Ufal e Sociedade entrevista Andréa Pacheco


- Atualizado em
Professora Andréa Pacheco em entrevista ao programa Ufal e Sociedade. Foto: Renner Boldrino
Professora Andréa Pacheco em entrevista ao programa Ufal e Sociedade. Foto: Renner Boldrino

Dentro da programação semanal do programa Ufal e Sociedade, na rádioweb, a convidada foi a professora Andréa Pacheco, do grupo de pesquisa Frida Kahlo, para discutir a questão de vários preceitos relacionados à heteronormatividade. Confira a entrevista: 

Lenilda Luna: Professora, explica um pouco sobre esse grupo que a senhora coordena e lidera, o Frida Kahlo - Estudos de Gênero, Feminismo e Serviço Social. 

Andréa Pacheco: Frida Kahlo é um grupo de pesquisa, mas também de estudos, extensão e nós desenvolvemos várias atividades aqui dentro da Universidade; nesse tripé do ensino, pesquisa e extensão; relacionado à questão de gênero e dos feminismos, ou seja, discutir um pouco sobre essas relações sociais de sexo, o ser mulher e o ser homem na sociedade hoje e também discutir a própria luta das mulheres pela igualdade. Infelizmente, apesar de estarmos tão avançados tecnologicamente, nas questões dos valores e da moral, a gente ainda tem uma perspectiva extremamente ultrapassada, conservadora e misógina. Não é à toa que a gente tem a morte de mulheres, todos os dias, através do feminicídio, a violência contra à mulher. Essas questões fazem parte de uma construção colonialista, patriarcal, racista e heteronormativa que é o que embasa a nossa sociedade. Essa ideia que é construída com o processo de colonização do eurocentrismo que vai colocar essa ideia da humanidade como o homem, o macho que domina, é poderoso, violento; que é dono das mulheres, filhos, produção... 

Essa lógica que também está em sintonia com a lógica capitalista, não é à toa que o patriarcado, o racismo e a heteronormatividade são funcionais ao sistema capitalista. Eles reforçam essas desigualdades e as transformam em lucro. Essa é uma questão que a gente vem estudando dentro do grupo de pesquisa, de pensar, a violência contra a mulher, o racismo e também contra a comunidade LGBTQ+ que tanto está exposto na sociedade. O estado de Alagoas está, em todos esses quesitos, nos primeiros lugares. Tanto de violência contra a mulher, como também da morte de adolescentes e crianças negras e também a morte de homossexuais, travestis, enfim, da população LGBTQ+. Então, a gente faz uma abordagem nesse sentido, o nosso carro chefe é a perspectiva feminista, mas entendendo o feminismo como um projeto de sociedade, não é só uma emancipação das mulheres, mas humana, porque a gente só poderá ter igualdade entre homens e mulheres, em outra perspectiva de sociedade que não é a capitalista, porque a lógica e a paz da sociedade capitalista é a desigualdade e a produção de mais-valia, lucro e mercadoria, transformando as pessoas em mercadoria. Tudo passa a ter a lógica do mercado, inclusive as questões de gênero. Por que quem é valorizado hoje no mercado de trabalho? As mulheres ainda ganham bem menos do que os homens quando ocupam os mesmos cargos e apesar da mulher ter maior qualificação, elas ainda estão em cargos que não são de poder. 

