Museu Théo Brandão entrega Prêmio de Artista Popular do Ano
Evento faz parte da Semana de Museus
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Sil da Capela é a ganhadora do 13º Prêmio Gustavo Leite de Artista Popular do Ano, evento realizado pelo Museu Théo Brandão. A homenagem vai acontecer na próxima sexta-feira, 17 de maio, às 19h, com a entrega do prêmio e abertura da exposição Sil, composta por 12 peças da artista e sete fotografias que retratam a obra da ceramista e seu fazer artístico, clicadas pelo fotógrafo Thiago Sobral.
Seu nome de batismo é Maria Luciene da Silva Siqueira. A ceramista de 39 anos ganhou destaque no Brasil e exterior, com sua arte tirada do barro e feita pelas mãos que tanto trabalharam na lavoura de cana-de-açúcar. A vida de Sil é daquelas que dá um livro. A escritora pernambucana Naide Nóbrega percebeu o potencial narrativo que existe nessa história e produziu a biografia da artista, intitulada Do barro eu vim, do barro eu sou. “Com lembranças de uma infância dura e muito sofrida nos latifúndios de cana-de-açúcar, Sil é uma mulher que prefere olhar para frente, flertar com o futuro e, por meio da arte figurativa no barro, teimar em ser feliz”, escreveu a biógrafa no texto que apresenta a exposição.
Com essa resiliência descrita por Naide, a artista conseguiu sair do lugar comum, superando os obstáculos inerentes ao cotidiano difícil. A infância passada em canaviais no interior alagoano, acordando muito cedo para o trabalho na lavoura. Em casa, o cuidado com os irmãos menores. A vida comum de menina simples do interior nordestino parecia ter um destino previsível, mas Sil soube além de cavar da arte do barro, abrir o próprio caminho e girar a roda da sua história.
Exemplo de superação
Foi com as dificuldades que se deu o início da caminhada artística. A primeira filha de Sil foi diagnosticada com autismo. Os problemas de saúde da criança exigiam medicamentos caros, o que dificultava ainda mais a situação financeira dos pais. Nesse momento (ela tinha 20 anos), um novo destino começava a ser trilhado por meio de uma oficina do Sebrae, destinada a mães com filhos que tivessem necessidades especiais. Conheceu o trabalho de João das Alagoas e descobriu que era isso que queria.
A artista, nascida em Cajueiro, tem o Título de Cidadania de Capela, lugar de seu real pertencimento. E lá, o aprendizado teve continuidade no ateliê de João, desenvolvendo além da habilidade, um estilo próprio, sua marca pessoal. Para além da técnica aprendida com o mestre ceramista, as peças ganharam personalidade própria, fruto da vivência simples do interior. Em uma mesma obra surgem várias narrativas. É o Rio Paraíba, a mãe contando história, a criança brincando. Sil conta que não faz esboço algum antes de confeccionar a peça. “Tudo é criado na hora. O amor que tenho por essa arte facilitou a aprendizagem”, destacou Sil, em meio às peças do ateliê, em Capela.
Uma de suas marcas registradas é a jaqueira. “Serve de inspiração para mim. Comecei a usar a jaqueira como cenário e faço isso até hoje”, explicou Sil. “Além de lhe ensinar a técnica da cerâmica e a grande lição da humildade, João a alertou para o fato de que toda arte precisa ser única, autêntica. Foi ele que a estimulou a criar a sua própria marca a partir das suas referências de vida. Assim nasceu a jaqueira, elemento presente na grande maioria das peças assinadas por Sil; uma espécie de fio condutor do seu pensamento artístico”, escreveu Naide.
Um pedaço do Brasil
Essa capacidade de imprimir seu universo particular no barro chamou a atenção de especialistas em arte. Hoje, o trabalho de Sil ultrapassou fronteiras e entrou para uma seleta categoria. “Seu nome é unanimidade entre marchands, galeristas e colecionadores de todo o Brasil e vende para as melhores galerias de arte popular do país, além da Europa, Estados Unidos, México e outros”, descreveu Naide, que citou no livro o depoimento de Ana Maria Chindler, da Galeria Pé de Boi (Rio de Janeiro) sobre a artista alagoana. “As cerâmicas nas mãos de Sil é um pedaço do Brasil. Ela é um impacto na arte popular”, ressaltou a galerista.
A mídia nacional também já colocou os olhos em Sil e seu trabalho foi capa de revistas especializadas em decoração, a exemplo da Casa Cláudia e Duo Casa. A obra da artista, assim como a do mestre João das Alagoas, apareceu em alguns capítulos de uma novela global, em que uma das personagens tinha um ateliê. Os artistas alagoanos fizeram, inclusive, uma participação no último capítulo da trama. Em março deste ano, Sil também foi uma das personagens da série Mulheres Fantásticas, produzida pelo programa Fantástico, da Rede Globo, para contar o enredo de mulheres que conquistaram seu espaço e mudaram a história. Apesar de todo o reconhecimento de seu trabalho, a artista mantém a simplicidade. Ao receber a notícia da premiação, ficou surpresa e emocionada. “Ainda não caiu a ficha. Só vou acreditar no dia mesmo. O prêmio é um incentivo a mais para o artesão porque agrega valores”, disse Sil.
Olhar sob a arte da ceramista
O fotógrafo, professor e arquiteto Thiago Sobral registrou o cotidiano e a obra da artista. Parte desse trabalho estará na exposição. As fotografias coloridas expressam a rotina no ateliê. A experiência foi enriquecedora para arte de quem busca uma boa história a ser revelada. “A Sil é uma guerreira, mostra com todos os predicados a força da mulher alagoana, que passou por muitas batalhas até conseguir chegar onde chegou. Eu sou um fotógrafo que adora documentar cotidianos, contar histórias com imagens, e a Sil tem muita para contar”, disse Thiago.
Thiago é especializado em fotografia de arquitetura e FineArt. O maceioense já teve suas imagens expostas em mostras individuais e coletivas pelo Brasil e em países como França, Portugal e Espanha. Atualmente, tem trabalhos na Galeria Tempo (no Rio de Janeiro) e Galeria Gamma, em Maceió.
A abertura da mostra contará com a apresentação do professor de percussão da Ufal, Augusto Moralez, que vai tocar o instrumento vibrafone. A exposição tem a curadoria assinada pela museóloga Hildênia Oliveira. O projeto expográfico foi realizado pelas estudantes de Design da Ufal, com a orientação da professora Thaisa Sampaio. O evento conta com o patrocínio da Secretaria de Estado da Cultura (Secult) e da Prefeitura de Capela e com o apoio do curso de Design da Ufal.
A programação integra a 17ª Semana Nacional de Museus, temporada cultural promovida pelo Ibram em comemoração ao Dia Internacional de Museus (18 de maio). Nessa edição, 1.114 instituições de cultura de todo o país oferecem ao público atividades especiais, com o tema Museus como núcleos culturais: o futuro das tradições.