Agenda da Opas sobre saúde e mobilidade teve contribuição da Ufal

Organização Pan-Americana de Saúde propõe estratégias de ação em três dimensões para melhorar a saúde pública brasileira

Por Manuella Soares - jornalista
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Importantes discussões internacionais, de forma macro, aconteceram este mês para combater a crise global das mudanças climáticas, seja por devastação ambiental ou grandes emissões de gás carbônico. Enquanto isso, grupos de especialistas têm deixado suas contribuições numa agenda focada em qualidade do ar, deslocamento seguro e prática da educação física. Os propósitos de ambas as iniciativas impactam na saúde pública e a Ufal está representada nesse debate por meio da professora Simone Romão, do Campus Arapiraca.

Ela foi selecionada para representar Alagoas, por meio da Rede de Professores Universitários pelas Ruas Completas, da World Resources Institute (WRI), instituição global de pesquisa com atuação em mais de 60 países.  O evento ocorreu nos dias 24 e 25 de outubro de 2019, em Brasília, na sede da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) da Organização Mundial da Saúde (OMS). As discussões desse evento resultaram na recente publicação de um documento de referência nacional intitulado Agenda Convergente Mobilidade Sustentável e Saúde.

“Em síntese, é pensar de maneira sustentável a relação entre meio ambiente, espaço urbano, mobilidade e acessibilidade, mas, que levam, no fim, a uma integração com a pauta da saúde pública. Em tempos de pandemia, pensar estratégias de mobilidade urbana é pensar em formas de mobilidade inteligente”, explicou Romão.

O propósito, segundo a apresentação do documento, é mostrar “os resultados de um primeiro esforço colaborativo em reunir evidências, refletir sobre implicações e propor linhas de ação que facilitem a compreensão e orientem os gestores públicos municipais a atuarem na Agenda Convergente Mobilidade Sustentável e Saúde, planejando e implementando ações com benefícios intersetoriais compartilhados”.

A professora da Ufal é uma importante ponte para a eficácia desse trabalho em Alagoas, já que atua como secretária Municipal de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente da Prefeitura de Arapiraca. “A gestão vem trabalhando a mobilidade e a acessibilidade como uma pauta integrada com foco na qualidade de vida das pessoas nas suas diversas formas de deslocamento na cidade. Desenvolvemos uma proposta de um urbanismo com sustentabilidade, ao pensar na maneira como as pessoas acessam a cidade, ao lançar o conceito de cidade caminhável a partir da linha férrea estruturante por meio de um VLT [Veículo Leve sobre Trilhos] integrado aos demais modais de transporte e conectado aos espaços públicos”, reforçou, sobre a linha que segue e que pode inspirar outras gestões no Estado.

Eixos e ações

O documento da Opas que teve a contribuição da professora Simone Romão tem 118 páginas e apresenta os seguintes princípios: Equidade na mobilidade urbana sustentável; Deslocamento urbano seguro e confortável; Transporte coletivo eficiente e de qualidade; Qualidade do ar nas cidades; Prioridade para o deslocamento ativo e para o transporte coletivo; Convergência entre as estratégias e entre os instrumentos de planejamento em saúde e de planejamento urbano e ambiental; Participação social em espaços de decisão e de governança da Agenda Convergente.

A Agenda é baseada nas três dimensões – mobilidade urbana, qualidade do ar e saúde pública – e justifica cada uma delas no contexto de saúde pública. A recomendação é para políticas urbanas de ‘crescimento inteligente’, com uso misto do solo e o fácil acesso de pedestres ou ciclistas aos principais centros de atividade. “Desencorajar” o uso de veículos particulares também é citado reforçando os riscos de ferimentos graves ou morte devido ao aumento na taxa de motorização e velocidades incompatíveis nas vias urbanas.