Em relação à política, por exemplo, as mulheres não representam 15% do Legislativo, nem do Executivo ou Judiciário. A gente ainda vê que a sociedade brasileira e, trazendo também para Alagoas, é construída através de um arquétipo viril, essa lógica da masculinidade. A gente tem um projeto chamado Escola Lilás, que é discutindo as questões de gênero com os profissionais da educação que daí, inclui os professores, a merendeira, o vigia, o assistente social, a psicóloga, enfim, todos os profissionais da educação, além das crianças e também a comunidade que a gente também faz esse espaço aberto. No Dia dasM mães, discutir que mãe não é só dona de casa, desconstruir essa ideia de que só quem tem que cuidar é a mãe e também a ideia da construção patriarcal da família, pai, mãe e filhos, porque a gente vê muito hoje, quando saímos para as escolas muitas crianças que são criadas pela mãe, avó entre outras variações. Existem outros avanços familiares que a escola precisa considerar, porque causa certos traumas nas crianças, dores, fraturas, quando, por exemplo, Dia das Mães quando as crianças não têm mãe. A gente precisa atualizar um pouco essas relações e também existem aquelas que não são as famílias tradicionais, mas as famílias homoafetivas, de duas mulheres ou de dois homens, também existem as famílias de mães solteiras, enfim, a gente faz todo esse debate. Nesse projeto do Escola Lilás  a gente tenta trabalhar desde crianças, com histórias tradicionais da Branca de Neve, Rapunzel etc. Porque é como se todas as princesas brancas, ricas e bonitas que sofrem, sofrem, sofrem, mas depois casam e resolvem sua vida. Porém, isso não é a realidade que nós vemos na periferia e na sociedade de uma forma geral, principalmente pelas comunidades que a gente anda, inclusive vemos muita gravidez na adolescência. A gente trabalha, dependendo da faixa de idade, com as crianças é essa igualdade para que não tenha menino batendo em menina, trabalhamos também a masculinidade tóxica, quando o menino já se acha poderoso e se sente forte… Mas que ele entenda que é igual às meninas. Com as adolescentes, a gente já trabalha mais nessa perspectiva da gravidez na adolescência, porque muitas meninas inclusive abandonam a escola. Discutir as questões relacionadas à própria educação sexual, os direitos reprodutivos, o uso de preservativos. Porque, elas estão vivenciando isso e a gente não tem hoje uma questão de educação sexual, mas discute também a questão das mulheres na política, nas profissões; para colocar que o nosso destino enquanto mulher, não é só ser mãe e dona de casa, mas o nosso destino é construir também projetos pessoais de formação como uma faculdade, um mestrado ou um doutorado, ser professora, jornalista, assistente social, enfim, a gente tem vários projetos. Ser mãe e dona de casa é um dos projetos lindos e maravilhosos, mas que não pode ser o único na nossa vida, nós temos também que ter outros projetos. Então, que a nossa cidadania não seja resumida à ideia de ser mãe e dona de casa, mas eu sou cidadã porque quero me candidatar à vereadora ou ser professora, dentre outras possibilidades. 

Essa é a perspectiva que a gente trabalha, e com a comunidade a gente apresenta, que no caso é uma pesquisa que a gente têm do Pibic da Ufal, que se chama Marias que não calam, o perfil da violência e da mulher em Alagoas. Nós mostramos esses dados, esse perfil da mulher violentada, o perfil do agressor, os lugares da agressão, a cor da vítima, a raça do agressor. A gente tenta mostrar, que somos nós, que não é vergonhoso. Nenhuma mulher merece viver em uma situação de violência e romper com a violência, é necessário, porque faz parte da dignidade humana, dos direitos humanos universais. A gente trabalha essas questões com a comunidade, aproveitamos o Dia das Mães, Dia da Mulher, dos Pais, Dia da Não-violência Contra a Mulher, que é em 25 de novembro, Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro. A gente vai trabalhando também a partir do que a escola demanda, porque a gente também tem uma proposta, mas quando chegamos à escola, nós reconstruímos essa proposta, a partir do que a escola tem mais necessidade, o que são os problemas e que precisam ser aprofundados. 

Lenilda Luna: É interessante, como a medida que se faz reflexões e se aprofundam debates, se organiza socialmente. Alguns conceitos da sociedade vão evoluindo também, acompanhando esse aprofundamento das discussões, por exemplo, na década de 80, na abertura política, o movimento gay surgiu com muita força e já foi um grande avanço. Depois, esse movimento incorporou outras vertentes e se tornou o movimento LGBT. Hoje você falou LGBTQ+. Explica um pouco Andréa, para quem não acompanha e não consegue ter todas essas informações e vivenciar esse debate, do que é o LGBTQ+. 

