Clube Fogueira de Lilith encerra ciclo com o sarau “Atravessando a Fogueira”
Evento contou com atrações como performance de dança, leitura de poesias no varal e discotecagem
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O pátio do Museu Théo Brandão (MTB) deu lugar, na tarde do último sábado, ao sarau “Atravessando a Fogueira”, evento que marcou o encerramento do primeiro ciclo do Clube de Leitura Feminista Fogueira de Lilith. Trazendo atrações como leitura de poesias escritas por mulheres, performance de dança e discotecagem com hits brasileiros clássicos e contemporâneos, a ocasião celebrou o sucesso dessa primeira fase do projeto, que debateu “Calibã e a Bruxa: mulheres, corpo e acumulação primitiva“, da filósofa e professora italiana Silvia Federici.
“A proposta de encerrar com um sarau parte da grande demanda de participação no clube, que não pôde ser totalmente atendida, já que contava com um número limitado de vagas. O sarau, aberto ao público em geral, possibilitaria a toda sociedade imergir nos temas debatidos ao longo do ano de forma lúdica, porém sem perder o rigor teórico do projeto”, disse Fabiana Rechembach, servidora do MTB e uma das coordenadoras do Clube de Leitura Fogueira de Lilith, a respeito do sarau “Atravessando a Fogueira”.
O evento foi iniciado com a performance “Que tipo de narrativas a sua dança revela?”, realizada pela professora Ana Clara Oliveira. De maneira dinâmica e interativa, a apresentação foi iniciada com uma coreografia de movimentos leves e precisos. Após a dança, a professora fez ecoar seus gritos citando nomes de grandes pensadoras feministas e exibindo fotos de cada uma delas. Finalizando a performance, a intérprete guiou os participantes do sarau à parte interna do museu, dando início à próxima atração do evento.
Logo após a apresentação de Ana Clara Oliveira, foi aberta a exposição “A luta contra o corpo rebelde: silenciamento e insurgência”, composta por telas de cinco artistas nordestinos. Em diálogo com as temáticas do sarau, as obras em um lado do corredor mostravam mulheres silenciadas diante das diversas tentativas da sociedade em calar suas vozes. Contudo, do outro lado, estavam representações de luta e insurgência diante das várias formas de violência impostas contra os corpos femininos.
Dando continuidade ao evento, o coletivo Sycorax, responsável pela tradução brasileira de “Calibã e a Bruxa”, realizou um debate a respeito da figura da bruxa no imaginário social. Geralmente associadas a misticismo e maldade, as mulheres postas como bruxas eram figuras de resistência à expropriação de terras e bens, assim como detentoras de conhecimentos ancestrais. A roda de conversa utilizou de documentos históricos, notícias atuais e leituras de passagens da obra de Federici, ponto principal do sarau e deste primeiro ciclo do clube.
“Em todos os encontros, essas mulheres conseguiram conectar os episódios históricos no livro com as difíceis experiências que vivenciam nos dias de hoje, e entender de onde surgiram. Portanto, o projeto cumpriu o seu maior propósito ao proporcionar a compreensão de como nós, mulheres, chegamos historicamente até aqui, e, com isso, começar a identificar situações e comportamentos que nos reprimem”, afirmou Mila Madeira, que coordena o Fogueira de Lilith ao lado de Fabiana Rechembach. Ela reforçou que o clube também se tornou um espaço para mulheres, que serve para convivência feminina, reflexão e lazer, em um ambiente seguro e de acolhimento.
O debate com o coletivo Sycorax foi seguido pelo momento “Ser mulher: vivências poéticas”, realizado junto com o apoio do projeto Papel no Varal. Com apresentação da psicóloga Larissa Cabús, os participantes do sarau declamaram poemas selecionados entre as cem opções dispostas em varais de sisau, todos escritos por mulheres. As obras que compuseram o momento eram de autoras de diversas épocas, de várias partes do mundo e das mais variadas temáticas, e aqueles que declamaram ainda concorreram a brindes literários.
As declamações foram seguidas pela apresentação “Milena Toca Rita”, na qual Milena Loureiro, integrante do Fogueira de Lilith, acompanhada de suas colegas de clube, fez um belo tributo à cantora Rita Lee. Finalizando o sarau “Atravessando a Fogueira”, a DJ e pesquisadora Fernanda Fassanaro realizou a discotecagem “Mulheres do Brasil”, trazendo uma setlist recheada de músicas cantadas por mulheres nos mais diversos ritmos.
A museóloga Hildênia Oliveira, diretora do Museu Théo Brandão, afirmou que as portas desse aparelho cultural estarão sempre abertas para fomentar momentos de debate, por se tratar de uma extensão da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), o MTB é também um espaço de educação. Hildênia ainda definiu museus de uma forma geral como espaços de salvaguarda de memórias, lugares nos quais as reflexões sobre o passado devem ser constantes, para que seja possível entender como a sociedade chegou aos dias de hoje, como fez o clube de leitura.
Para Samara Albuquerque, servidora do Judiciário, a participação no Clube Fogueira de Lilith foi um elemento transformador em sua vida. “Me fez perceber a importância da gente reivindicar mais espaços femininos, mais reunião de mulheres, porque esses encontros femininos foram propositalmente dificultados durante a história. Então, a fogueira me atravessou de uma forma, que hoje eu tenho uma outra visão, muito mais crítica sobre a história do mundo e das mulheres na sociedade”, concluiu Samara.