Estudo da Ufal vai investigar possíveis influências do clima sobre a covid-19

Projeto tem como foco a Amazônia e foi selecionado pelo Programa de Combate a Epidemias da Capes

Por Thâmara Gonzaga – jornalista
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O professor Humberto Barbosa, do Instituto de Ciências Atmosféricas (Icat) da Ufal, teve um projeto de sua autoria selecionado pelo Programa Estratégico Emergencial de Combate a Surtos, Endemias, Epidemias e Pandemias da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). O programa foi lançado com o objetivo de reunir pesquisadores brasileiros para combater e prevenir a covid-19, além de promover a formação de pessoas para atuar nas áreas de doenças infecciosas.

A proposta do pesquisador, que tem como título a Influência do clima na sazonalidade do novo coronavírus e outros patógenos, a partir de modelos matemáticos, para combate a doenças na Amazônia brasileira, foi submetida ao edital 12/2020 que selecionou pesquisas na área de Telemedicina e Análise de Dados Médicos. O programa da Capes também escolheu projetos sobre Epidemias (edital 9/2020) e Fármacos e Imunologia (11/2020).

Em um momento tão desafiador para a ciência, diante de uma doença sobre a qual ainda se tem poucas comprovações científicas, Barbosa destaca a oportunidade de a Universidade poder contribuir. “O projeto é muito importante por colocar a Ufal e o Lapis [Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites, coordenado pelo docente] nessa vanguarda de pesquisas em uma área tão urgente e fundamental hoje para toda a população. A pandemia alertou para a necessidade de maior difusão da ciência, para que se compreenda os processos de transmissibilidade, de prevenção, entre muitas outras questões relevantes”, ressalta.

Ele conta que foi um “edital extremamente concorrido, com pouquíssimas propostas aprovadas em universidades do Nordeste brasileiro, principalmente, por se tratar de uma área transversal do projeto e por não ser diretamente da área de saúde”. Além da Ufal, as universidades federais de Campina Grande (UFCG), Rural do Semiárido (UFERSA) e do Rio Grande do Norte (UFRN) foram as instituições nordestinas com propostas selecionadas pelo edital 12/2020 da Capes.

Outro ponto ressaltado pelo professor foi a concessão de bolsas para formação acadêmica de mestres e doutores. Com a aprovação do projeto, além de conseguir o valor de custeio de R$ 50 mil para a pesquisa, foram concedidas uma bolsa de mestrado, duas de doutorado e mais duas de pós-doutorado. “Essas bolsas para a pós-graduação e outros pesquisadores são essenciais, pois permitem a formação de pessoal capacitado para atuar nessa área de combate a doenças, que se tornou prioridade por conta da pandemia, especialmente, para a Amazônia que está no centro dessa discussão ambiental, socioeconômica e sanitária”, afirma.

Sobre o projeto selecionado

O pesquisador da Ufal explica que a proposta de sua pesquisa é avaliar a influência de fatores climáticos e ambientais na transmissão da covid-19 na Amazônia brasileira, a partir de modelos computacionais, identificando as áreas de maior risco de proliferação do novo coronavírus e, assim, apoiar ações de controle sanitário.

“A Amazônia foi uma das regiões brasileiras mais rápida e drasticamente afetada pelo novo coronavírus. Por outro lado, é o ecossistema de maior interesse global na questão das mudanças climáticas, além de ter um uso predatório dos seus recursos naturais que pode interferir no surgimento de novas doenças, por causa da destruição sistemática dos habitats”, argumenta. Ele ainda acrescenta a realidade da região “ter uma população altamente vulnerável, como ribeirinhos e etnias indígenas sobreviventes de uma longa história de genocídio”.

Com anos de trabalho dedicados ao estudo das condições climáticas, Humberto Barbosa explica que o projeto será voltado aos ecossistemas da floresta amazônica para uma melhor compreensão da relação entre variações na temperatura, precipitação e umidade do solo, visando apoiar sistemas de vigilância em saúde. No estudo, de acordo com o professor, também serão consideradas variáveis não climáticas para explicar os efeitos ambientais conhecidos, a exemplo da cobertura do solo e população.

Ele ainda informa que a pesquisa pretende desenvolver e validar técnicas de análises preditivas para monitoramento da influência do clima na sazonalidade do novo coronavírus e outros patógenos. “O intuito é apoiar ações de preparação e resposta à proliferação da covid-19 e risco de surtos de outras doenças infectocontagiosas na Amazônia Legal. Avanços científicos nessa área terão potencial de contribuir para a construção de um plano nacional de desenvolvimento científico do país”, afirma.

Busca por respostas

O fato de a covid-19 ser ou não sazonal, ou seja, com característica de acompanhar as estações, assim como o vírus da gripe, gera muita discussão, tal como muitos aspectos dessa doença ainda desconhecida pelos cientistas.

“No último dia 28 de julho, a porta-voz da Organização Mundial de Saúde [OMS], Margaret Harris, afirmou que a pandemia de covid-19 não é afetada pela sazonalidade ou clima regional. Como ainda não tínhamos experiência com pandemias pelo novo coronavírus, quando o Sars-CoV-2 começou a se espalhar, era comum se comparar a infecção a pandemias anteriores do Influenza [vírus da gripe]”, esclarece Barbosa.

Atento aos movimentos da comunidade científica sobre o assunto, o docente informa que, “nesses poucos meses, foram construídas algumas evidências científicas de que o novo coronavírus não compartilha o mesmo comportamento do vírus da gripe”. E argumenta: “Diante de tantas incertezas, comuns a uma doença emergente, a nossa pesquisa faz parte de uma ação estratégica emergencial coordenada que visa contribuir para compreender o processo de disseminação do vírus”.

O pesquisador justifica que, diante de um vírus novo, a comunidade científica global ainda busca resposta para muitas questões, inclusive sobre as formas de transmissão, a influência da sazonalidade no contágio e evidência sobre imunidade por anticorpos.

“Há pesquisas que mostram certa sazonalidade na transmissão do novo coronavírus, mas a influência é muito baixa, diante do fato de a grande maioria da população não ter imunidade ao vírus. Por outro lado, a doença causada pelo Sars-CoV-2 mostra uma flutuação sazonal significativa nas regiões temperadas do mundo, mas apresenta menos sazonalidade nas áreas tropicais. Nosso entendimento atual ainda está incompleto. É nesse sentido que buscaremos colaborar”, reforça o docente.