Andréa Pacheco: Então, a gente começa com o movimento gay e daí, que era Movimento GLS [Gays, Lésbicas e simpatizantes] e aí, ao longo da história, a gente vem discutindo que, inclusive as mulheres nesse espaço e em todos os movimentos, são muito invisibilizadas. A ideia de botar LGBTQ+, é trazer as mulheres para a frente como protagonistas, também, desse movimento. Agora, na contemporaneidade, a gente vai ter a entrada de outros sujeitos, como os Queer, que é um grupo que possui uma perspectiva a partir do fato de dizer ‘Eu sou diferente, a sociedade me vê de forma diferente’. O ser diferente é uma forma também de romper com a sociedade, dizer: ‘Olha, eu sou mesmo diferente’. Esse movimento existe no Canadá, tem uma linha de estudo sobre isso dentro do feminismo, dentro das ciências sociais e ciências humanas, como um todo, que é essa coisa mesmo do incomodar a sociedade. Do mesmo jeito que as pessoas que não estão na norma, são incomodados então, essa perspectiva de incomodar é também de dizer: ‘Eu sou mesmo diferente’. Existem também o intersex que é algo que sempre teve na humanidade, a primeira intersex que a gente vai conhecer é a Roberta Close, que na verdade, ela vai descobrir isso depois. Então, o que é o intersex? É aquela pessoa que é como se tivesse desenvolvido os dois sexos, mas não são desenvolvidos de fato. Você vai desenvolver um sexo que é o que você vai definir da criança. Então imagina, eu estou grávida e eu coloco na minha cabeça que eu quero um homem, que é o ‘varão’ e eu tenho que dar para o meu marido um filho homem, mas aí nasce intersex, é óbvio que eu vou dizer que quero um homem e aí acaba fazendo o processo de mudança de sexo, a reparação e daí, ao longo do tempo, esse menino vai se desenvolvendo, mas não são os hormônios que se desenvolvem. A identidade de gênero, a construção do corpo dele de gênero, não são as construções que delineiam o sexo masculino. Há uma grande polêmica, nessas discussões, porque o que a medicina vai dizer? ‘É mais fácil cortar uma árvore do que plantar uma árvore’. O que a medicina quer dizer com isso? Que é mais fácil fazer meninas do que fazer meninos. Então, os que nascem com o sexo masculino, corta e deixa o feminino para se expressar. Mas não tem que ser a medicina que tem que definir isso, na verdade, o próprio organismo da criança tem que esperar e dar um tempo. 

Nós temos hoje, as travestis, transgêneros. Porque as pessoas fazem muita confusão entre sexualidade e gênero. O que tá ligado, claro, como as dimensões do humano, mas uma coisa não quer dizer a outra. Quando a gente fala de identidade de gênero, estamos falando de se sentir e ser mulher e do ser homem. Quando a gente fala de sexualidade, é com quem eu me relaciono; se eu sou mulher e me relaciono com homem, eu sou heterossexual; se eu sou mulher e me relaciono com mulher, eu sou lésbica; se eu sou mulher e não me relaciono com sexo nenhum ou com todos os sexos, eu sou pansexual; não há essa definição e daí vem vários termos que são utilizados, mas pra gente entender um pouco isso. Porque, acaba que misturando todas essas questões. Sexualidade e gênero são coisas diferentes, eu posso não me sentir no corpo de mulher, apesar de ter um corpo de mulher, mas posso me relacionar dentro na norma, dentro da heteronorma e, daí, é uma grande discussão que a gente vem fazendo por causa da heteronormatividade, que é essa ideia de que ser normal na sociedade é ser heterossexual, ou seja, se você é menino namora com menina e vice-versa; mas isso foi uma construção social e daí vai colocando tudo que está fora. Assim como ainda hoje, o que é belo? O branco. Você vê uma criança de olhos azuis: ‘ai que menino lindo!’. Por quê? Porque isso foi uma construção social. 

A gente precisa entender e desnaturalizar e desbiologizar esses processos sociais. Quando Simone de Beauvoir afirma: ‘Não se nasce mulher, torna-se mulher’, ela não tá querendo dizer ‘Hoje eu sou mulher e amanhã não sou’, não é isso. Ela está querendo dizer que a gente nasce do sexo feminino, mas a construção de ser feminina e de ser mulher, é a sociedade que faz. Inclusive, impondo para a gente que temos que ser mãe, depois dona de casa, arranjar um marido. Não pode sair na rua à noite… Então, a gente vai castrando a mulher do processo de conhecimento, do espaço público, de andar na cidade; como se a gente que tivesse que se privar de tudo isso. É como se a gente vivesse em uma barbárie e essa é a lógica que se é colocada. É uma cultura muito grande do estupro e da violência contra a mulher que é naturalizada, como: ‘Porque homem é assim mesmo’. Não! Não é assim. Esse conjunto de aspectos que Amparo Moreno vai dizer, esse aspecto viril e a capacidade de dominar, isso tudo é colocado desde criança. É só a gente pensar, por exemplo, as histórias infantis, quem é o príncipe desbravador que vai atrás da aventura? Quem é a princesa, aquela que fica esperando pelo príncipe que vai salvá-la, como se ela também não fosse o sujeito da sua história? Há um processo de assujeitamento das mulheres e depois a gente vai vendo uma incidência em tudo. Quando a gente pega as músicas, a própria literatura infanto-juvenil, os super-heróis, quem são as mulheres super-heroínas? 

