir as portas para essa comunidade", ressaltou Débora.
As sementes plantadas no terreno são crioulas, passadas de geração em geração por agricultores. São livres de agrotóxicos e de alterações transgênicas. “Estas sementes estão há centenas de anos sob a guarda das famílias, são adaptadas às condições climáticas e ao solo da nossa região, de forma natural. Nós sabemos que elas vão germinar e alimentar as pessoas sem envenená-las. Nós a chamamos de sementes da resistência, porque elas representam a história do nosso povo”, destacou Albani Rocha, da Articulação do Semiárido Alagoano (ASA).
Os alimentos cultivados nesse primeiro plantio serão destinados ao Restaurante Universitário (RU). “O MST é um grande parceiro da Universidade, que está nos ajudando nesse impulso inicial ao Cres, mas queremos convidar também a comunidade do entorno para se aproximar, cultivar e gerar renda. A partir desse Centro de Referência, nesse terreno que estava ocioso, queremos atribuir um valor de humanização à Ufal. A longo prazo queremos criar cooperativas para manter essa relação permanente com os moradores da circunvizinhança”, explicou a pró-reitora de Extensão, Joelma Albuquerque.
Mais oportunidades
Sob a coordenação da Pró-reitoria de Extensão (Proex), o Centro de Referência Socioambiental (Cres) tem a finalidade de se constituir como espaço de referência para cursos de formação, capacitações, palestras, pequenas oficinas e eventos, proporcionando diálogo, conhecimento, aprendizado e interação na construção de saberes com foco numa população carente, que rodeia a Universidade.
Durante a inauguração do Cres, a reitora Valéria Correia destacou que o projeto de extensão será contemplado, em sua estrutura, com a instalação de uma cozinha experimental, ecopontos e um parque a ser usufruído pela comunidade do entorno. Os objetivos foram pensados para possibilitar a essa população ter uma fonte de renda e capacitação para diversos meios de subsistência.
A solenidade contou com representantes da gestão central, dos três segmentos universitários, do poder público, de movimentos sociais e pesquisadores. Intervenções culturais, como poesia, teatro e música pautaram o evento que integrou representantes de trabalhadores rurais. O violinista Joselho Rocha e o flautista Abel dos Anjos, da Orquestra Filârmônica da Ufal, abriram a solenidade com a conhecida canção Asa Branca, dando sequência ao repertório com músicas identificadas com a vida e o ambiente do homem do campo.
“A Ufal se pinta de povo e estou muito feliz nesse dia pelo fortalecimento da construção das alianças, iniciadas há três anos. Nessa aliança do campo com a cidade, onde temos muito a aprender, estamos semeando esperança e cultivando sonhos. A Universidade é de vocês e faço a vocês os meus agradecimentos”, frisou a reitora dirigindo-se aos trabalhadores rurais participantes do projeto. Eles foram representados, oficialmente na solenidade, por Renildo Gomes e Débora Nunes, ambos da coordenação do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) e de assentamentos da Reforma Agrária.
Ao destacar sobre o aprendizado obtido por ter participado da atividade do plantio de mudas, Valéria reforçou a importância da ação e agradeceu à Associação do Semiárido (ASA), pela doação das sementes crioulas ao projeto. A entidade foi representada na solenidade por Júlio Dias, que reforçou a parceria e a importância da iniciativa também para a agricultura familiar e reforma agrária. Valéria aproveitou para destacar: “Estamos numa rede de solidariedade muito importante e a agricultura familiar está inserida nesse processo, com a aquisição de alimentos dessa atividade para os cinco restaurantes universitários da Ufal”, disse.
Renildo Gomes e Débora Nunes ratificaram a união do campo e cidade retratada no projeto e teceram elogios à Universidade: “Nossa luta é para semear a semente da igualdade. É importante a Ufal abrir as portas para divulgar o nosso trabalho”, disse Renildo. “Viemos porque acreditamos nesse projeto, num projeto de outra sociedade”, enfatizou Débora. O representante do DCE, Tiago de Luca, disse que o projeto representa um dos passos para deixar a universidade mais popular.
A reitora Valéria Correia também destacou o projeto de implantação do Cres para a curricularização da extensão, anunciando na oportunidade, como reforço nesse processo, o Fórum Popular Universitário a se realizar de 17 a 19 de maio. O evento objetiva abranger áreas diversificadas do conhecimento e contará com participação dos movimentos sociais . Aproveitou para fazer agradecimentos às parcerias firmadas, à equipe responsável e de apoio para a concretização do projeto no âmbito da Ufal.
Bem social
Ao enaltecer a importância do projeto, a pró-reitora de extensão Joelma Albuquerque disse esperar que o Centro de Referência Sociambiental seja um ponto de encontro de pessoas que pensem outra perspectiva de universidade e de formação. “A vinda de vocês, trabalhadores, é uma mensagem de solidariedade e de esperança para nós. A parceria com o MST é importante para que construamos novas formas de conhecimento. Nessa iniciativa é fundamental ter o Cres de forma socialmente referenciada e de interação com a classe trabalhadora. A Ufal é um bem da sociedade”, enfatizou.
O vice-reitor, José Vieira, ao dizer que a Ufal necessita estar atualmente mais próxima do povo no desafiante processo em curso, salientou a contínua luta dos trabalhadores, em especial, a travada pelos camponeses em tempos históricos no país. “A gestão está de parabéns por resgatar e construir essa luta no dia a dia com unidade. A Ufal precisa mais vezes se pintar de povo, como foi no passado e em tempos atuais, mais ainda necessita. Que homens e mulheres construam uma vida melhor com igualdade”, frisou.
O engenheiro agrônomo Reinaldo Falcão, assessor da Secretaria de Estado da Agricultura, Pesca, Pecuária e Aquicultura, representando o titular da pasta, Ronaldo Lessa, parabenizou a criação do Cres. “O agricultor sabe como preservar a natureza e do bem que ela é. O Centro já nasce de forma extremamente positiva, ao ser inaugurado neste 22 de março, Dia Mundial da Água, uma data que merece muita reflexão. A secretaria está à disposição da Universidade para ações em parceria, como efetivação de convênios voltados às políticas públicas”, enfatizou. Na oportunidade, Falcão anunciou a doação à Ufal de 700 mudas de craibeiras, árvore símbolo de Alagoas.