Na dimensão ‘qualidade do ar’, a OMS considera que a poluição do ar é o maior risco ambiental para a saúde e que “nove em cada dez pessoas respiram ar poluído todos os dias em decorrência, sobretudo, das emissões volumosas da indústria, da agricultura e dos transportes”, além do uso de combustíveis poluentes no interior de muitos ambientes de convívio social variado, a exemplo dos condicionadores de ar e refrigeradores. Segundo os dados apresentados, as mortes em decorrência da poluição atmosférica aumentaram 14% em dez anos no Brasil. Nesse contexto, o documento destaca o crescimento de movimentos que defendem a adoção de energias renováveis e de tecnologias mais limpas de combustíveis.

O evento reuniu os especialistas para contribuir com as discussões incluídas no documento e foi realizado antes da pandemia da covid-19, mas a elaboração dele, ao longo do ano de 2020, contemplou dados relacionados a essa crise mundial. Os impactos sobre a atividade física na rotina das pessoas foram sentidos e descritos em pesquisas como a da Universidade de Fraser Valley, no Canadá, apontando que 40,5% dos indivíduos inativos tornaram-se menos ativos e 22,4% dos que já eram ativos seguiram o mesmo caminho. Isso foi constatado em decorrência de protocolos sanitários de distanciamento social e tempo prolongado em casa.

O documento referência considera como exemplos importantes algumas intervenções urbanas que viabilizem deslocamentos ativos, ou seja, estrutura para viagens a pé, de bicicleta e transporte público. Além disso, acesso a parques e áreas verdes são valorosos atrativos para promoção de atividades físicas.

Comprometida com as três dimensões dessa Agenda Convergente, a Opas categorizou eixos para que todo o conteúdo chegue até as pessoas. A ideia é mapear grupos de interesse para promover engajamento; sensibilizar a população mostrando o ganho com as ações; fortalecer a gestão pública municipal, definindo metas e indicadores; ter governança incluindo os temas da Agenda na pauta de conselhos, grupos de trabalho, e comitês; e também garantir o diálogo com o governo federal para implantar medidas de retomada econômica no setor automobilístico, com incentivo à eletrificação.

Medidas efetivas e gestões comprometidas

A iniciativa da Organização Pan-Americana de Saúde, com a contribuição técnica dos especialistas na área, propõe seguir os cinco Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) para superar as barreiras à efetivação das políticas integradas de saúde e mobilidade. Assim, eles estão organizados em 18 linhas de ação que servem como referência para os agentes públicos.

“Trata-se de um conjunto de reflexões e inspirações para que cada administração municipal possa, a partir das características físico-espaciais, sociais e econômicas de sua cidade, planejar e executar ações de convergência entre as agendas. Isso possibilita reduzir custos sociais, potencializar os investimentos públicos e acelerar a promoção de vida saudável”, destaca o documento.

Os objetivos contemplam melhorar a saúde e a mobilidade com medidas sustentáveis; reduzir acidentes e agravos à saúde; melhorar o serviço de transporte coletivo; reduzir a emissão de poluentes por veículos motorizados; e garantir condições físico-espaciais para a mobilidade ativa. Todos os detalhes sobre cada um deles, incluindo as estratégias possíveis e os resultados esperados estão disponíveis no site da Opas.

Considerando as especificidades de cada local, os idealizadores do documento reforçam a importância da participação das pessoas para a viabilidade e o sucesso dos objetivos propostos no texto. A professora Simone Romão destacou, ainda, a relevante contribuição institucional e social dada nesse compromisso:

“Sou grata à WRI Brasil e à Opas/OMS pela oportunidade de representar Alagoas nesta discussão e produção nacional. No Nordeste, o urbanismo da maioria das cidades pequenas e médias, a exemplo da cidade de Arapiraca, enfrentam o desafio e a necessidade prioritária de implantar um sistema integrado de transporte coletivo mais humano, mais sustentável, mais acessível para as pessoas, porém se faz urgente investimentos e recursos públicos para gerir uma política de mobilidade urbana no país. É necessário que o princípio da equidade seja considerado neste urbanismo humanizado, onde os mais pobres tenham acesso ao direito à cidade e que o transporte público com qualidade seja uma realidade”.