Para quem assistiu o He-man, que tinha a She-ra também. Quando ele se transforma no He-man poderoso, ele faz a seguinte afirmação: ‘Pelos poderes de Greiscow, eu tenho a força, eu sou o He-Man!’. Mas a She-ra vai e diz: ‘Pela honra de Greiscow!’, então isso quer dizer que ela tem a honra e não o poder. Então essa coisa é muito forte, como isso é passado, de que nós mulheres não temos o acesso a esse poder, temos que sempre estar colocadas no mundo privado, no espaço da casa e do cuidado. 

Lenilda Luna: É muito interessante quando você coloca toda essa reflexão e a gente percebe que uma parte da parcela conservadora da sociedade, ligada também a essa elite dominante que você colocou aqui, para barrar um pouco esse processo de diálogo. Coloca então que isso é ideologia de gênero, inventam um termo para ser combatido. Inventam uma teoria da conspiração, quase em torno dessa ideologia de gênero. Quer dizer, toda essa gama de discussão que você acabou de colocar que a gente vê que é realmente muito complexa, muito diversificada, tem várias linhas e que ainda está se consolidando, porque ainda estão sendo feitas pesquisas e reflexões, e daí tudo isso ter que parar agora, porque isso significa que se quer mudar a forma como se educa as crianças, como se constrói a família, até mudar a sexualidade das crianças. Então, se cria toda uma questão, que aí virou ideologia de gênero e isso tem que ser combatido. Como é que se enfrenta isso hoje, Andréa? Depois de tanto se avançar e abarcar, como você diz, vários tipos de pessoas. Ver que a pessoa é assim, tão complexa e diversa que a gente vai aprendendo, a cada dia, a lidar com essas novas formas de ser dentro da sociedade. Daí, de repente ,nada disso pode, tem o homem, a mulher, o menino, a menina, o azul, o rosa e o que não couber nisso é ideologia de gênero e tem que ser combatido. Como é que faz agora para se enfrentar e não se deixar retroceder esse debate? 

Andréa Pacheco: O que eu fiquei bastante mexida com uma fala, porque aí isso expressa a concepção desse novo governo, quando se diz assim: ‘O que vou fazer para minha filha não ser violentada? tira do país!’, ou seja, não vai se enfrentar aqui. Então, hoje, a gente não tem políticas públicas para as mulheres, nem para enfrentar a violência de gênero, o racismo, a violência contra a mulher, violência LGBTQ+. Hoje, a gente está vendo e daí até se acirra a naturalização da violência contra esses grupos, como se fossem grupos que deveriam ser expulsos da sociedade, porque são diferentes. Então eu penso, o que nós temos para enfrentar isso? Nós temos duas coisas: A caneta para escrever, pesquisar e para mostrar que essa realidade está aí, mas nós temos acima de tudo, nós mesmos, o nosso corpo para enfrentar isso. A organização com os movimentos sociais, ir para as escolas, para os movimentos sociais de uma forma geral, para as igrejas. É a gente estar lá, porque, qual é o fermento da história? É o cotidiano.

A gente precisa ir para esse cotidiano, para desconstruir essas ideias, mostrar que não dá para a gente voltar ao conservadorismo, o que a gente hoje está vivendo na sociedade é uma volta ao conservadorismo, mas não é só o conservadorismo tradicional que a gente já via lá atrás, é um modelo moderno, é um tipo de conservadorismo que hoje vai valorizar essas questões que já estavam superadas nessa sociedade. Não estavam resolvidas de fato, mas já tínhamos um grande avanço. A mulher só vai votar em 1932, vejam! Até 1932, a mulher era vista como desigual! Até os anos 60, existia o Estatuto da Mulher Casada, que para que eu pudesse trabalhar, eu tinha que ter autorização do meu pai ou do meu marido. Isso a gente avançou, agora a gente vai retrocedendo e vai naturalizando as diferenças e transformando em desigualdade. Porque esse é o problema, diferenças, todos nós temos, inclusive nós mulheres, eu sou diferente da mulher negra, da mulher que está lá na periferia, daquela que está lá no rural, em Palmeiras ou Campina Grande, em todos os espaços. É importante a gente entender que as diferenças existem e elas são importantes, porque é isso que nos enriquece enquanto humanidade, só que essas diferenças não podem justificar as desigualdades sociais e é isso que a gente vivencia hoje. Essa justificação da desigualdade, trazendo a lógica da biologia e da naturalização, como se isso fosse, ‘Ah, porque nasceu assim e não assim!’. A gente nasce, mas a gente se desenvolve em sociedade e é esse desenvolvimento que vai nos tornar homens e mulheres dentro da sociedade. 

