Projeto da Ufal traz jogo sobre biomas como proposta avaliativa

A iniciativa conta com a participação de alunos da rede pública em escola de Messias

Por Renata Morais - estagiária de Jornalismo
- Atualizado em
Logomarca do jogo criada pelos alunos
Logomarca do jogo criada pelos alunos

O projeto Yume – Jornada entre Biomas, desenvolvido pelo professor da Ufal Marbyo Silva tem mudado a realidade dos alunos da Escola Estadual Professora Judith Nascimento da Silva, no município de Messias. O game faz parte da proposta de dissertação de mestrado do professor, natural da cidade onde foi elaborada e construída a iniciativa. Com o tema Mata-Atlântica e Caatinga, o jogo não só propõe uma conscientização ambiental, como também é uma medida pedagógica para o aprendizado dos estudantes. 

O professor Marbyo é ingresso no Mestrado Profissional em Ensino de Biologia em Rede Nacional (ProfBio), aprovado em dezembro de 2016. A iniciativa está sob a coordenação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), com sede no Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da instituição. 

A criação do jogo surge conforme as observações do entusiasmo da classe de Marbyo Silva, que é docente efetivo e já foi aluno da escola em Messias.  Apesar de nunca ter trabalhado com ferramentas digitais, percebeu o interesse dos estudantes pelo universo dos games. “Não me considero um ‘gamer’, quase não jogo nenhum. Mas sempre escuto meus alunos muito empolgados falando sobre eles [jogos]. Comecei então a pesquisar sobre e, como eles poderiam ser utilizados em sala de aula. Esta é a primeira vez que trabalho com criação de games”, revela. 

“A escolha do tema veio numa conversa com a minha orientadora, que sugeriu tratarmos sobre os biomas que estão presentes em nosso estado e são pouco explorados nos livros didáticos. Com isso, instigar os alunos a conhecerem mais a fundo a fauna e flora de nosso Estado”, conta, mencionando a proposta da orientadora Letícia Lima, do ICBS. 

A professora Letícia, uma das responsáveis pela área de botânica no ProfBio, acompanhou a elaboração do game desde o início. Ela analisa a iniciativa como uma forma de aprendizado para os universitários, além de concretizar um desejo seu em trabalhar com a temática. “Como docente do curso de Ciências Biológicas, percebo que mesmo os alunos da graduação apresentam uma certa dificuldade relacionada aos biomas brasileiros. Há uma certa confusão de termos. Assim, sempre quis desenvolver um projeto voltado para auxiliar no conhecimento dos biomas brasileiros”, esclarece. 

Criação da narrativa  

O game conta a história de Haroldo, garoto preguiçoso que prestes a fazer uma prova de biologia, da qual não tinha estudado, recorre a uma biblioteca. Apesar de aulas extras com um professor, batizado com seu nome no jogo, o menino volta para casa preocupado, pega no sono e acaba tendo um sonho que muda sua visão sobre o mundo. Haroldo realiza missões, tenta driblar desafios na Caatinga e Mata-Atlântica. Ao fim, uma difícil provação aparece: O jogador vê os prêmios ganhos ao longo da partida tendo que ser sacrificados por um bem maior, salvar a floresta de um incêndio. 

Para a execução das atividades e fases do projeto, os interessados das turmas do 3° ano do ensino médio da escola em Messias, foram divididos em equipes. A inserção dos estudantes no ambiente natural fez parte da programação do projeto para recolhimento de dados. “Programadores, designers, pesquisadores, criadores de diálogos e todos participando da criação da narrativa do game. Os alunos assistiram a palestras e participaram de duas aulas de campo, uma em cada bioma: na Caatinga no município de Água Branca e na Mata Atlântica em Coruripe. O objetivo era proporcionar uma imersão e coletar informações mais precisas e fidedignas para adicionar à narrativa que estava sendo criada”, sintetiza Marbyo. 

A orientadora, Letícia Lima, acredita que o desenvolvimento da ferramenta pelos estudantes foi algo surpreendente, e vivenciar a experiência da criação, para ela, é um elemento enriquecedor do saber.

“No meu ponto de vista, o que é mais interessante nesse projeto não é o game em si, mas o fato de ele ter sido pensado e desenvolvido pelos próprios alunos. Eles irão utilizá-lo, e mais do que ninguém sabem quais as principais dificuldades do aprendizado. Isso foi inédito nesse projeto”, destaca. 

Mais respostas para o estímulo 

A experiência do game superou as expectativas, como conta o criador do projeto: “No começo a ideia era analisar como a produção de um game por alunos poderia contribuir para uma melhor percepção da diversidade florística e fisionômica, bem como das relações ecológicas existentes entre plantas e, entre elas e os animais. Após uns três meses do projeto, a maioria dos alunos começou a sonhar em fazer um curso superior e seguir estudando”, conta.  Marbyo avalia que a iniciativa promoveu não só questões pedagógicas em sala, mas também o desenvolvimento das potencialidades dos discentes: “[Eles] desenvolvem diversas habilidades, desde fazer resumos, manipular imagens, trabalhar em equipe, falar em público...”. 

O estudante Fabrício Santos concluiu o ensino médio na Escola Estadual Professora Judith Nascimento da Silva. Ele relembra as lições aprendidas na relação com a natureza e expressa a satisfação em ter contribuído para a construção do jogo. “Tivemos contato com a Caatinga e a Mata-Atlântica e aprendemos muito. Perdemos o preconceito em achar que a Caatinga, por exemplo, é só ‘mato seco’, aprendemos que mesmo debaixo dos galhos secos, há vida, há um verde especial. Sinto-me contente em saber que, ainda aluno, participei de algo que vai ajudar outras pessoas, outros alunos a aprenderem sobre os biomas do nosso Estado”, recorda, revelando que após a experiência surgiu a dúvida e a vontade de cursar Biologia ou Design. 

O coorientador do projeto, professor do Centro de Educação (Cedu) da Ufal, Fernando Pimentel, vê a iniciativa como uma forma de suprir as diversas demandas em sala de aula. Ele acredita que o contato com o ambiente natural influencia uma mudança de postura dos estudantes. “O projeto atende a uma necessidade do professor, que precisa trabalhar o conteúdo, mas a carga horária semanal é restrita. Os alunos começam a entender sua responsabilidade quanto à preservação e o cuidado. Porque a medida que conhecemos, cuidamos e aprendemos sobre algo, passamos a ter respeito por aquele lugar cheio de vida”, evidencia. 

O cenário da educação pública brasileira enfrenta desafios que têm sido burlados por meio de realizações que buscam empreender melhorias nos diversos aspectos que envolvem a qualidade do ensino. “Apesar das dificuldades encontradas, a escola pública, mesmo com poucos recursos e condições precárias, pode oferecer instrumentos para o desenvolvimento intelectual e social dos alunos. Formando cidadãos mais preparados para lidar com os artefatos tecnológicos que fazem parte de seu cotidiano para a construção de conhecimentos e melhores resultados”, ressalta Marbyo Silva, com entusiasmo pelo resultado colhido. 

Agora o game está finalizado e o professor adianta que está entrando com o pedido de registro de patente com a Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-graduação (Propep) da Ufal. Após o procedimento, o game Yume – Jornada entre Biomas ficará disponível para download.