O que eu penso, é que esse grande enfrentamento é isso. Esse debate sobre ideologia de gênero, é claro que é uma estratégia que traz um discurso chulo, que traz questões extremamente grotescas que desqualifica. Quando a gente está discutindo gênero e discutindo a violência contra a mulher, por exemplo, é uma violência que todos nós sofremos. A gente sobe no ônibus e sofre assédio, aqui na Universidade, no nosso espaço de trabalho, nós temos assédio através de chefes, de outros colegas, de estudantes, então, por quê? Porque se naturalizou ao longo da história de que a mulher, assim como a terra e as questões materiais, é propriedade do macho que assim possui um poder que historicamente foi permitido a ele e foi construído assim. Porém, nós mulheres, já avançamos. Existem mulheres hoje em todas as profissões, mas ainda enfrentamos essa luta cotidiana que não é fácil. 

Lenilda Luna: Para finalizar, porque o tempo passou correndo… Quando ouvimos as suas reflexões, pensamos porquê é tão importante defender também à liberdade de cátedra e a autonomia universitária, porque esse debate não interessa ao poder econômico, ao sistema capitalista, não é um debate que para eles se traduz em uma questão prática, não tem como tirar lucro desse debate, então, ele não deveria existir, porque a universidade na cabeça dessas pessoas que são ligadas a esse sistema, também precisa produzir e ser lucrativa, ter linhas de pesquisa que possam ser centradas em lucros para as empresas. Então, esse debate filosófico que se faz sobre a questão da liberdade, não é a toa que a área de humanas é sempre relegada, quando se coloca essa concepção de universidade. Por isso, defender a autonomia universitária e a liberdade que o professor tem de dar a sua linha de pesquisa de acordo com conceitos científicos que a determinam. Isso é muito importante, não acha? 

Andréa Pacheco: Sim, porque a gente precisa pensar hoje em qual seria a função social da universidade. A sociedade capitalista se apropria da universidade para produzir lucro, mas a universidade, inclusive, é financiada pela população, então, a nossa produção de conhecimento não pode ser voltada para a produção de lucro, masàa produção de conhecimento, socialização e melhoria da qualidade de vida dessa população. Quando a gente pensa, por exemplo, no curso de Nutrição, não é pensar a nutrição em uma ideia de receitas mirabolantes para o emagrecimento, então veja a contradição. Pensar nessa perspectiva de ideias, e uma profissão voltada para o mercado, para o consumo porque é a lógica da beleza e da magreza e enquanto isso nós termos uma imensa população morrendo de fome. A mesma situação, quando vamos para o curso de Arquitetura, Engenharia… Cada vez mais se fazem prédios gigantescos, com uma beleza exorbitante, enquanto a gente tem muita gente sem moradia, morando nas grotas que na primeira chuva a casa desaba, sobe de novo. Então, para quê e para quem é essa universidade? 

O nosso desafio é esse. Eu penso e defendo todos os dias, seja na minha pesquisa, em sala de aula e em trabalhos de extensão, que a universidade precisa produzir conhecimento para a sociedade. Quando eu vou lá para a escola, falar de programas e direitos sociais, violência contra a mulher, da questão da homofobia e do racismo, eu sei que o meu conhecimento está voltado para que a gente tenha uma sociedade harmônica em paz, mas principalmente a partir da igualdade, da justiça social e da ética. A gente tem que pensar esse processo de democratização do conhecimento e que esse é o nosso papel dentro da universidade. 

Lenilda Luna: Obrigada, Andréa! Foi um prazer! Você colocou muitos conceitos que a gente ainda vai voltar a debater aqui no Ufal e Sociedade. Agradecemos a sua participação! 

Andréa Pacheco: Muito Obrigada! 

Lenilda Luna: O Ufal e Sociedade volta na próxima segunda, às 11h [na rádioweb], com reprise às 17 h. Até lá!

Ouça a entrevista aqui 

Palavras-chave
Ufal e Sociedade